segunda-feira, 25 de outubro de 2010

O MAL ESTAR DA JUSTIÇA

Muitas vezes tenho referido no Atenta Inquietude que uma das dimensões fundamentais para uma cidadania de qualidade é a confiança no sistema de justiça. É imprescindível que cada um de nós sinta confiança na administração equitativa, justa e célere da justiça. Assim sendo, a forma como é percebida a justiça em Portugal, forte com os fracos, fraca com os fortes, lenta, mergulhada em conflitualidade com origem nos interesses corporativos e nos equilíbrios da partidocracia vigente constitui uma das maiores fragilidades da nossa vida colectiva.
Neste contexto, a divulgação hoje de um Relatório da Comissão Europeia para a Eficácia da Justiça no âmbito do Conselho da Europa contem alguns dados verdadeiramente interessantes e que merecem reflexão atenta. Duas pequenas notas. A seguir à Itália somos o país com a justiça mais lenta entre os 45 países considerados. Um processo demora em média cerca de 430 dias a ser resolvido. Um outro dado significativo é que somos um dos países com um rácio maior de profissionais de justiça por 100 000 habitantes, 294,9, (envolve juízes, advogados, procuradores e notários). É notável, este facto transmite a ideia que esta gente toda se atropela, engarrafando processos e procedimentos.
Estando em aberto um inaceitável conflito, nos termos em que é colocado, entre o governo e os representantes sindicais da classe dos juízes devido a cortes no subsídio de habitação, o estudo da Comissão Europeia também mostra que os juízes portugueses são em final de carreira dos mais bem remunerados entre o países considerados, ganham cerca de 4,2 vezes o salário médio bruto nacional. Para comparação, na Bélgica, França, Finlândia, Noruega, Suécia, Áustria, Holanda, Dinamarca ou Alemanha o valor é de 2,1.
Este cenário global é verdadeiramente preocupante, temos recursos razoáveis e temos um sistema em que não temos confiança, ineficaz e lento.
Finalmente, a maior preocupação decorre da percepção de que ninguém parece verdadeiramente interessado em alterar este quadro. Sofrem os cidadãos individualmente e sofre a qualidade da vida cívica do país.

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