domingo, 17 de outubro de 2021

A PROPÓSITO DO "SQUID GAME"

 Nos últimos dias a imprensa tem divulgado episódios de violência preocupante ocorridos em comunidades escolares desencadeados por manifesta influência da série da Netflix, “Squid Game”.

Numa das abordagens, realizada pelo DN, foi-me solicitada alguma colaboração.

Em síntese do que procurei expressar creio que agora falamos dos efeitos potenciais nos mais novos de conteúdos como o “Skid Game”, como já falámos do “Fortnite”, da “Baleia Azul” ou mesmo de comportamentos e desafios de risco desencadeados no contexto da rede “TikTok”.

Não tenho a convicção que os autores e difusores deste tipo de produtos venham a desenvolver qualquer dispositivo de regulação do seu consumo, afirmar que o “Squid Game” se destina a maiores de 16 anos e, portanto, os mais novos não o consomem é, no mínimo, pouco sério.

Sabemos ainda que a cultura e valores dominantes acomodam sem grande sobressalto consumo de produtos de diferentes tipos que, evidentemente, são tóxicos, física ou psicologicamente, e potencialmente perigosos sobretudo para grupos mais vulneráveis.

Também sou pouco optimista na disponibilidade e capacidade das comunidades para instituírem dispositivos de regulação eficazes, veja o que actualmente se discute em torno do Facebook. São conteúdos que valem muitos milhões, números demasiado grandes para que se “belisquem”.

É neste contexto que, como muitas vezes afirmo, esta questão acaba por ficar mais reservada à acção educativa familiar e escolar.

Sim, eu sei das dificuldades da parentalidade nos contextos actuais, com estilos de vida que sustentam um tempo limitado de interacção e também sei que não se pode exigir tudo à escola.

Por outro lado, sei, como afirmei ao DN, que assentar a acção reguladora fundamentalmente em estratégias proibicionistas tendem a não ser eficazes à medida que as crianças crescem.

Creio que o caminho passa incontornavelmente pela promoção da literacia digital das famílias para ajudar a perceber os “alçapões” que existem nos conteúdos que nos podem chegar através do ecrã. Muitos pais, diz-me a experiência, desconhecem boa parte dos riscos.

Num tempo em que a escola, por boas e más razões, a pandemia, entrou decididamente num tempo de recursos digitais. No contexto da sua utilização talvez possamos introduzir proactivamente e numa perspectiva de desenvolvimentos dos alunos uma abordagem a conteúdos e aos riscos.

A abordagem em contexto familiar ou escolar será, provavelmente, mais eficiente se assentar numa tentativa de mediação nos consumos, o “ecrã” não deve ser a “babysitter” dos miúdos, e de auto-regulação, ou seja, “eu sei o que é isto e decido ou não ver”, ou mesmo, “eu vejo isto, mas … só vejo”.

Como também será claro, nada disto garantirá a ausência de risco nem algo que não defendo e em que não acredito, uma “educação para a santidade”.

Finalmente, uma referência à necessidade de estarmos, pais, escola, comunidade, atentos a sinais que podem notar-se em crianças e adolescentes que nos podem alertar para situações ou comportamentos que não conhecemos, mas podem provocar mal-estar ou sofrimento.

Não se trata de uma tarefa fácil, é a única certeza que tenho para além de que após o “Squid Game” surgirá certamente qualquer outro conteúdo que nos fará voltar a pensar nestas questões.

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