quarta-feira, 1 de março de 2017

INDEPENDÊNCIA E AUTODETERMINAÇÃO, UMA QUESTÃO DE DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA

Está em discussão pública o conjunto de propostas do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social relativo às pessoas com deficiência e que envolvem aspectos como uma nova Prestação Social para a Inclusão em que está prevista uma prestação única que substitui a Pensão Social de Invalidez ou o Subsídio Mensal Vitalício e o novo Modelo de Apoio à Vida Independente, medida que permitirá que uma pessoa com incapacidade igual ou acima dos 60% possa ter um assistente pessoal.
Neste sentido parece importante o testemunho de hoje no Público de uma cidadã com deficiência sobre os obstáculos na sua vida e o impacto das medidas em discussão.
Retomo algumas notas sobre as políticas sociais dos últimos anos neste universo.
Na verdade, a política social dos últimos anos pode, também, sintetizar-se da seguinte forma, cortes brutais nos apoios às pessoas, às famílias, Rendimento Social de Inserção, subsídio de desemprego, abono de família, etc., e aumento dos apoios às instituições que operam no sector social.
Para quem nos tem governado os pobres ou pessoas com deficiência não são capazes de tomar conta de si próprias, precisam sempre da tutela cuidadora de uma instituição. Uma versão enviesada de um estado social.
Com este entendimento, a título de exemplo e como alguns trabalhos têm evidenciado, o Estado prefere entregar a uma instituição uma verba para alimentar uma família numa cantina social superior à verba que essa família recebe em Rendimento Social de Inserção.
Como é evidente as instituições agradecem, as pessoas comem mas ... não se libertam da pobreza e da dependência.
Situação semelhante se tem passado passa no universo das pessoas com deficiência existe o mesmo problema que tem motivado uma luta importante por parte das pessoas com deficiência.
De facto, o estado subsidia as instituições para apoio a deficientes em 951€ mais uma parte dos rendimentos dos cidadãos institucionalizados mas não apoia as próprias pessoas que poderiam encontrar por sua iniciativa respostas e, provavelmente, com menores custos. Os cidadãos com deficiência exigem também assumir a decisão sobre a escolha do seu cuidador(a) dada a natureza da relação que se estabelece. Saliente-se que a proposta em discussão pública não parece prever esta autodeterminação da pessoa na escolha do seu assistente pessoal.
Mas é esse o entendimento subjacente a boa parte das políticas sociais, os pobres, tal como as pessoas com deficiência, não sabem tomar conta de si, precisam sempre da presença de uma instituição prestadora de cuidados, não são autodeterminadas, independentes.
Como é evidente, este discurso não pretende tornar dispensáveis as instituições, são necessárias particularmente em situações de crise ou de problemáticas mais severas, mas, simplesmente, de defender que as pessoas, muitas delas, são capazes de tomar conta de si próprias, incluindo a gestão dos apoios que a sua situação possa justificar.
No fundo, é, simplesmente, uma questão de direitos individuais e sociais.
Esperemos que a porta agora aberta não se feche nem se deturpe e se caminhe no sentido certo, o respeito pela autonomia e direitos individuais e sociais das pessoas com deficiência, designadamente, o direito à independência e autodeterminação.

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