Foi ontem divulgada a realização pela PJ de uma operação de grande dimensão de combate à pornografia de menores na net.
Da informação disponibilizada releva
que um expediente utilizado com frequência é a utilização dos jogos online para
estabelecer o contacto com menores que poderá ter consequências devastadoras.
Num tempo em que a presença na
net é substantiva para adultos e mais novos é crítico que estejamos atentos ao que
costumo designar por “alçapões da net” e que frequentemente abordo em conversas
com pais, ficando por vezes surpreendido com o desconhecimento revelado sobre os
riscos. Como é evidente, não está em causa qualquer diabolização destas ferramentas,
apenas a regulação e os riscos que também comportam.
Atravessámos períodos de
confinamento em que aumentou exponencialmente o tempo que crianças,
adolescentes e jovens, tal como muitos adultos, estão em frente do ecrã.
Naturalmente os riscos também aumentaram, não só os de natureza sexual, mas
também os de cyberbullying, de chantagem e roubo, de exposição a conteúdos
inadequados às idades, etc.
Trata-se de mais um factor de
pressão para a supervisão imprescindível, mas muito difícil dos mais novos na
sua relação com a net.
É de sublinhar que dados do
Estudo Internacional de Alfabetização em Informática e Informação (ICILS)
envolvendo 11 países e divulgados em 2020 sugerem que os alunos portugueses são
os mais bem preparados para usar a internet de forma responsável. No entanto,
os dados relativos aos riscos são, de facto, inquietantes.
No âmbito do Projecto Kids Online
que envolve 30 países e analisa a utilização da net e das redes sociais por
crianças e adolescentes os dados de 2018, cerca de 2000 alunos entre os 9 e os
17 anos mostraram comparativamente a 2014 se verifica uma subida da frequência
das situações de risco a que parece também estar a associada a maior
operacionalidade e o tempo de contacto permitido pela migração da utilização
dos pc para os mais “operacionais” smartphones”.
Para além dos dados do EU Kids
Online recordo um trabalho da OCDE de 2018 "Curriculum Flexibility and
Autonomy in Portugal – na OECDreview” em que considerando dados de 2012 e 2015
(recolhidos no âmbito do PISA), oito em cada dez adolescentes portugueses afirmam
"sentir-se mal" se não estiverem ligados à internet. Apenas os
adolescentes franceses e suecos de entre os 31 países envolvidos evidenciam uma
taxa superior.
Podemos considerar mais um sinal
dos tempos as múltiplas referências ao tempo excessivo e dos riscos associados
que que muitas crianças e adolescentes despendem com a ligação à net nas suas
múltiplas possibilidades designadamente as redes sociais e os riscos
associados. Os indicadores relativos ao cyberbullying e dados como os que agora
foram revelados pela PJ são inquietantes.
Nesta perspectiva e tal como
noutras áreas o recurso privilegiado a estratégias proibicionistas não
funciona.
São mais eficientes a promoção da
utilização auto-regulada e informada. A net e o mundo de oportunidades,
benefícios e riscos que está presente em todas as suas potencialidades é uma
matéria que deve merecer a reflexão de todos os que lidam com crianças e jovens
embora não lhes diga exclusivamente respeito. É o nosso trabalho.
Mesmo em tempos “normais”, seja
lá isso o que for, a que parece estarmos a voltar, em casa, muitas crianças têm
um ecrã como companhia durante o pouco tempo que a escola "a tempo
inteiro" e as mudanças e constrangimentos nos estilos de vida das famílias
lhes deixam "livre". Também é verdade que a crescente
"filiação" em redes sociais virtuais pode “disfarçar” o fechamento,
juntando quem “sofre” do mesmo mal e o tempo remanescente para estar em
família, frequentemente ainda é passado à sombra de uma televisão.
Estas matérias, a presença das
novas tecnologias na vida dos mais novos e os riscos potenciais, por estranho
que pareça, são problemas menos conhecidos para muitos pais. Aliás, as
dificuldades sentidas por muitas famílias na ajuda aos filhos em tempo de
ensino não presencial, mostrou isso mesmo, baixos níveis de literacia digital.
Considerando as implicações sérias na vida diária importa que se reflicta sobre
a atenção e ajuda destinada aos pais para que a utilização imprescindível e
útil seja regulada e protectora da qualidade de vida das crianças e adolescentes
minimizando os riscos existentes nos “alçapões da net”. Existem demasiadas
situações em que desde muito cedo os “smartphones” ou outros dispositivos funcionam
como “babysitters”.
Por outro lado, a experiência
mostra-me que muitos pais desejam e mostram necessidade de alguma ajuda ou
orientação nestas matérias. Sabemos que estratégias proibicionistas tendem a
perder eficácia com a idade.
Creio que o caminho terá de
passar por autonomia, supervisão, diálogo e muita atenção aos sinais que
crianças e adolescentes nos dão sobre o que se passa com elas.
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