No Público encontram-se referências a uma matéria que me
parece relevante e sobre a qual muitas vezes aqui tenho escrito e referido na
intervenção profissional, o acesso e frequência do ensino superior por parte de
alunos com necessidades especiais. É divulgado o trabalho desenvolvimento na
Universidade de Aveiro recebendo em cursos na área da educação alunos com necessidades
especiais ajustando, naturalmente o currículo e não conferindo grau mas
certificando aquisições. Depois do trabalho iniciado neste âmbito pela Escola
Superior de Educação de Santarém com um Curso de Formação em Literacia Digital,
regista-se e divulga-se o trabalho da Universidade de Aveiro acompanhado pela
Professora Paula Santos, companheira de estrada nestas lidas há já muitos anos.
Como há pouco tempo escrevi este ano um aumento
significativo de alunos com necessidades especiais matriculados no ensino superior.
Após a segunda fase de colocação o número de alunos inscritos é de 310, um
aumento de 34% relativamente ao ano passado e superior em 158% ao que se
verificava em 2015.
Sendo de registar a subida importa, no entanto, considerar
que em 2017/2018 frequentavam o ensino superior 1644 alunos com necessidades
especiais, 0,5% do total dos matriculados no ensino superior o que evidencia o
que está por fazer em matéria de equidade e inclusão. Considerando as vagas do
contingente especial para estes estudantes registe-se que apenas 14% foram
ocupadas.
Estamos, pois, muito longe ainda do que seria desejável.
De acordo com a Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e
Ciência no ano lectivo 2016/2017 havia 87.039 alunos com necessidades especiais
inscritos nas escolas portuguesas. Muitos destes alunos têm passado passam por
experiências de sucesso independentemente do seu perfil de competências,
felizmente que assim é.
No entanto, para muitos o período que se segue é um enorme
túnel no qual poucas vezes se vislumbra uma luz, sobretudo em situações com
problemáticas mais severas designadamente quando existem dificuldades de
natureza cognitiva, a situação dos jovens a participar nos trabalhos em curso
na Univ. de Aveiro ou na ESE de Santarém e daí, também, a sua relevância.
Desculpem a insistência e a repetição ... mas é necessário.
Como tantas vezes tenho dito, aqui e nos espaços de
contextos da lida profissional, a questão da presença dos alunos começa no que
é feito no ensino básico e secundário, e existe muita matéria para reflectir e
sobre as mudanças necessárias como milhares de famílias sentem de forma
dramática.
Por outro lado, é fundamental que com clareza, sem
ambiguidades ou equívocos se entenda que após a escolaridade obrigatória os
jovens, todos os jovens, têm três vias disponíveis compatamares diferenciados e até com possibilidade de integração entre elas, formação profissional,
formação escolar (ensino superior) ou mercado de trabalho (trabalho na
comunidade que pode ter uma dimensão ocupacional).
A realidade mostra que os jovens com necessidades especiais
estão significativamente arredados destas vias e, voltamos ao mesmo, em muitas
circunstâncias ao abrigo de práticas e modelos de resposta sob a capa da …
inclusão. De facto, muitos deles, ficam entregados (não integrados) às famílias
ou encaminham-se para instituições onde, apesar de algumas experiências muito
positivas interessantes, se recicla a exclusão. Mas mesmo o acesso a
instituições é extraordinariamente difícil dadas as listas de espera que
regularmente são referidas.
Esta dificuldade de acesso envolve quer a resposta no âmbito
da formação profissional, quer no apoio a situações com problemáticas mais
severas.
Desculpem a enésima referência mas um processo de inclusão
assenta em cinco dimensões fundamentais, Ser (pessoa com direitos), Estar (na
comunidade a que se pertence da mesma forma que estão todas as outras pessoas),
Participar (envolver-se activamente da forma possível nas actividades comuns),
Aprender (tendo sempre por referência os currículos gerais) e Pertencer
(sentir-se e ser reconhecido como membro da comunidade). A estas cinco
dimensões acrescem dois princípios inalienáveis, autodeterminação e autonomia e
independência.
As pessoas com NEE de diferente natureza depois dos 18 anos
devem ser, estar, participar e pertencer até aos contextos que todas as outras
pessoas com mais de 18 anos estão. As instituições especializadas ou voltar
para a família serão sempre um recurso e nunca uma via.
É também claro que no âmbito do ensino superior importa que
se proceda a ajustamentos de natureza diversa, atitudes, representações e
expectativas, oferta formativa, custos, acessibilidades e apoios ou, aspecto
fundamental, promover melhor articulação com o ensino secundário.
As questões mais complexas decorrem, os estudos e a
experiência sugerem-no, das barreiras psicológicas e das atitudes, pessoais e
institucionais, seja de professores, direcções de escola, da restante
comunidade, incluindo, naturalmente, professores do ensino básico e secundário
e de "educação especial", técnicos, os alunos com necessidades
especiais e famílias.
Também é minha convicção de que as preocupações com a
frequência do ensino superior por parte de alunos com necessidades especiais é
fundamentalmente dirigida aos alunos que manterão as capacidades suficientes
para aceder com sucesso à oferta formativa tal como ela existe. Estou a
referir-me, evidentemente, aos alunos que não têm “diagnóstico” de problemas de
natureza cognitiva. Estas situações são ainda mais representadas como …
difíceis de responder.
No entanto, como tantas vezes digo, esta preocupação deveria
ser mais alargada, estamos a falar de inclusão. Sim, frequentar o ensino
superior onde estão jovens da sua idade e em que a oferta formativa se for
repensada e a experiência de vida proporcionada podem ser importantes.
Não, não é nenhuma utopia. Muitas experiências noutras
paragens mas também por cá mostram que não é utopia como é o caso do que
acontece em Santarém com, tanto quanto conheço, resultados positivos e do
trabalho da Universidade de Aveiro agora divulgado.
O primeiro passo é o mais difícil, tantas vezes o tenho
afirmado. É acreditar que eles são capazes e entender que é assim que deve ser.
Eu já disse e escrevi isto várias vezes e em múltiplos
contextos e ocasiões. Peço desculpa mas continuarei a fazê-lo. Os velhos são
teimosos.
PS – Esta teimosia justifica-se por várias razões. Na caixa
de comentários do Público a esta notícia lia-se no único comentário existente quando a visitei, “O que não fazem as universidades para ter alunos,
qualquer dia em vez de ensinarem limitam-se a atribuir diplomas”. Não é um caminho fácil.
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