Na imprensa sucedem-se referências às manifestações e reivindicações de alunos do ensino superior contra o aumento substancial das propinas do 2º ciclo que confere o grau de mestrado. Já de há muito que as propinas dos mestrados são bem superiores às das licenciaturas e em muitos casos tremendamente caras. É muito cara a frequência do ensino superior em Portugal.
Esta cenário, aumento brutal de
propinas nos mestrados, estava, como se costuma dizer, escrito nas estrelas. Em
2011 escrevi aqui:
“Desde o início tenho afirmado
que o processo de reforma no ensino superior mais conhecido pela "Reforma
de Bolonha" radicou mais em questões económicas, o financiamento o ensino
superior, que de natureza científica, curricular ou de mobilidade envolvendo estudantes
e professores. O encurtamento do chamado grau de licenciatura para três anos e
a criação do 2º ciclo, o grau de mestrado, possibilitou que na grande maioria
dos cursos passassem a ser as propinas dos alunos a financiar o 2º ciclo com
custos elevadíssimos em muitos estabelecimentos de ensino superior.”
O resultado é o que está à vista
e não é animador, frequentar o ensino superior em Portugal é muito caro e a
formação e qualificação são bens de primeira necessidade. Vejamos alguns dados.
De acordo com Relatório do CNE,
"Estado da Educação 2019", a percentagem de alunos que em Portugal
acede a bolsas de estudo para o 1º ciclo está no segundo escalão mais baixo da
análise, entre 10 e 24,9%. Para comparação, Irlanda, Países Baixos estão no
intervalo entre 25% e 49,9% e a Suécia no superior a 75%. Países como Espanha,
França, Reino Unido e muitos outros têm percentagens de alunos com apoio
superiores a nós e, sem estranheza, também maior nível de qualificação.
Em 2018 foi divulgado um estudo
já aqui citado, “O Custo dos Estudantes no Ensino Superior Português” da
responsabilidade do Instituto de Educação da U. de Lisboa, relativo ao ano
lectivo de 2015/2016 mostrando que cada estudante universitário gastou em média
6445€ em despesas como propinas, material escolar, alojamento ou alimentação.
Os alunos de instituições universitárias privadas têm uma despesa perto dos
10000€ e nos politécnicos privados o custo será de 8296€. De facto, sendo a
qualificação superior um bem de primeira necessidade para os cidadãos e para o
país, é um bem muito caro, demasiado caro para muitas famílias e indivíduos.
Também dados de um trabalho
conhecido em 2018 realizado pelo Projecto Eurostudent “Social and Economic
Conditions of Student Life in Europe” mostra um extenso quadro das condições de
frequência do ensino superior em muitos países da Europa com base em dados de
2016 a 2018.
Da imensidade de dados
disponíveis releva que Portugal é o quarto país em que as famílias assumem maior
fatia dos gastos com a frequência do ensino superior. Verifica-se ainda uma
forte associação entre a frequência do ensino superior e nível de escolarização
e estatuto económico das famílias o que, naturalmente, não surpreende, mas dificulta
a desejada mobilidade social.
Apesar de um abaixamento do valor
as propinas no ensino público, as dificuldades sentidas por muitos estudantes
do ensino superior e respectivas famílias, quer no sistema público, quer no
sistema privado com valores mais altos de propinas, são, do meu ponto de vista,
consideradas frequentemente de forma ligeira ou mesmo desvalorizadas. Tal
entendimento parece assentar na ideia de que a formação de nível superior é um
luxo, um bem supérfluo pelo que ... quem não tem dinheiro não tem vícios.
Este ano lectivo, o número de
candidatos a bolsa foi o maior de sempre. É verdade que subiu o número de
estudantes que entrou este ano no ensino superior e se verificou a perda de
rendimento de muitas famílias em consequência do impacto económico e social da
pandemia, mas é mais um indicador.
Os aumentos de propinas
anunciados para o 2º ciclo só vêm dificultar ainda mais o acesso é esse bem
imprescindível, qualificação.
Sem comentários:
Enviar um comentário