Não é com a frequência que
gostaríamos que se encontram boas notícias no universo da educação, mas
registamos quando tal acontece.
O MECI divulgou hoje a a
autorização para vinculação de 830 psicólogos nos quadros de agrupamentos e
escolas tal como de 576 técnicos especializados, como terapeutas da fala,
assistentes sociais ou técnicos de informática.
Ainda de acordo com o MECI, passarão a estar nas escolas 1655 psicólogos com vínculo permanente permitindo que todas tenha pelo menos um profissional nos seus quadros. Neste contexto, o rácio médio de psicólogo por número de alunos passará 1472 para cada profissional para 711 alunos. Recordo que as orientações nacionais e internacionais definem como desejável um rácio de um para 500 alunos que, aliás, também já foi definido como objectivo pelo Ministério na Lei n.º 54/2025 de 10 de Abril deste ano. Esta lei alterou o velhinho Decreto-Lei n.º 190/91, de 17 de Maio de 1991.
Importa recordar que muitos
destes profissionais têm desempenhado durante anos funções nas escolas com
contratos a termos.
Umas notas para insistir na
relevância dos Serviços de Psicologia criados em 1991 por legislação agora
alterada e que nessa altura acompanhei durante algum tempo enquanto estive nos
Serviços do ME que os tutelava, a Divisão de Orientação Educativa.
Considerando o Referencial para a
Intervenção dos Psicólogos em Contexto Escolar, o estado da arte em matéria de
psicologia da educação e do desenvolvimento e de contextos de intervenção
carregados de constrangimentos, o empenhamento e a competência dos
profissionais pode dar um contributo sólido para a qualidade dos processos
educativos de todos os alunos.
Para além do trabalho com alunos
é crítica a colaboração e intervenção com professores, funcionários, direcções
e pais e encarregados de educação, para além de outras respostas na comunidade
dirigidas à população em idade escolar.
No entanto, como tantas vezes
tenho escrito e afirmado, desde 1991 a presença dos psicólogos em contextos
educativos tem vivido entre as declarações dos vários actores, incluindo a
tutela, sobre a sua necessidade e importância e a lentidão, insuficiência e
precariedade no sentido da sua concretização.
Tem sido recorrente a afirmação
por parte de sucessivas equipas do ME da prioridade em promover o alargamento
do número de técnicos e a estabilidade da sua presença nas comunidades
educativa, mas é algo que, como se percebe, tarda em concretizar-se e insisto
em notas já por aqui escritas e marcadas pelo óbvio envolvimento pessoal, quer
na formação, quer na intervenção ao longo de algumas décadas.
No entanto, para além da
precariedade, o número de psicólogos a desempenhar funções no sistema educativo
público tem estado longe do rácio aconselhado para um trabalho mais eficiente.
Não têm sido raras as situações
em que existe um psicólogo para um agrupamento com várias escolas e que envolve
um universo com mais de 1500 alunos e a deslocação permanente entre várias
escolas numa espécie de psicologia em trânsito. Não será uma resposta, é um
fingimento de resposta que não serve adequadamente os destinatários, a
comunidade educativa, como também, evidentemente, compromete os próprios
profissionais.
Temos também inúmeras escolas
onde os psicólogos não passam ou têm “meio psicólogo” ou menos e ainda a
prestação de apoios especializados de psicologia em “outsourcing” e com a
duração de meia hora semanal uma situação inaceitável e que é um atentado científico
e profissional e, naturalmente, condenado ao fracasso de que o técnico
independentemente do seu esforço e competência será responsabilizado. No
entanto, dir-se-á sempre que existe apoio de um profissional de psicologia. O
Referencial orientador da intervenção dos psicólogos nos contextos escolares é
um documento positivo, mas corre o risco ser inaplicável em muitas situações
face ao alargado espectro de funções e actividades previstas associado ao
universo de destinatários.
Neste cenário, a intervenção dos
profissionais, apesar do esforço e competência, tem um potencial de impacto
aquém do desejável e necessário. Áreas de intervenção como dificuldades ou
problemas nas aprendizagens, questões ligadas aos comportamentos nas suas
múltiplas variantes, alunos com necessidades especiais, trabalho com
professores e pais, trabalho ao nível da prevenção de problemas, etc., exigem
recursos e tempo que não estão habitualmente disponíveis.
Acresce que o recurso ao modelo
de “outsourcing” ou a descontinuidade do trabalho é um erro em absoluto, é
ineficaz, independentemente do esforço e competência dos profissionais
envolvidos.
Como é que se pode esperar que
alguém de fora da escola, fora da equipa, técnica e docente, fora dos circuitos
e processos de envolvimento, planeamento e intervenção desenvolva um trabalho
consistente, integrado e bem-sucedido com os alunos e demais elementos da
escola?
Das duas uma, ou se entende que
os psicólogos sobretudo, mas não só, os que possuem formação na área da
psicologia da educação podem ser úteis nas escolas como suporte a dificuldades
de alunos, professores e pais em diversos áreas, não substituindo ninguém, mas
providenciando contributos específicos para os processos educativos e,
portanto, devem fazer parte das equipas das escolas, base evidentemente
necessária ao sucesso da sua intervenção, ou então, é uma outra visão, os
psicólogos não servem para coisa alguma, só atrapalham e, portanto, não são
necessários.
A situação que tem existido
parece, no mínimo, um enorme equívoco que além de correr sérios riscos de
eficácia e ser um, mais um, desperdício (apesar do empenho e competência que os
técnicos possam emprestar à sua intervenção), tem ainda o efeito colateral de
alimentar uma percepção errada do trabalho dos psicólogos nas escolas.
Há um ano que cheguei ao fim de
uma carreira de 46 anos ligada à psicologia da educação e ainda aguardo que a
importância e prioridade sempre atribuídas ao trabalho dos psicólogos em
contextos educativos se concretizem de forma suficiente e estável.
Será agora?
Sem comentários:
Enviar um comentário