De acordo com o Público, no âmbito do trabalho da Comissão de Revisão Constitucional, PS e PSD terão aceitado o princípio de definir a educação pré-escolar no sistema de ensino “universal, obrigatório e gratuito”.
A introdução da frequência obrigatória
da educação pré-escolar é habitualmente associada objectivo de combate às
desigualdades que afectam as crianças e dificultam o seu trajecto de
desenvolvimento e educação de forma bem-sucedida.
Embora compreenda a necessidade e
a importância da educação no combate às desigualdades, nenhuma dúvida sobre
isso, a obrigatoriedade da frequência a partir dos três anos merece alguma
reflexão. Algumas notas considerando o pressuposto de que garantir o acesso
universal à educação pré-escolar não é o mesmo que tornar a escolaridade
obrigatória a partir dos 3 anos.
Em 2020 foi divulgado um
relatório da rede Eurydice, “Key Data on Early Childhood Education and Care in
Europe 2019” com alguns dados interessantes.
A garantia do acesso à educação
pré-escolar em Portugal é aos 3 anos, uma posição intermédia no contexto
europeu. No entanto, a escolaridade obrigatória inicia-se aos seis anos tal como
na maioria dos países europeus.
É recorrente também a divulgação
de informação referindo a existência de muitas crianças em lista de espera de
creches e jardins-de-infância no chamado sector social em que as mensalidades
são indexadas aos rendimentos familiares. Esta situação afecta sobretudo zonas
mais urbanas e a alternativa da resposta privada é inacessível para muitas famílias.
Também é reconhecido por múltiplas análises o impacto positivo do acesso de
respostas educativas de qualidade em creche e jardim-de-infância.
Aliás, recordo que a partir de
2019 em França a escolaridade obrigatória em França começou a iniciar-se aos 3
anos. Na altura, em França estimava-se que 97% das crianças de 3 anos
frequentem a “escola maternal” sendo que a maioria das que não frequentam vivem
em agregados familiares com menores recursos económicos. É justamente esta
situação que a medida de obrigatoriedade visa combater alicerçando os percursos
educativos numa base de maior equidade.
Sabe-se que o processo tem
decorrido com algumas dificuldades dada a inexistência de respostas suficientes
para a procura designadamente em áreas geográficas de demografia mais densa.
Como tenho afirmado, não tenho
certezas sobre a obrigatoriedade da frequência, mas tenho a maior convicção no
sentido de que garantir a universalidade do acesso à educação pré-escolar aos
três anos e criar respostas de qualidade, acessíveis, logística e economicamente,
às famílias para as crianças dos zero aos três anos é imprescindível e urgente.
Acentuo também a ideia de que este período, até aos três anos, deveria também
estar sob tutela do Ministério da Educação e não da Segurança Social pois o
acolhimento das crianças deve estar abrangido por um forte princípio de
intencionalidade educativa e integrada nas políticas públicas de educação.
Sabemos todos como o
desenvolvimento e crescimento equilibrado e positivo dos miúdos é fortemente
influenciado pela qualidade das experiências educativas nos primeiros anos de
vida, de pequenino é que ...
Assim, existem áreas na vida das
pessoas que exigem uma resposta e uma atenção que sendo insuficiente ou não
existindo, se tornam uma ameaça muito séria ao futuro, a educação de qualidade
para os mais pequenos é uma delas.
No entanto e mais uma vez, a
educação pré-escolar é bastante mais que a “preparação” para a escola, não deve
ser entendida como uma etapa na qual os meninos se preparam para entrar na
escola embora se saiba do impacto positivo que pode assumir no seu trajecto escolar.
Na verdade, as crianças estão a
preparar-se para o que será a sua vida, para crescer, para ser. A educação
pré-escolar num tempo em que as crianças estão menos tempo com as famílias tem
um papel fundamental no seu desenvolvimento global, em todas as áreas do seu
funcionamento e na aquisição de competências e promoção de capacidades que tem
um valor por si só e não entendido como uma etapa preparatória para uma parte
da vida futura dos miúdos, a vida escola.
Este período, a educação
pré-escolar, educação de infância numa formulação mais alargada, cumprido com
qualidade e acessível a todas as crianças, será, de facto, um excelente começo
da formação institucional das pessoas, dos cidadãos.
Esta formação é global e
essencial para tudo o que virão a ser, a saber e a fazer no resto da sua vida.
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