Lê-se no Público que apesar de ainda não ter terminado o período de candidatura, o número de estudantes de ensino superior que já apresentou candidatura a bolsa é o maior de sempre.
Na peça são referidas como
hipóteses explicativas, o aumento também verificado número de estudantes que
entrou este ano no ensino superior e a perda de rendimento de muitas famílias
em consequência do impacto económico e social da pandemia.
Apesar destas dimensões poderem constituir
alguma justificação creio que importa não esquecer uma questão de natureza
estrutural, estudar no ensino superior é muito caro em Portugal. Também a
recente alteração do regulamento de atribuição de bolsas não minimizou esta
situação.
Algumas notas começando por
alguns dados.
Em 2018 foi divulgado um estudo,
“O Custo dos Estudantes no Ensino Superior Português” da responsabilidade do
Instituto de Educação da U. de Lisboa, relativo ao ano lectivo de 2015/2016
mostra que cada estudante universitário gastou em média 6445€ em despesas como
propinas, material escolar, alojamento ou alimentação. Os alunos de
instituições universitárias privadas têm uma despesa perto dos 10000€ e nos
politécnicos privados o custo será de 8296€. De facto, sendo a qualificação
superior um bem de primeira necessidade para os cidadãos e para o país, é um
bem muito caro, demasiado caro para muitas famílias e indivíduos.
Também dados de um trabalho
conhecido em 2018 realizado pelo Projecto Eurostudent “Social and Economic
Conditions of Student Life in Europe” mostra um extenso quadro das condições de
frequência do ensino superior em muitos países da Europa com base em dados de
2016 a 2018.
Da imensidade de dados
disponíveis releva que Portugal é o quarto país em que as famílias assumem
maior fatia dos gastos com a frequência do ensino superior. Verifica-se ainda
uma forte associação entre a frequência do ensino superior e nível de
escolarização e estatuto económico das famílias.
São conhecidas as dificuldades de
promoção de mobilidade social que o sistema educativo português, e não só,
atravessa registando ainda níveis baixos de qualificação e perto de 160 000
jovens que não estudam nem trabalham.
Por outro lado, talvez seja de
recordar no que respeita aos custos de frequência do ensino superior que muitos
jovens portugueses têm emigrado para realizar os seus estudos superiores em
países em que as propinas são mais baratas que em Portugal, não existem de todo
ou são financiadas, casos da Dinamarca, Reino Unido ou o Canadá e a Austrália
fora da Europa.
Recordo que também em 2014 um
estudo patrocinado pela Comissão Europeia em oito países da Europa revelava,
sem surpresa, que Portugal apresenta uma das mais altas percentagens, 38%, de
jovens que gostava de prosseguir estudos, mas não tem meios para os pagar.
De acordo com o Relatório da
OCDE, “Education at a Glance 2015”, os custos da frequência de ensino superior
em Portugal suportados pelo universo privado, sobretudo as famílias, era o mais
alto da União Europeia, 45.7%.
Segundo o relatório
"Sistemas Nacionais de Propinas e Sistemas de Apoio no Ensino Superior
2015-16", da rede Eurydice da União Europeia apenas Portugal e a Holanda
cobram propinas a todos os alunos do ensino superior, sendo também Portugal um
dos países com valores de propina mais altos.
Apesar de um abaixamento do valor
as propinas no ensino público, as dificuldades sentidas por muitos estudantes
do ensino superior e respectivas famílias, quer no sistema público, quer no
sistema privado com valores mais altos de propinas, são, do meu ponto de vista,
consideradas frequentemente de forma ligeira ou mesmo desvalorizadas. Tal
entendimento parece assentar na ideia de que a formação de nível superior é um
luxo, um bem supérfluo pelo que ... quem não tem dinheiro não tem vícios.
A qualificação é a melhor forma
de promover desenvolvimento e cidadania de qualidade pelo que apesar de ser um
bem caro é imprescindível.
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