segunda-feira, 20 de março de 2017

ENTRE HELSÍNQUIA E LISBOA

Achei particularmente interessante o trabalho de Alexandre Homem Cristo no Observador sobre a reforma educativa em curso na Finlândia.
Achei interessante por alguns dos conteúdos da Reforma que já aqui comentei em textos anteriores e pareceu-me ainda mais curioso o texto de Alexandre Homem Cristo quando questões centrais nesta reforma estão nos antípodas da visão de Nuno Crato que tão apoiado foi, é, pelos falcões do Observador entre os quais se conta Alexandre Homem Cristo. Aliás o autor reconhece isso mesmo quando afirma, ”quando o ministro Nuno Crato defendeu ser necessário reforçar a carga horária nas disciplinas estruturantes. Mas não foi esse o caminho escolhido pelos finlandeses, que viram nestes problemas (abaixamento de resultados escolares) uma oportunidade para mudar e abrir o sistema aos saberes transversais.”
Tal opção traduziu-se numa estrutura curricular assente em programas demasiados extensos, excessivamente prescritivos e na definição de metas curriculares que, na forma como estão formuladas, fazem correr o sério risco de que o ensino se transformar na gestão de uma espécie de "check list" das metas estabelecidas implicando a impossibilidade de acomodar as diferenças, óbvias, entre os alunos, os seus ritmos de aprendizagem.
Também a hipervalorização da avaliação externa em detrimento da avaliação de natureza mais formativa. A avaliação externa é imprescindível mas não pode tornar-se o tudo na vida da escola como foi seguido com o aplauso do opinador.
Na Finlândia, o modelo curricular em desenvolvimento passou a assentar em sete competências transversais e a multidisciplinariedade é uma dimensão obrigatória. Os pressupostos definidos contemplam três eixos “Repensar o conceito de aprendizagem, que está relacionado com a ideia de colaboração e de satisfação do aluno no processo educativo. Repensar a cultura da escola e o seu relacionamento com a comunidade. E repensar os objectivos da escola e o conteúdo das disciplinas”.
Acrescento ainda recorrendo a textos anteriores outras questões definidas como base da mudança, "a questão do clima de sala de aula", o entendimento das escolas como "comunidades de aprendizagem"", "a importância da "alegria de aprender"", "a cooperação entre alunos e a sua autonomia" ou "aprender a aprender" que são identificados como "objectivos chave" e que, do meu ponto de vista, são isso mesmo, "aspectos chave".
Este entendimento mereceria certamente a classificação de “eduquês” (seja lá isso o que for) e, portanto, seria uma das fontes do mal. A este propósito, veja-se o discurso de um quintal crático, a Sociedade Portuguesa de Matemática, sobre o Perfil dos Alunos para o Séc. XXI que em alguns aspectos expressa uma visão próxima da abordagem finlandesa. Esta rapaziada queimaria numa fogueira esta reforma curricular na Finlândia.
De qualquer forma é com agrado que registo alguma mudança que me parece presente no discurso de Alexandre Homem Cristo.
Finalmente uma chamada de atenção para o entendimento finlandês de que as reformas em educação se devem processar regularmente, de forma participada, avaliada, com ciclos de vida para além dos ciclos político-eleitorais. Em Portugal, a educação é um terreno altamente permeável e apetecível para as lutas de poder e controlo da partidocracia vigente, muito divido entre quintais, corporações e umbiguismos o que lhe retira serenidade e em que as mudanças são constantes, inconsistentes e à deriva.
Como já disse muitas vezes, não se trata de comparar o que não tem comparação, trata-se de reflectir sobre o que vai acontecendo
Acho que somos capazes de fazer melhor do que tem acontecido.

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