Foi hoje divulgado que os exames nacionais do secundário terão a mesma estrutura que os do ano passado incluindo questões de resposta opcional. No entanto, dado que em 2020 se verificaram notas muito altas em algumas disciplinas, este ano o número de perguntas de resposta opcional é substancialmente menor procurando combater o “enviesamento” verificado.
Sabemos que uma das várias funções
da avaliação é a ordenação dos alunos, ou seja, ser eficiente no escrutinar o nível de conhecimentos dos alunos e ordenar esse nível de acordo com a escala definida. Assim, se num determinado exame a generalidade das notas está muito
perto da nota mais alta, ou, pelo contrário, muito perto da nota mais baixa,
algo não está adequado no exame, não cumpre a função de ordenação dos alunos
pelo seu nível de conhecimento, para além de não cumprir outras funções.
A este propósito, recordo que em
2015 causou alguma polémica a afirmação do então Presidente do IAVE numa conferência que
existiria uma gestão política dos exames, exemplificando que uma alteração cirúrgica
numa ou duas perguntas seria suficiente para que as médias subissem ou
descessem conforme a “encomenda”.
A questão persiste e é tanto mais
relevante quanto o peso que a nota dos exames finais tem na candidatura ao
ensino superior.
Os alunos que no ano passado se confrontaram com uma estrutura mais “amigável” com várias perguntas de resposta opcional poderão ter realizado a sua candidatura ao superior em condições mais favoráveis que os alunos deste ano, as médias serão mais baixas, independentemente do nível de conhecimento dos dois grupos. Acresce ainda a leitura que os resultados finais merecerão em termos comparativos se os exames têm estruturas diferentes, tal como aconteceu comparando os exames de 2019 com os de 2020.
É também por estas questões que, recorrentemente e de há muito, tenho defendido um ajustamento no acesso ao ensino superior.
Entre outras questões e como
tantas vezes tenho escrito coloca-se desde logo a desvalorização do próprio
ensino secundário que deveria ser valorizado e percebido com a finalização de
um ciclo de estudos e não como a antecâmara do superior e a sala de explicações
para preparação para os exames, aliás ouve-se com frequência o desconforto de
docentes de ensino secundário como este quadro. Na verdade, sentem o seu
trabalho com os alunos hipotecado ao peso dos exames e não à formação a
adquirir no ensino secundário nas diferentes disciplinas.
Por outro lado, a situação actual
favorece, como é sabido e reconhecido, a iniquidade assente na "simpatia
generosa" de algumas escolas, maioritariamente privadas, que inflacionam a
avaliação interna dos alunos ou o florescimento de um nicho de mercado, as explicações
ou centros de estudo, dirigido à preparação para os exames com custos não
acessíveis a boa parte das famílias.
Assim, parece-me ser adequado
entender que a conclusão e certificação de conclusão do ensino secundário e a
candidatura ao ensino superior deveriam ser processos separados.
Os exames nacionais destinam-se,
conjugados com a avaliação realizada nas escolas, a avaliar e certificar o
trabalho escolar produzido pelos alunos do ensino secundário e que, obviamente,
está sediado no ensino secundário.
O acesso ao ensino superior será
um outro processo que deveria ser da responsabilidade do ensino superior e
estar sob a sua tutela com também sugere a recomendação do CNE divulgada em 2020.
Seriam exigidos, naturalmente, dispositivos de regulação deste processo.
Parecer-me-ia mais ajustado que
as classificações, internas e externas no ensino secundário deveriam constituir
apenas um factor de ponderação a contemplar com outros critérios nos processos
de admissão organizados pelas instituições de ensino superior como, aliás,
acontece em muitos países.
Sublinho minimizando equívocos que a questão não está na existência ou importância dos exames finais do secundário que não me parece colocar grandes dúvidas.
Enquanto não se verificar a
separação da conclusão do secundário da entrada no superior não valorizamos o
ensino secundário no que lhe é próprio e ainda corremos o risco de lidar com
situações e negócios que sendo úteis a alguém não o serão, obviamente para a
maioria das famílias. .
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