Muito provavelmente, com tantas coisas a acontecer e a inquietar nestes tempos ásperos que vamos vivendo, já pouca gente notará que passa o Dia da Espiga, como se dizia quando era pequeno para referir a Quinta-feira da Ascensão. A verdade é que cada vez menos gente se irá lembrando do Dia da Espiga.
Inevitavelmente, o Dia da Espiga leva-me
umas dezenas de anos lá para trás no tempo.
Na minha casa íamos sempre
procurar a sorte prometida no ramo da Espiga. Com o meu pai, pegávamos nas
bicicletas, na altura o meio de transporte familiar, e íamos à quinta onde
vivia a Avó Leonor apanhar o ramo da Espiga, papoilas, flores silvestres, sobretudo
malmequeres amarelos e brancos, o que se encontrasse de espigas de cereais e o
ramo de oliveira.
Fazia-se o ramo atado com ráfia,
arranjávamos sempre mais do que um para oferecer aos vizinhos e colocava-se
pendurado lá em casa por cima da mesa do jantar como chamariz da sorte. Saía
apenas quando era substituído por um novo ramo da Espiga. Nunca me lembro de
termos conseguido associar a presença do ramo ao que de bom nos ia acontecendo,
mas o ramo da Espiga lá estava e a tradição era sempre cumprida.
Nas novas qualidades que o mundo
vem tomando, não parece que possam caber minudências como andar no campo, se
houver campo, à cata de flores, espigas e um raminho de oliveira. Por estes
dias parece ainda menos provável.
Não sei se é bom, ou se é mau,
mas eu gostava de ir à Espiga, mesmo se não confiava muito na sorte.
Resta dizer que o ramo da Espiga
será construído daqui a pouco com o que encontramos aqui no monte. Cá em casa
algumas tradições mantêm-se.
Coisas de velhos, já se vê.
Amanhã, voltamos à agenda e que a espiga nos traga sorte.
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