Foi formalmente anunciada a
constituição de 31 equipas para apoio a crianças e jovens vítimas de violência
doméstica. Estas equipas integram as Respostas de Apoio Psicológico para
crianças e jovens atendidos ou acolhidos na Rede Nacional de Apoio às Vítimas
de Violência Doméstica.
Esta iniciativa tinha sido
anunciada em Janeiro e nela estão envolvidas a Comissão para a Cidadania e a
Igualdade de Género e a Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP) através de um
protocolo de colaboração na resposta.
Recordo que em Julho foi finalmente
aprovado o estatuto de vítima para as crianças e jovens em contexto de
violência doméstica algo reclamado de há muito pelo Instituto de Apoio à
Criança e pela a Ordem dos Advogados existindo ainda uma petição com o mesmo
objectivo e que reuniu perto de 50 000 assinaturas.
Neste contexto é de sublinhar que
o relatório Anual da Comissão Nacional Promoção dos Direitos e Protecção das
Crianças e Jovens relativo a 2020 se refere que, à excepção da exposição de
crianças e jovens a situações de violência doméstica ou mesmo o seu envolvimento
foi a situação que mais se agravou face a 2019, 7,7%. Também se registou um
ligeiro aumento nos casos de maus tratos psicológicos, de 284 em 2019 para 288
crianças em 2020. Todos os outros
indicadores desceram.
Para além de sublinhar os danos
potenciais que esta exposição pode provocar nas crianças gostava de chamar a
atenção para um outro potencial efeito nas crianças que assistem a episódios,
por vezes violentos, de violência doméstica, os modelos de relação pessoal que
são interiorizados. Aliás, nos últimos anos tem-se verificado que a maioria das
queixas de violência doméstica é apresentada por mulheres jovens o que permite
pensar em crianças pequenas que assistirão a estes episódios e nas potenciais
consequências. Nesse sentido, operacionalização das equipas de apoio é uma boa
notícia.
Numa avaliação por defeito aos
casos participados de violência doméstica estima-se que cerca de metade serão
testemunhados por crianças. Se considerarmos que existem muitíssimas situações
não reportadas, pode concluir-se que estas testemunhas, por vezes também
vítimas, serão em número bem mais elevado.
Este quadro lembra o velho adágio
"Filho és, pai serás", ou seja, num processo de modelagem social
muitas crianças tenderão a replicar ao longo da sua vida, em adultos também, os
comportamentos a que assistiram e que, tal como podem produzir efeitos
traumáticos, poderão adquirir aos seus olhos, infelizmente, um estatuto de
normalidade.
Não é certamente por acaso que
estudos recentes em Portugal evidenciaram números elevadíssimos de violência em
casais de jovens namorados universitários, uma população já com níveis de
qualificação significativos.
Neste contexto e com o objectivo
de contrariar uma espécie de fatalidade em círculo vicioso, os miúdos assistem
à violência doméstica, replicam a violência, a sociedade é violenta, quando crescem
são violentos em casa, e assim sucessivamente, importa que os processos
educativos e de qualificação sublinhem a dimensão, a formação cívica e o quadro
de valores.
Não é nada de novo, a afirmação
desta necessidade.
A questão é que a intervenção
junto das famílias e a tentativa de contrariar dinâmicas disfuncionais,
violência doméstica por exemplo, não dispõe dos meios e recursos suficientes e
os riscos para crianças e jovens são significativos.
Como afirma, Benedict Wells em “O fim da solidão”, “Uma infância difícil é como um inimigo invisível. Nunca se sabe quando nos vai atingir”.
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