Lê-se no Público que o Governo divulgou uma campanha que terá como objectivo “sensibilizar para a necessidade de termos mais famílias de acolhimento e não só sensibilizar, mas também informar", de acordo com a secretária de Estado da Acção Social e da Inclusão.
Retomo o que aqui escrevi há pouco tempo a propósito da divulgação do Relatório CASA 2023 (Relatório de Caracterização Anual da Situação de Acolhimento dasCrianças e Jovens) pelo Instituto da Segurança Social. Vejamos alguns dados. Em termos globais aumentou o número de crianças e jovens em situação de acolhimento.
Em 2023 registaram-se 2415 casos
de novo acolhimento o que significa mais 8% que em 2022. Destes novos casos,
80% já estavam em acompanhamento, mas a identificação de situações de perigo
sustentou processos de retirada urgente, situação que está a aumentar.
Em termos globais, das 6446
crianças em situação de acolhimento estavam 263 em família de acolhimento, 4,1%
das 6446 crianças com medida de acolhimento. Assim, perto de 96% estava em
regime institucional, 5738 em cuidados formais residenciais, como casas de
acolhimento, e 445 noutras formas de cuidados alternativos, como centros de
apoio à vida, lares residenciais ou colégios de educação especial.
É um quadro que continua a ser
preocupante e alimenta o que o relatório "Caminhos para uma melhor
protecção: Balanço da situação das crianças em estruturas de acolhimento na
Europa e na Ásia Central" realizado pela Unicef divulgado em Janeiro
mostrava, segundo qual, entre 42 países da Europa e da Ásia Central, Portugal o
país com mais crianças a viverem em instituições.
Mantém-se a acrescida dificuldade
de processos de adopção de crianças mais velhas, mais vulneráveis por alguma
condição de saúde, crianças com necessidades especiais ou adolescentes e
jovens.
É consensual que em nome do
bem-estar das crianças e jovens seria desejável que se conseguisse até ao
limite promover a desinstitucionalização das crianças por múltiplas e bem
diversificadas razões.
Recordo um estudo de Paulo
Delgado do Instituto Politécnico do Porto, creio que divulgado em 2018, refere
que as crianças evidenciam uma percepção de bem-estar significativamente
diferente consoante estejam em família tradicional, 9.05 numa escala de 0 a 10,
em famílias de acolhimento, 8.69 e em instituições, 7.61.
Também há algum tempo um trabalho
da Universidade do Minho evidenciou que as crianças institucionalizadas
revelam, sem surpresa, mais dificuldade em estabelecer laços afectivos sólidos
com os seus cuidadores nas instituições. Esta dificuldade pode implicar alguns
riscos no desenvolvimento dos miúdos e no seu comportamento.
A conclusão não questiona,
evidentemente, a competência dos técnicos cuidadores das instituições, mas as
próprias condições de vida institucional e aponta no sentido da adopção ou
outros dispositivos como forma de minimizar estes riscos e facilitar os importantes
processos de vinculação afectiva dos miúdos. Também deve acentuar-se o trabalho
de grande qualidade que muitas instituições procuram desenvolver. Além disso,
sabemos todos, que existem contextos familiares que por razões de ordem variada
não devem ter crianças no seu seio, fazem-lhes mal, pelo que a retirada pode
ser uma necessidade que o superior interesse da criança justifica sendo um
princípio estruturante das decisões neste universo.
Uma família é, de facto, um bem
de primeira necessidade.
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