Li no Público que o Ministro da Educação, Ciência e Inovação anunciou a apresentação nos próximos 15 dias de mais um plano de recuperação das aprendizagens. Não há nada melhor que mais um plano de recuperação. Nada de novo, sempre mais um plano, mais um projecto, mais uma iniciativa, mais um …
Mais a sério, o problema da
recuperação das aprendizagens não é um problema de conjuntura, é um problema de
estrutura.
Parece ser consensual que a maior
ou menor dificuldades nos processos de aprendizagem que possam estar a
acontecer, é extremamente diversificada em cada aluno. Parece razoavelmente
claro que a diversidade de situações, o seu número, os anos de escolaridade dos
alunos, as variáveis contextuais relativas a cada comunidade escolar, recursos
disponíveis em cada comunidade, as necessidades específicas de muitos alunos,
os seus contextos familiares, etc., etc., sugerem que devem ser as escolas a
avaliar as necessidades, identificar os recursos necessários, estabelecer
objectivos, definir metodologias e dispositivos de regulação e avaliação.
Os professores sabem como avaliar
e identificar as dificuldades dos alunos. O que verdadeiramente é
imprescindível é dotar as escolas de forma continua e estável dos recursos
necessários para minimizar tanto e tão rápido quanto possível as dificuldades que
identificam. Recursos suficientes para recorrer a apoios tutoriais ou ao
trabalho com grupos de alunos de menor dimensão, apoios específicos a alunos
mais vulneráveis, técnicos, psicólogos, por exemplo, num rácio que possibilite
um trabalho multidimensionado como é exigido, etc., são essenciais e serão
sempre essenciais. Torna-se também necessária a existência de dispositivos de
regulação, interna e externa, que sustentem o trabalho desenvolvido e de
processos desburocratizados. O modelo actual, com provas de aferição a meio dos
ciclos e ausência de provas finais é inadequado.
Para além das narrativas
institucionais mais “simpáticas”, por assim dizer, a divulgação de resultados
de avaliações que quando comparados com a cada vez mais ameaçada avaliação
externa ou de estudos, deixam imensas dúvidas e o que se vai sabendo das
escolas mostra, sem surpresa, o conjunto de dificuldades que se continuam a
sentir.
Por outro lado, considerando os
indicadores relativos ao impacto das variáveis relativas ao contexto
sociofamiliar e económico dos alunos nos seus trajectos de aprendizagem não se
trata de uma questão compatível com mais um Plano de curto prazo.
Não simpatizo com narrativas
sobre perdas irreparáveis, gerações perdidas ou outros discursos da mesma
natureza que se ouviram no pós-pandemia. No entanto, a verdade é que muitos
alunos incluindo alunos com necessidades especiais, independentemente da
avaliação registada nas grelhas ou nas pautas de avaliação passaram e passam
por sobressaltos e dificuldades no seu percurso escolar.
Neste contexto, a questão central
não deve ser definida em torno de uma perspectiva de recuperação das
aprendizagens ou no bem-estar através de planos de recuperação finitos, mas
sim, na mudança ao nível das políticas públicas dos diferentes países,
incluindo Portugal, que, para além de forma mais imediata “recuperarem
aprendizagens”, tenham impacto a prazo através de recursos suficientes e
competentes, definição de dispositivos de apoio eficientes e de acordo com as
necessidades, apoios sociais que minimizem vulnerabilidades que a escola não
suprime, valorização da educação e dos professores, diferenciação e autonomia
nas respostas das instituições educativas, etc.
Mais uma vez insisto na
necessidade de que o ME estabeleça a simplificação (desburocratização), não o
chamado facilitismo, como orientação central nas diferentes dimensões das
políticas públicas de educação.
Seria desejável e necessário que
o trabalho a desenvolver, os conteúdos envolvidos, os dispositivos em
utilização, a organização de tempos e rotinas, etc., tivessem como preocupação
a simplificação, professores alunos e famílias ganhariam. Esta simplificação
deve incluir a avaliação e registos. Seria positivo que, tanto quanto possível,
se aliviasse a pressão “grelhadora” e a burocracia asfixiante a que
habitualmente escolas e professores estão sujeitos.
Como é evidente, este apelo à
simplificação não tem a ver com menos rigor, qualidade, intencionalidade
educativa ou não proporcionar tempo de efectiva aprendizagem para todos. Antes
pelo contrário, se conseguirmos simplificar processos e recursos, alunos,
professores e famílias beneficiarão mais do esforço enorme que todos têm que
realizar e estão a realizar.
Sintetizando, para além da
conjuntura próxima importa considerar o que é estrutural e imprescindível em
nome do futuro, a qualidade da educação e uma educação de qualidade para todos.
Este anúncio de mais um plano de
recuperação, fez-me recordar de novo de Almada Negreiros na “Invenção do Dia
Claro” “Quando eu nasci, as frases que hão-de salvar a humanidade já estavam
todas escritas, só faltava uma coisa - salvar a humanidade”. Considerando uma visão
mais alentejana, lembro-me da famosa “reclamação”, “Construam-me porra!”
escrita no pontão de apoio às obras protestando com o tempo de espera pela
Barragem do Alqueva.
Estão à espera de quê?
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