Ainda umas notas a propósito dos dados divulgados pelo Observatório da Saúde Psicológica e do Bem-Estar, da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência relativo a 2024, coordenado pela Professora Margarida Gaspar de Matos, que envolveu 6112 alunos, do pré-escolar ao secundário.
Um aspecto preocupante e
associado aos estilos de vida actuais é os hábitos de sono, dos mais novos, mas
não só.
Perto de metade dos alunos metade
dos alunos dormem menos de oito horas por dia durante a semana ainda que ao
fim-de-semana 76,9% afirme dormir oito ou mais. Sabemos que as crianças e
jovens necessitam de entre oito e nove horas de sono de qualidade e dormir mais
ao fim-de-semana não compensa. Como afirma Margarida Gaspar de Matos, “Quando
há uma diferença de mais de três horas entre as horas de sono à semana e ao
fim-de-semana, consideramos que a criança ou o adulto está em privação de sono.
E está muito ligado ao insucesso escolar, ao desinteresse pela escola, ao
consumo de substâncias, à violência, às dores de cabeça.”
Também é reconhecido que onúmero
de horas de sono está fortemente associado ao tempo de ecrã que constitui um
outro problema com impacto para além da privação de sono. O meu neto, com onze
anos, fala-me de colegas que passam algum tempo durante a noite a jogar no
telemóvel, certamente sem controlo parental.
Umas notas mais centradas na
questão do sono, um problema sério associado ao bem-estar dos mais novos, que
já tenho abordado e muitas vezes objecto de conversas com grupos de pais.
Em 2021 foi publicado na
"Sleep Medicine" o estudo, “Home vs. bedroom media devices:
socioeconomic disparities and association with childhood screen-and
sleep-time”, realizado Centro de Investigação em Antropologia e Saúde da U. de
Coimbra.
A investigação envolveu 8.430
crianças, entre os 3 e os 10 anos de escolas públicas e privadas e evidenciou,
em linha com o que já se conhece, que a presença de dispositivos electrónicos
no quarto das crianças ou a sua utilização diária prolongada provocam uma
diminuição significativa no tempo de sono das crianças.
Um dado relevante é que, apesar
de serem as famílias com mais elevado estatuto socioeconómico as que detêm mais
recursos digitais é nas famílias menos favorecidas que predomina o seu uso no
quarto. Uma hipótese explicativa, segundo os autores, remeterá para uma menor
literacia digital destas famílias e menor conhecimento dos riscos associados à
utilização excessiva.
A qualidade e higiene do sono
são, de facto, matérias de grande importância no bem-estar e qualidade de vida
das pessoas e em todas as idades. No entanto nem sempre têm a atenção devida,
sobretudo no que respeita aos mais novos.
Recordo um estudo, já de 2016,
realizado pela Universidade do Minho que sugere que cerca de 72% de mais de
quinhentas crianças e adolescentes inquiridos, dos 9 aos 17, dormem menos do
que seria recomendável para as suas idades. Aliás, estudos liderados pela
Professora Teresa Paiva, uma conhecida especialista nesta área, vão no mesmo
sentido tal como os dados agora conhecidos do Obervatório
E, de uma forma geral, para além
das questões ligadas aos estilos de vida e às rotinas, uma das causas apontadas
é a presença de aparelhos como computadores, tablets ou smartphones no quarto
que continua a acentuar-se.
Em 2013, um trabalho da
University College of London mostrava o impacto negativo que a ausência de
rotinas como deitar à mesma hora podem ter no bem-estar e saúde das crianças
afectando, por exemplo, o processamento da aprendizagem.
Esta questão, os padrões e hábitos de sono das crianças e dos adolescentes, é algo de importante que nem sempre parece devidamente considerada como se constata nos discursos e práticas de muitos pais e encarregados de educação.
A falta de qualidade do sono e do
tempo necessário acaba, naturalmente, por comprometer a qualidade de vida das
crianças e adolescentes, incluindo o rendimento e comportamento escolar. Todos
nos cruzamos frequentemente nos Centros Comerciais, por exemplo, com crianças,
mais pequenas ou maiores, a horas a que deveriam estar na cama e que, penosa,
mas excitadamente, deambulam atreladas aos pais.
Alguma evidência sugere que parte
das alterações verificadas nos padrões e hábito relativos ao sono remete para
questões ligadas a stresse familiar e sublinha o aumento das queixas relativas
a sonolência e alterações comportamentais durante o dia.
As situações de stresse familiar
serão importantes, mas parece-me necessário não esquecer alguns aspectos
relacionados com os estilos de vida, com as rotinas ou com a utilização nem
sempre regulada das novas tecnologias. Muitos trabalhos mostram também que boa
parte das crianças e adolescentes que acedem a computador ou smartphone o fazem
no quarto.
Assim, acontece que durante o
período que seria dedicado ao sono, sem regulação familiar muitas crianças e
adolescentes continuam diante de um ecrã. Como é óbvio, este comportamento não
pode deixar de implicar consequências nos comportamentos durante o dia,
sonolência e distracção, ansiedade e, naturalmente, o risco de falta de
rendimento escolar num quadro geral de pior qualidade de vida.
Creio que, com alguma frequência,
alguns comportamentos e dificuldades escolares dos miúdos, sobretudo nos mais
novos que por vezes, sublinho por vezes, são de uma forma aligeirada remetidos
para problemas como hiperactividade ou défice de atenção, podem estar
associados aos seus estilos de vida ou aos modelos educativos, universo onde se
incluem os hábitos e padrões de sono como, aliás, alguns estudos e a
experiência de muitos profissionais parecem sugerir.
Considerando as implicações
sérias na vida diária importa que se reflicta sobre a atenção e ajuda destinada
aos pais para estas questões e que apesar a utilização imprescindível e útil
destes dispositivos seja regulada e protectora da qualidade de vida das
crianças e adolescentes.
A experiência diz-me que muitos
pais desejam e mostram necessidade de alguma ajuda ou orientação nestas
matérias.
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