A imprensa de hoje divulga que a Inspecção-Geral da Educação e Ciência desenvolveu em 80 escolas, públicas privadas, uma análise aos processos de avaliação no ensino secundário. O objectivo é perceber se existe um procedimento de “inflacção” da avaliação interna que facilite a melhoria da nota de candidatura ao ensino superior. Desta acção terão resultado 12 processos disciplinares envolvendo seis escolas, três públicas e três privadas.
Esta iniciativa vem no seguimento de
outras já desencadeadas e que têm mostrado alguma simpatia e generosidade na
avaliação interna em diferentes estabelecimentos.
Esta recorrente situação, as
eventuais “mãos largas “ de algumas escolas, sobretudo privadas, nos processos
de avaliação interna é algo que que deveria merecer a mais célere e severa
condenação. A percepção de competência, rigor e equidade é crítica nos
processos de avaliação escolar em qualquer comunidade. Este cenário, para além
do seu enquadramento do ponto de vista legal, é também preocupante pela mancha
pantanosa lançada sobre as instituições de ensino minando a confiança e
favorecendo os negócios da educação.
Recordo que em Maio de 2019 foram
divulgadas várias pautas do 10º ano do Colégio Ribadouro (sempre bem
posicionado nos rankings, claro) relativas a Educação Física em que nenhum
aluno do 10º teve nota inferior a 18 no 2º período. Mais precisamente, de 248
alunos do 10º, 128 (52%) tiveram 20 valores, 108 alunos (44%) tiveram 19 e
apenas 12 desajeitados alunos tiveram 18. Notável o desempenho dos alunos em
Educação Física, tão notável quanto o desempenho da escola em rigor, seriedade,
ética e manhosice.
A questão, também preocupante,
dadas as implicações é que este cenário é conhecido há já alguns anos. Pelo
menos, desde 2015 que sucessivos trabalhos do Conselho Nacional da Educação, da
Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e da Inspecção-Geral da Educação e
Ciência referem este tipo de procedimentos.
No entanto, neste contexto
parece-me de sublinhar que sendo certo que entre as escolas “simpáticas”, as
que inflacionam as notas, predominam as escolas privadas, também se verifica
que no caso das escolas em que os alunos obtêm melhores resultados nos exames
que nas avaliações internas predominam habitualmente as públicas, ou seja, o
“facilitismo” das escolas públicas que alguns apregoam não será assim tão
claro.
Os responsáveis pelas escolas em
que o “fenómeno” da simpatia e generosidade é mais evidente tentam explicá-lo
de formas diferentes e em alguns aspectos até bastante curiosas, projecto
pedagógico ou educativo da instituição, entendimento diferenciado sobre o
próprio papel da avaliação interna, etc.
É também por razões desta
natureza que de há muito defendo que a conclusão e certificação de conclusão do
ensino secundário e a candidatura ao ensino superior deveriam ser processos separados.
Os exames nacionais destinam-se, conjugados com a avaliação interna realizada
nas escolas, a avaliar e certificar o trabalho escolar produzido pelos alunos
do ensino secundário e que, obviamente, está sediado no ensino secundário.
Não está em causa a existência de
exames finais no ensino secundário são importantes como regulador externo do
processo de avaliação e certificação do final de um ciclo de formação. O que me parece ajustado é que as classificações,
internas e externas no ensino secundário deveriam constituir apenas um factor
de ponderação a contemplar com outros critérios nos processos de admissão
organizados pelas instituições de ensino superior como, aliás, acontece em
muitos países.
O acesso ao ensino superior é um
outro processo que deveria ser da responsabilidade do ensino superior e estar
sob a sua tutela. E neste processo também poderia, naturalmente, ser regulado e escrutinado de forma a minimizar o risco de facilitismo”.
A situação existente também alimenta
os negócios da educação. Curiosamente, os estudos da Universidade do Porto
mostram, pelo menos desde 2012, que as notas de acesso dos alunos do ensino
secundário privado não sustentam carreiras escolares no ensino superior no
mesmo patamar, os alunos oriundos de escolas pública obtêm melhores resultados.
Já tenho afirmado a minha
curiosidade sobre o que pensarão sobre estes expedientes os alunos, os pais e
os professores destas escolas "batoteiras". Dos responsáveis
institucionais adivinho o que dirão, se disserem alguma coisa, "nada lhes
pesa na consciência". Como sempre.
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