Na imprensa dos últimos dias surgiram alguns trabalhos sobre o universo da educação de infância. O Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social publicou uma portaria que passa a permitir o aumento de dois lugares por sala de creche em que se verifiquem transformações em espaços não previstos para o efeito para que possam “transformar-se” numa sala de creche e estas instituições passam a poder funcionar à noite e aos fins-de-semana.
Também tem sido referida a
extrema dificuldade de muitas famílias em encontrar vagas em instituições ou
creches, quer na creche, quer nos jardins de infância. Esta situação, como é óbvio,
é particularmente complicada nas zonas de maior densidade demográfica.
Estas medidas sendo compreensíveis, alguma reserva sobre o aumento do número de dois lugares por sala,
a inexistência de respostas cria extremas dificuldades às famílias e inibem
projectos de parentalidade num país que vive um Inverno demográfico. Também é
positivo embora insuficiente a progressiva gratuitidade da frequência da creche.
Por outro lado, também sabemos a
situação actual alimenta um “mercado” legal ou clandestino de "depósito" de
crianças com conhecidas dificuldades na regulação da sua qualidade.
Antes de umas notas sobre a
educação de infância sublinhar que os estilos de vida, as políticas laborais e
de família que carecem de urgente reflexão levam a que desde muito cedo as
famílias sintam a necessidade de colocar os filhos em amas ou instituições.
Esta resposta é pouco acessível e inibidora de projectos de vida que incluam filhos com os
efeitos conhecidos na taxa de natalidade.
Neste cenário, para além da
gratuitidade das creches e do aumento de respostas seria de considerar uma
adequação nas políticas laborais e de família que considerassem, por exemplo, as
licenças parentais (agora alteradas). A organização e os tempos do trabalho o
que teria reflexos nas dinâmicas educativas familiares e nos projectos de
parentalidade das famílias.
É também reconhecido por
múltiplas análises o impacto positivo do acesso de respostas educativas de
qualidade em creche e jardim-de-infância.
No entanto, deve sublinhar-se que
garantir a universalidade do acesso não é o mesmo que obrigatoriedade. Aliás,
de acordo com o relatório da rede Eurydice, “Key Data on Early Childhood
Education and Care in Europe 2019”, dos 12 países em que se estabelece a
universalidade aos quatro anos só em dois não é obrigatório, sendo Portugal um
dos países.
Como já tenho afirmado, não tenho
certezas sobre a obrigatoriedade da frequência, mas tenho a maior convicção no
sentido de que garantir a universalidade do acesso à educação pré-escolar aos
três anos e criar respostas de qualidade, acessíveis, logística e
economicamente, às famílias para as crianças dos zero aos três anos é
imprescindível e urgente. Acentuo também a ideia de que este período, até aos
três anos, deveria também estar sob tutela do Ministério da Educação e não da
Segurança Social pois o acolhimento das crianças deve estar abrangido por um
forte princípio de intencionalidade educativa.
Sabemos todos como o
desenvolvimento e crescimento equilibrado e positivo dos miúdos é fortemente
influenciado pela qualidade das experiências educativas nos primeiros anos de
vida, familiares ou institucionais. De pequenino é que ... se constrói o
destino.
No entanto e mais uma vez, a
educação pré-escolar é bastante mais que a “preparação” para a escola e não
deve ser entendida como uma etapa na qual os meninos se preparam para entrar na
escola embora se saiba do impacto positivo que pode assumir no seu trajecto escolar.
Na verdade, as crianças estão a
preparar-se para entrar na vida, para crescer, para ser. A educação pré-escolar
num tempo em que as crianças estão menos tempo com as famílias tem um papel
fundamental no seu desenvolvimento global, em todas as áreas do seu
funcionamento e na aquisição de competências e promoção de capacidades que têm
um valor por si só e não entendidos como uma etapa preparatória para uma parte
da vida futura dos miúdos, a vida escola.
Este período, a educação
pré-escolar, educação de infância numa formulação mais alargada, cumprida com
qualidade e acessível a todas as crianças, será, de facto, um excelente começo
da formação institucional das pessoas, dos cidadãos. Esta formação é global e
essencial para tudo o que virão a ser, a saber e a fazer no resto da sua vida.
Assim, existem áreas na vida das
pessoas que exigem uma resposta e uma atenção que sendo insuficiente ou não
existindo, se tornam uma ameaça muito séria ao futuro, a educação de qualidade
para os mais pequenos é uma delas.
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