O Projecto "Limites Invisíveis" iniciado em 2016 em Coimbra desenvolvido pela ESE de Coimbra, pelo Centro de
Apoio Social de Pais e Amigos da Escola pelo Departamento de Educação e
Psicologia da Universidade de Aveiro envolve vários Jardins de Infância de
Coimbra e estruturas de ensino superior leva as crianças a brincar no exterior,
na mata do Choupal, qualquer que seja o tempo. As poças, as árvores ou os
trilhos com lama, são equipamentos educativos.
A avaliação, referida no Público,
refere que as crianças desenvolvem maior autonomia, maior consciência ambiental
e competências em dimensões como bem-estar
emocional, a partilha de emoções, a autonomia, a auto-confiança,
auto-regulação, a criatividade ou o pensamento crítico.
A experiência estendeu-se ao 1º
ciclo, com a designação Salto à Mata no passado ano lectivo com a saída semanal
e ao longo de todo o ano dos alunos das turmas envolvidas para actividades de
exploração nos espaços verdes nas proximidades.
Trata-se de uma iniciativa que me
parece de valorizar e promover e a ela me referi aqui em 2017. Está profundamente estabelecida a importância
das actividades ao ar livre que deveriam ser uma rotina e não uma excepção na
educação formal e não formal dos mais novos.
Somos dos países da Europa em que
adultos e crianças menos desenvolvem actividades no exterior contrariamente,
por exemplo ao que se verifica nos países nórdicos. É verdade que esses países
têm habitualmente climas bastante mais amenos que o nosso mas, ainda assim,
poderíamos ter durante mais tempo crianças e adultos a realizar actividades no
exterior. Como regra a área curricular Estudo do Meio, mas não só, poderia ser também Estudo no Meio.
Tal como se refere na peça do
Público as vantagens destas actividades são de diferente natureza e positivas
pelo que não vale a pena repetir.
Deixo apenas umas notas a partir
de uma cena a que assisti e que se enquadra neste texto.
Há algum tempo, num fim de tarde
em que ainda conseguia realizar uma corridinha num espaço verde aqui da zona, o
Parque da Paz, passei por um grupo familiar e a minha estonteante velocidade
deu para perceber que uma gaiata pequenina vinha descalça ao colo do pai e
pedia para que ele a pusesse no chão relvado. Ouvi o pai dizer que “não se pode
andar descalço”, “para não ser teimosa porque se quis descalçar” e agora tinha
que ir ao colo. Para convencer a criança, falava-lhe, cito dos "bichos que
estão no chão”, da “quantidade doenças que apanharia de andar na relva
descalça" e mais que entretanto já não ouvi. Reparei ainda que a criança
vinha a comer qualquer coisa que ia retirando de um pacote.
É notável, aquele pai revelava
uma enorme preocupação com os riscos gravíssimos de andar descalço num relvado
bem tratado e, habitualmente, sem a visita dos cães e achava aparentemente,
natural a criança comer qualquer coisa hipercalórica certamente muito perto da
hora de jantar.
Esta atitude ilustra algo que
entre nós está muito presente, um aparente discurso de preocupação que, embora
se perceba, eu diria excessiva, com muitas das actividades que as crianças
podem, eu diria devem, fazer e, ao mesmo tempo, somos frequentemente
negligentes com aspectos verdadeiramente graves de que cito como exemplos o
enorme número de acidentes domésticos com crianças ou a obesidade infantil que
já é um problema sério de saúde pública.
Muitas vezes, estes pais que
protegem tanto as crianças dos riscos de andar descalço, por exemplo, estão
também entre os que descansam, no seu entendimento, quando as crianças estão
"livres de riscos" no quarto, sós, trancadas num ecrã.
Deixem lá os putos andar
descalços e rebolar na relva. E já agora juntem-se a eles. Faz bem a todos.
Finalmente, ainda uma chamada de
atenção para duas peças muito interessantes sobre estas questões expressas por
dois especialistas também há já algum tempo na comunicação social generalistas.
A primeira, uma entrevista ao pediatra Pedro Oom a propósito do seu novo livro, “Infectário”. A segunda,
também uma entrevista ao investigador Brett Finlay, co-autor do livro “Deixe-os
Comer Terra”. Em ambas as entrevistas se sublinha a importância de repensar a
nossa acção educativa muito marcada pela inibição de experiências e actividades
importantes a vários níveis para o desenvolvimento e bem-estar das crianças.
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