terça-feira, 26 de agosto de 2025

OS DIAS DOS PÉS DE BURRO

 A lida por aqui no monte envolve um conjunto de rotinas ao longo ao ano. Por esta altura e até ao início de Setembro, é altura da limpeza dos “pés de burro” das oliveiras, os rebentos que surgem na base do tronco e à sua volta. Com uma enxada, um sacho forte e tesourão o trabalho faz-se.

Depois é carregar e triturar para compostagem ou queimar os sobrantes quando for possível. Quando se gosta a lida fica mais branda e aqui no Monte nunca se acaba, Também acontece que enquanto se trabalha temos um tempinho de alheamento do inquietante desassossego do mundo.

As oliveiras que considero as árvores mais bonitas do nosso património ficam ainda mais bonitas quando limpas e com a vantagem de ser mais fácil estender os panos para colher a azeitona lá mais para a frente consoante o tempo que virá.

Sendo as oliveiras umas árvores tão bonitas, é para mim uma visão triste um olival de oliveiras velhas sem estarem limpas, cheias de “mato” à volta. Mas cada vez é mais difícil cuidar e manter um olival tradicional.

Sempre que olho para as oliveiras, especialmente aquelas com muitos séculos como algumas aqui do Monte admiro a sua generosidade.

Começam por dar as azeitonas que se comem em três variantes, pisadas, retalhadas e de conserva, qual delas a mais saborosa. Toda a gente tem uma arte de as temperar e, claro, nós também já temos os segredos, aprendemos com o Mestre Marrafa.

As azeitonas vão para o lagar e virá o azeite, a alma do comer bom, e como tem alma o azeite do Meu Alentejo.

Para além da azeitona e do azeite, a oliveira ainda é a mais calorosa das árvores, sempre a aquecer-nos. Aquece-nos quando maldosamente lhe batemos, varejamos, para nos dar a azeitona, aquece-nos quando a limpamos de pés de burro e cortamos os ramos e troncos para assegurar a sua renovação, aquece-nos quando rachamos e arrumamos a lenha que nos deu e, finalmente, ainda nos aquece quando nas noites longas e frias do Inverno arde na salamandra ou na lareira.

Como bondade final, esta generosa capacidade de dar vive numa escala incomensurável para nós, dura séculos.

São tão bonitas e generosas as oliveiras.

E são assim os dias do Alentejo.

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