Foram hoje a discussão no Parlamento propostas legislativas com o objectivo de tornar gratuitos os manuais escolares ou, em versão mais leve, estruturar bolsas de empréstimos que permitam o acesso das famílias aos manuais em condições mais favoráveis. A proposta da gratuitidade foi chumbada por PS e PSD devido ao impacto económico da medida, enquanto as propostas das bolsas de empréstimo foram aprovadas com o voto contra do PS.
Algumas notas sobre a questão dos manuais escolares e que já aqui abordámos. A Constituição da República estabelece no Artigo 74º que “Compete ao Estado assegurar o Ensino Básico universal, obrigatório e gratuito”.
Segundo a Associação Portuguesa de Editores e Livreiros os manuais obrigatórios representam um encargo de 80 milhões de euros para as famílias de 1,4 milhões de alunos. Sabe-se também que ao abrigo do PEC se verificaram ajustamentos nas regras e destinatários dos apoios sociais escolares, que temos cerca de dois milhões de portugueses em risco de pobreza e um terço das famílias a viver mesmo encostadas a esse limiar. Acresce ainda que ao custo com os manuais se deve acrescentar o encargo com material escolar e livros de apoio sempre “sugeridos” pelas escolas e que determinam, de acordo com o INE, que as famílias portuguesas gastem mais que a média europeia em educação.
Também sabemos que o investimento individual, familiar e institucional na educação é um investimento no futuro e, naturalmente, os investimentos têm custos que devem ser repartidos, tanto quanto possível de forma justa e na defesa intransigente da qualidade da escola pública mas, como muita gente diariamente dá por isso, o nosso modelo social, económico e também o sistema educativo não é justo.
A questão dos manuais escolares é complexa e muito importante, é um nicho de mercado no valor de muitos milhões como referimos. Depois da abolição do execrável livro único de natureza totalitária e da proliferação de manuais aos milhares parece ter-se entrado numa fase de alguma estabilidade e, sobretudo, da necessária qualidade, ainda que insuficientemente regulada.
No entanto, do meu ponto de vista, importa questionar não só o papel dos manuais mas, fundamentalmente, da quantidade enorme de outros materiais que os acompanham e que contribuem de forma muito significativa para o aumento da factura dos custos familiares com a educação potenciando injustiça e desigualdade de oportunidades. De facto, para além de imenso material de outra natureza, temos em cada área programática ou disciplina uma enorme gama de cadernos de fichas, cadernos de exercícios, cadernos de actividades, materiais de exploração, etc. etc. que submergem os alunos e oneram as bolsas familiares, até porque muitos destes materiais não são incluídos nos apoios sociais escolares. Em muitas salas de aula verifica-se a tentação de substituir a “ensinagem”, o acto de ensinar, pela “manualização” ou “cadernização” do trabalho dos alunos, ou seja, a acção do professor é, sobretudo, orientar o preenchimento dos diferentes dispositivos que os alunos carregam nas mochilas.
Esta questão, que não me parece suficientemente reflectida nas suas implicações acaba por baixar a qualidade das aprendizagens e apesar de se promover algum controlo da qualidade dos manuais, o mesmo não se verifica com os chamados materiais de apoio o que envolve custos pesados de natureza diversa.
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