Na sequência da divulgação do Relatório Anual de Segurança Interna e dos dados referentes aos comportamentos delinquentes em contexto escolar que aqui ontem reflecti, Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas chama atenção paras as dificuldades sentidas pelas escolas relativamente ao bem-estar, saúde mental e comportamento dos mais novos. Algumas notas.
O bem-estar e comportamento dos
alunos não pode ser dissociado das variáveis de contexto e dos estilos de vida
das nossas comunidades.
A partir da situação de
confinamento em contextos familiares em que nem sempre os factores de protecção
equilibravam os factores de risco, acentuaram-se mudanças no seu bem-estar e
comportamentos e a emergência de quadros de risco que agora viajam na
"mochila" que os alunos carregam para a escola.
Deste quadro resulta a
necessidade e urgência de atenção à saúde mental de crianças e jovens ainda que
habitualmente a saúde mental seja um parente pobre das políticas públicas de
saúde.
Assim, é fundamental que as
comunidades educativas tenham os recursos ou dispositivos de acesso a esses
recursos que acomodem as situações de vulnerabilidade psicológica, mal-estar e
comportamentos inadequados. As crianças e adolescentes com necessidades
específicas estarão muito provavelmente em situação de risco acrescido.
Crianças e adolescentes são mais
resistentes do que por vezes parecem, felizmente. No entanto, importa um
ambiente sereno que tranquilize e apoie alunos, professores, pais e técnicos.
É preciso sublinhar que os
professores e todos os que estão nas escolas precisam dessa tranquilidade,
valorização e reconhecimento para que possam ter mais bem-estar e melhor
ensinem, apoiem e aprendam.
Será bom não esquecer que, para
além dos recursos, existem circunstâncias de risco para os quais se exigem
políticas públicas adequadas.
Contextos familiares vulneráveis
são, por exemplo, uma ameaça ao bem-estar, saúde mental e comportamento adequado
de crianças e adolescentes. No que respeita aos professores, as condições de
carreira e avaliação, a instabilidade nos trajectos profissionais, a
desvalorização sentida, a asfixia da carga burocrática, o clima de escola em algumas
situações, são, entre outras razões, um forte contributo para um mal-estar que
afecta muitos docentes.
Por todo este cenário é crítico
que a recuperação e promoção de aprendizagem esteja associada a uma forte
preocupação com o bem-estar de alunos e professores com os apoios e recursos
necessários.
Importa ainda que recursos e
medidas a desenvolver integrem as escolas no âmbito da sua autonomia e não
“apareçam” traduzidos numa imensidade de projectos e iniciativas vindas “de
fora” como, lamentavelmente, é frequente.
Como cantava o Zeca Afonso, “seja
bem-vindo, quem vier por bem”, e como é evidente, registo todas as iniciativas,
projectos, experiências de inovação, etc., que possam contribuir para minimizar
ou erradicar problemas, mas já me falta convicção no impacto do modelo mais
habitualmente seguido.
Com demasiada frequência muitos
destes projectos vêm de fora das escolas, as origens são variadas, não chegam a
envolver a gente das escolas, esmagada pelo trabalho, burocracia e outros
constrangimentos como, por exemplo, assegurar da melhor forma possível o
dia-a-dia do trabalho educativo que tem de ser realizado.
Também com demasiada frequência
muitos destes projectos morrem de “morta matada” ou de “morte morrida”, não são
avaliados de forma robusta e dão umas fotografias ou vídeos que compõem o
portfólio dos organizadores e proporcionam uma experiência que se deseja
positiva aos intervenientes no tempo que durou, mas sem mais impacto.
Todavia, preciso de afirmar que
muitos destes Planos, Projectos, Inovações, etc. dão origem a trabalhos
notáveis que, também com frequência, não têm a divulgação e reconhecimento que
todos os envolvidos mereceriam.
Também demasiadas vezes estas
iniciativas consomem recursos com baixo retorno e ao serviço de múltiplas
agendas.
Tenho para mim, que não podendo a
escola responder a todas as questões que afectam quem nelas passa o dia
poderia, ainda assim, fazer mais se os investimentos feitos no mundo à volta da
escola e que lhe vem bater à porta com propostas fossem canalizados para as
escolas.
Com real autonomia, com mais
recursos e com modelos organizativos mais adequados e processos menos
burocratizados, as escolas poderiam fazer certamente mais e melhor que quem vem
de fora numa passagem transitória, mais ou menos longa, mas transitória. Sim,
tudo isto deveria ser objecto de escrutínio, regulação e avaliação também
externa, naturalmente.
Escolas com mais auxiliares,
auxiliares informados e formados podem ter um papel importante em diferentes
domínios.
Directores de turma com mais
tempo para os alunos e menos burocracia poderiam desenvolver trabalho útil em
múltiplos aspectos do comportamento e da aprendizagem.
Psicólogos e outros técnicos em
número mais adequado, o que se verifica poderiam acompanhar, promover e
desenvolver múltiplas acções de apoio a alunos, professores, técnicos e pais.
Mediadores que promovessem
iniciativas no âmbito da relação entre escola, pais e comunidade seriam, a
experiência mostra-o, um investimento com retorno.
São apenas alguns exemplos de
respostas com resultados potenciais com um custo que talvez não seja superior
aos custos de tantos Projectos, Planos, Programas ou Iniciativas Inovadoras
destinadas a múltiplas matérias e com custos associados de “produção” que já me
têm embaraçado, mas a verdade é que as agendas e o marketing têm custos.
Está em jogo o desenvolvimento
escolar e pessoal de crianças, adolescentes e jovens, ou seja, do futuro.
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