Em resposta às inúmeras e diversas queixas de pessoas com deficiência à Provedoria de Justiça relativas ao acesso a produtos e apoios providenciados através do Sistema de Atribuição de Produtos de Apoio (SAPA), foi realizado um estudo agora divulgado que evidencia justamente os obstáculos e constrangimentos que têm motivado e mantido as queixas.
Seria suposto que fosse “um
sistema de atribuição gratuita e universal”, mas em termos reais as dificuldades
e demoras são recorrentes.
Acresce que, lê-se no estudo realizado e citado pelo Público, “Estas dificuldades reflectem-se no número
reduzido de beneficiários, muito inferior ao universo de pessoas com
deficiência ou incapacidade”. Com base nos dados do Eurostat e do Instituto
Nacional para a Reabilitação, relativos a 2023, em Portugal, 33,4% das pessoas
com 16 ou mais anos de idade têm pelo menos uma incapacidade. No entanto, “não
chegou a 23.000 o número de pessoas apoiadas através do SAPA”. ´
É recomendada a revisão profunda deste Sistema de Atribuição de Produtos de Apoio.
Não é surpresa. Na verdade, a
vida de muitas pessoas com deficiência é uma constante e infindável prova de
obstáculos, muitas vezes intransponíveis, que ampliam de forma inaceitável a
limitação na mobilidade que a sua condição, só por si, pode implicar. No
entanto, muitos dos obstáculos não têm a ver com barreiras físicas, remetem
para a falta de senso, incompetência ou negligência com que gente
responsável(?) lida com estas questões.
Muitos destes obstáculos estão
associados ao que as comunidades e as suas lideranças, políticas por exemplo,
entendem ser os direitos, o bem comum e o bem-estar das pessoas, de todas as
pessoas.
Também para as crianças com
necessidades especiais e respectivas famílias a vida é muito complicada face à
qualidade e acessibilidade aos apoios educativos e especializados necessários
apesar do empenho e profissionalismo da maioria dos profissionais que trabalham
nestas áreas.
Como é evidente, existem muitas
outras áreas de dificuldades colocadas às pessoas com deficiência,
designadamente apoios sociais, qualificação profissional e emprego, em que a
vulnerabilidade e os riscos de exclusão e pobreza são elevados traduzido em taxas
de desemprego entre pessoas com deficiência muitíssimo superiores à verificada
com a população sem deficiência.
Uma referência, mais uma vez, ao
que deve ser um princípio não negociável, a inclusão em todos os domínios da
vida das comunidades.
É verdade que a questão da
inclusão, em particular da inclusão em educação, é presença regular nos
discursos actuais. É objecto de todas as apreciações, ilumina todas as
perspectivas e acomoda todas as práticas, incluindo a “entregação” que
manifestamente não promove inclusão, antes pelo contrário. Apesar do bom
trabalho que existe e deve ser sublinhado, por vezes, demasiadas vezes,
confunde-se colocação educativa, crianças com necessidades especiais na sala de
aula regular, com inclusão. Aliás, até a exclusão de muitos alunos da sala de
aula e das actividades comuns é frequentemente realizada … em nome da inclusão.
E não acontece nada.
A inclusão assenta em cinco
dimensões fundamentais, Ser (pessoa com direitos), Estar (na comunidade a que
se pertence da mesma forma que estão todas as outras pessoas), Participar
(envolver-se activamente da forma possível nas actividades comuns), Aprender
(tendo sempre por referência os currículos gerais) e Pertencer (sentir-se e ser
reconhecido como membro da comunidade). A estas cinco dimensões acrescem dois
princípios inalienáveis, autodeterminação e autonomia e independência.
As pessoas com deficiência não
precisam de tolerância, não precisam de privilégios, não precisam de caridade,
precisam só de ver os seus direitos considerados. Os direitos não são de
geometria variável cumprindo-se apenas quando é possível.
Este é o caderno de encargos que
nos convoca a todos.
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