Um dia destes, numa conversa informal entre professores, comentavam-se vários casos em que miúdos passam por situações complicadas sem que, aparentemente, se tornasse visível o impacto dessas situações. Alguns professores sugeriam que certos miúdos parecem ter uma estranha capacidade para mascarar a sua vida, ou mesmo o seu mal-estar.
Na conversa também participava o Professor Velho, o que está
na biblioteca e fala com os livros, que contou a história de um rapaz que ele
tinha conhecido há muitos anos e que ia escrevendo a sua narrativa com tinta
invisível. Os colegas, por um lado surpreendidos com a afirmação e por outro
lado habituados às divagações do Velho, esperaram por alguma clarificação.
O Professor Velho falou então de um miúdo em que ele sentia
que alguma coisa se passava que não o deixava sentir bem, mas não conseguia perceber
o que era. Começou a ficar mais atento aos sinais e às falas do rapaz e chegou
à conclusão de que ele escrevia a sua vida com aquela tinta que só com um
truque se torna visível. No caso, o truque foi a atenção. Existem muitas
narrativas que falam de medo, de desconforto, de desafecto, de abandono e
solidão, de raiva, de perplexidade e que permanecem invisíveis. Só mesmo a
atenção é que torna visível a tinta com que são escritas.
O Velho acabou a referir que o problema é que a atenção que
permite decifrar a tinta invisível de algumas narrativas nem sempre se consegue
ensinar, embora sempre se possa aprender.
Aqueles professores pareciam atentos à fala do Professor
Velho.
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