Ao estarmos em período de férias é recorrente nos últimos anos, talvez sinais dos tempos, a questão da realização de tarefas de natureza escolar em tempo de férias surgir na imprensa. Dito de outra forma, estamos a falar de TPC para férias. Ontem a Sábado pediu-me uma pequena colaboração para uma peça sobre esta matéria.
Desde há muito que entendo que a
sua utilização durante os períodos de férias deveria ser repensada e tenho-o
expressado em espaços profissionais, no contacto com pais e em colaborações na
imprensa.
No caso dos alunos dos primeiros anos
de escolaridade, o trabalho realizado na escola deveria dispensar o TPC
incluindo no período de férias. É uma questão de saúde e qualidade de vida se
considerarmos a quantidade de tempo que a Escola a Tempo Inteiro permite estar nas escolas durante o período escolar.
Em muitas famílias e como se
afirma em múltiplos trabalhos os TPC clássicos têm ainda o problema de colocar
com frequência os pais em situações embaraçosas, querem ajudar os filhos, mas
não possuem habilitações conhecimento sobre actual escola e os seus programas
para tal. Recordo um trabalho de 2014 da OCDE, “Does homework perpetuate
inequities in education?" em que entre outros dados interessantes se
referia que os alunos com famílias de meios sociais e económicos mais
favorecidos gastam mais 2 horas em trabalhos de casa que os seus colegas com
famílias de estatuto mais baixo o que, sublinhava a OCDE, poderá alimentar a
falta de equidade.
O recurso ao TPC deveria avaliar
se o aluno, cada aluno, tem capacidade e competência para o realizar
autonomamente, por exemplo, para exercício de competências adquiridas. Na
verdade, porque milagre ou mistério, uma criança que tem dificuldade em realizar
os seus trabalhos na sala de aula, onde poderá ter apoio de professores e
colegas, será capaz de os realizar em casa de forma autónoma? Naturalmente, tal só
acontecerá com a ajuda dos pais ou, eventualmente, de "explicadores"
a que muitas famílias, sabemos quais, não conseguem aceder.
Por outro lado, voltando às
férias, estas devem ser isso mesmo, férias, férias sem as mesmas rotinas e os
mesmo trabalhos do tempo escolar.
Actividades como leitura, jogos de diferente natureza que solicitem e envolvam competências e capacidades diversas, brincar e interagir actividades de exterior, por exemplo, não são um TPC, um dever a cumprir, é algo que se deve incentivar e promotor de bem-estar e desenvolvimento. A leitura é só um exemplo e particularmente relevante.
Importa sublinhar a importância das actividades no exterior e o aproveitamento da curta janela de bom tempo que o nosso clima tem uma vez que, como sabemos, temos Invernos prolongados e rigorosos.
Neste sentido e mantendo a referência "trabalho", creio que deve distinguir-se com clareza o Trabalho Para Casa e o Trabalho Em Casa. O TPC é trabalho da escola feito em casa, o trabalho em casa será o que as crianças podem fazer em casa que, não sendo tarefas de natureza escolar, pode ser um bom contributo para as aprendizagens e desenvolvimento dos miúdos. O que pode acontecer é termos mais Trabalhos Para Casa e não Trabalho Em Casa.
Torna-se, pois, necessário que
professores e escolas se entendam sobre esta matéria, diferenciando trabalho de
casa, igual ao da escola, de trabalho em casa, trabalho em que qualquer pai ou
os irmãos e amigos podem, devem, envolver-se e também é útil ao trabalho que se
realiza na escola.
No entanto, do meu ponto de
vista, sobretudo nas idades mais baixas, o bom trabalho na escola deveria
dispensar o TPC. Como já disse, ler um texto do manual e preencher uma ficha é
uma actividade escolar, ler um livro, brincar livre e activamente, o
envolvimento em jogos que solicitem leitura ou operações matemáticas podem ser
actividades compatíveis e interessantes em situação de férias tanto quanto em
tempos escolares. Talvez também seja uma forma de manter os mais novos mais afastados dos ecrãs.
A propósito desta matéria
deixem-me recordar uma história real. Ouvi uma mãe que estava muito aborrecida
com o Atelier de Tempos Livres em que o filho, gaiato de uns 10 anos, passa boa
parte das férias, porque os técnicos responsáveis “dão poucas actividades às
crianças e depois elas põem-se a brincar umas com as outras”. Esta mãe, com uma
formação superior, não será a única que assim pensa.
Boas férias para todos, alunos
pais, técnicos e professores.
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