quarta-feira, 15 de março de 2017

DESCENTRALIZAÇÃO, MUNICIPALIZAÇÃO OU AUTONOMIA?

Em evento hoje realizado com organização do ME sobre o modelo de descentralização de competências em educação o presidente do Conselho de Escolas alertou para a necessidade de manter e promover a autonomia das escolas. Dito de outra maneira, descentralização não é o mesmo que municipalização, um dos  muitos equívocos presentes no universo da educação em Portugal.
Como já tenho referido é importante este equívoco seja considerado quando se discute os modelos de descentralização que estão em fase de experimentação e cuja avaliação não é, pelo menos para mim, conhecida.
Sabemos das reservas que directores e professores e também pais e encarregados de educação têm manifestado face  ao modelo que tem sido anunciado de “municipalização” que possibilitará que serviços, actividades e/ou projectos, nomeadamente de administração escolar, papelaria, refeitório, biblioteca, bem como serviços de apoio educativo, incluindo psicologia ou desporto escolar, possam ser subcontratados a operadores privados.
O Conselho de Escolas e as associações de directores bem como os professores temem a diminuição da autonomia das escolas apesar da retórica da tutela.
Seria desejável uma avaliação séria e externa das experiências em desenvolvimento.
Por outro lado, insisto na necessidade de se considerarem com atenção os resultados de experiências de "municipalização" realizadas noutros países cujos resultados estão longe de ser convincentes. A Suécia, por exemplo, está assistir-se justamente a um movimento de "recentralização" considerando os resultados, maus, obtidos com a experiência de municipalização.
Por outro lado, o que se vai passando no sistema educativo português no que respeita ao envolvimento das autarquias nas escolas e agrupamentos, designadamente em matérias como as direcções escolares, os Conselhos gerais ou a colocação de funcionários e docentes (nas AECs, por exemplo) dá para ilustrar variadíssimos exemplos de caciquismo, tentativas de controlo político, amiguismo face a interesses locais, etc. O controlo das escolas é uma enorme tentação. Podemos ainda recordar as práticas de muitas autarquias na contratação de pessoal, valorizando as fidelidades ajustadas e a gestão dos interesses do poder.
Assim sendo, talvez seja mesmo recomendável alguma prudência embora, confesse, não acredite pois não se trata de imprudência, trata-se de uma visão, de uma agenda.
Ainda nesta matéria e dados os recursos económicos que se anunciam através das verbas comunitárias para além dos dinheiros públicos, parece clara a intenção política de aumentar o "outsourcing", a intervenção de entidades e estruturas privadas que já existem nas escolas, muitas vezes com resultados pouco positivos, caso de apoios educativos a alunos com necessidades educativas especiais e do recurso a empresas de prestação de serviços, (de novo o exemplo das AECs).
Está expressa nos Projectos de contrato em funcionamento a intenção de contratar a privados a prestação destes serviços nas escolas, incluindo no universo da inclusão, um modelo ineficaz pois a intervenção de qualidade e adequada dos técnicos, designadamente de educação ou psicólogos, depende, evidentemente, da sua pertença às equipas das escolas e não é compatível com a prestação de serviços por técnicos de fora em regime de "consulta".
Um modelo deste tipo, estruturas e entidades privadas a intervir em escolas públicas, só é garantidamente bom para as entidades a contratar, não, muito provavelmente, para alunos, professores e escolas. Temo que “municipalização” possa ser um incremento e apoio a um nicho de mercado.
Finalmente, importa desfazer o equívoco que referia acima, descentralização não significa municipalização e importa promover a autonomia o que é diferente. De acordo com o modelo em desenvolvimento, esperemos para ver mais claramente o que o ME proporá, e conforme os directores têm referido recorrentemente, a autonomia da escola não sai reforçada, antes pelo contrário, passa para as autarquias por delegação de competências do ME. O imprescindível reforço da autonomia das escolas e agrupamentos não depende da municipalização como muitas vezes se pretende fazer crer.
Mais uma vez, confundir autonomia das escolas descentralização traduzida em municipalização é criar um equívoco perigoso dar cobertura aos negócios da educação.

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