quinta-feira, 24 de junho de 2021

A PROPÓSITO DO VAP (VALOR ACRESCENTADO DO PROFESSOR)

 

Foi ontem apresentado um trabalho realizado por investigadores da Nova School of Business and Economics (SBE) e do University College London para o think tank Edulog sobre o impacto do trabalho dos professores.

Para o efeito foi definida uma medida, o VAP – Valor Acrescentado do Professor e consoante o seu VAP divididos em percentis. Lê-se no Público que os investigadores concluíram que “se todos os docentes que estão no percentil 10 – ou seja, entre os 10% com menos efeito nas notas – passassem a ter o desempenho dos colegas do percentil 90 – isto é, os 10% com mais impacto – havia uma melhoria substancial dos resultados dos estudantes”. Como exemplo e referindo o secundário, se os docentes com menor VAP (percentil 10) estivessem incluídos no percentil 90, a percentagem de notas negativas caía de 70% para 23%. Também o número de estudantes com classificação máxima passava de zero para 17%.

Não conheço o estudo, nem como é construído o VAP, mas assumo recorrentes dúvidas sobre estudos desta natureza em que predomina economia e falta educação. Apesar de não conhecer o construto Valor Acrescentado do Professor e certamente por iliteracia minha em economia da educação, temo o risco ver definida a avaliação dos raros alunos dos cursos de formação de professores pelo seu potencial de VAP ou avaliar os professores pelo VAP. A ver vamos.

No entanto, dito isto, também conheço e reconheço de há muito o impacto que o trabalho dos professores tem no desempenho dos alunos, o Council for Exceptional Children, entidade dos EUA, afirmava em 2000 que "O factor individual mais contributivo para a qualidade da educação é a existência de um professor qualificado e empenhado".

É também verdade que raramente a profissão professor tem estado tanto em foco como nos últimos anos bem como a necessidade de defender a qualidade da escola pública.

Múltiplas acções e decisões políticas, bem como alguma imprensa e "opinion makers" têm contribuído para degradar a sua função, fragilizar a sua imagem social e comprometer o clima e a qualidade do trabalho desenvolvido nas escolas apesar dos professores continuarem a ser uma das classes profissionais em que os portugueses mais confiam.

A atenção que tem estado centrada nos professores advém de boas e más razões. Não cabe aqui um balanço, e entendo que, tal como os miúdos, os professores não têm sempre razão, os discursos dos seus representantes são, por vezes parte do problema e não parte da solução e também sei que existem alguns professores que o não deviam ser. No entanto, a verdade é que a esmagadora maioria dos docentes são ... Professores, muito bons Professores, talvez tenham mesmo um bom “VAP”.

Ser professor no ensino básico e secundário por razões conhecidas e por vezes esquecidas, é hoje uma tarefa de extrema dificuldade e exigência que social e politicamente justifica um reconhecimento e valorização frequentemente negligenciados. Acresce que é uma tarefa desempenhada por uma classe extremamente envelhecida e cansada como tem sido amplamente estudado e divulgado.

Por um momento, pensemos no que é ser professor em algumas escolas que décadas de incompetência na gestão urbanística, nas políticas sociais e consequente guetização social produziram.

Pensemos ainda na forma como milhares de professores cumprem a sua carreira, muitos deles sem a possibilidade de desenharem projectos de vida para si quando são os principais responsáveis por lançar projectos de vida para os miúdos com quem trabalham. Aliás, nos últimos anos, milhares de professores, de bons professores e professores necessários, foram constrangidos à reforma e muitos ao desemprego por uma política de contabilidade inimiga da educação pública e da qualidade.

Pensemos em como os professores são injustiçados nas apreciações de muita gente que no minuto a seguir a dizer uma qualquer ignorante barbaridade, vai numa espécie de exercício sadomasoquista entregar os filhos nas mãos daqueles que destrata, depreendendo-se assim que, ou quer mal aos filhos ou desconhece os professores e os seus problemas.

Pensemos como é imprescindível que a educação e os problemas dos professores não sejam objecto de luta política baixa e desrespeitadora dos interesses dos miúdos, mesmo por parte dos que se assumem como seus representantes.

Pensemos que a forma como os miúdos, pequenos e maiores, vêem e se relacionam com os professores está directamente ligada à forma como os adultos os vêem e os discursos que fazem.

Pensemos finalmente nos professores que nos ajudaram a chegar ao que hoje cada um de nós é, aqueles que carregamos bem guardadinhos na memória, pelas coisas boas, mas também pelas más, tudo contribuiu para sermos o que somos.

A valorização social e profissional dos professores em diferentes dimensões é uma ferramenta imprescindível a um sistema educativo com mais qualidade.

Gostava ainda de deixar uma ideia do enorme João dos Santos, “O Professor João, foi meu professor porque foi meu amigo” e uma convicção pessoal que a idade cada vez mais cimenta, qualquer professor ou educador, tanto ou mais do que aquilo que sabe, ensina aquilo que é. É da relação que tudo nasce numa sala de aula, qualquer que seja a configuração.

A verdade é que de todos os professores que connosco se cruzaram os que mais nos marcaram positivamente foi sobretudo pelo que eram e menos pelo que nos ensinaram por importante que seja. Deixaram-nos um “Valor Acrescentado” que não sabemos medir, mas sabemos que ficou.

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