No Expresso encontra-se um trabalho interessante sobre as mudanças que aparentemente se estão a verificar nos modelos de educação parental dos pais mais novos.
Afirma-se que, “Palmada educativa' é coisa do passado:
respeito, carinho, autonomia e liberdade são pilares para os novos pais”.
Os que mais acompanham este espaço sabem que muitas vezes
aqui abordo esta questão, a educação familiar, e a forma como os pais questionam,
agem e pensam esta matéria o que também acontece em trabalho com grupos de pais.
As mudanças que, felizmente, se vão verificando nas práticas
familiares levam a que, por vezes se refira a ideia, também enunciada no
trabalho do Expresso sobre a ideia dos “mimos a mais”.
De facto, é que com demasiada frequência se afirma que
eventuais comportamentos inadequados de crianças e adolescentes se devem a
“mimos a mais”. Como também já referi em colaborações com a imprensa,
designadamente num texto para a Visão, tal entendimento “tira-me do sério”, não
existem "mimos a mais". Ponto.
Tal justificação costuma servir depois para se afirmar a
ideia de que as crianças hoje em dia têm muitos mimos que as “estragam”, dito
de outra maneira, têm “afecto” a mais ou ainda “gosta-se de mais” das crianças.
Estes discursos, que alguns profissionais destas áreas também subscrevem,
merecem-me alguma reserva pois assentam, do meu ponto de vista, num equívoco.
De uma forma geral, as crianças não terão afecto, mimos, a
mais, poderão, isso sim, ser objecto de “mau afecto” ou se quiserem, de
"maus mimos". É essa falta de qualidade que lhes poderá ser
prejudicial. Não é mau por ser muito, é mau porque asfixia, é tóxico, não deixa
que os miúdos cresçam, distorce a percepção da criança de si própria e do seu
funcionamento, não permite o estabelecimento de uma relação saudável,
protectora e promotora da autonomia das crianças, uma condição fundamental para
o seu desenvolvimento positivo. No entanto, não é este tipo de reflexão que
leva muitos de nós a falar dos “mimos a mais”.
Insisto, as crianças não têm elogios ou mimos a mais. O que
se passa mais frequentemente é que recebem “nãos” de menos. Na verdade, muitos
adultos, pais, sendo quase sempre capazes de dar os mimos, mostram-se muitas
vezes incapazes de dar os “nãos”, de estabelecer os limites e as regras que,
como sempre digo, são tão necessárias às crianças como respirar e alimentar-se.
Estes “nãos” e para utilizar a mesma terminologia, são outros mimos
imprescindíveis na educação de crianças e adolescentes nos seus diferentes
contextos de vida.
As regras e os limites são bens de primeira necessidade. Tal
como com os afectos, nenhuma dieta educativa pode prescindir de regras e
limites.
Ficando sem “nãos” muitas crianças, a coberto da ideia dos
“mimos a mais”, transformam-se em pequenos ditadores que infernizam a vida de
toda a gente, a começar pela sua própria vida. Não crescem saudavelmente.
Neste contexto, apoiar e ajudar os pais a desenvolverem de
forma confiante comportamentos de disponibilidade e escuta de crianças e
adolescentes, a assumirem com firmeza e sem culpa a necessidade de definir
regras e limites, de mostrar afecto sem que se sintam a dar “mimos” a mais que
“estragam” os filhos, só pode resultar em bom trabalho, para os pais e para os
filhos.
De pequenino é que se constrói … o destino.
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