Está em consulta pública até 16 de Fevereiro o “Referencial para a Intervenção dos Psicólogos em Contexto Escolar”.
Citando, “O Referencial
assume-se como o documento de enquadramento técnico normativo dos psicólogos em
contexto escolar. Tem como objetivo contribuir para a consolidação da prática
destes técnicos, definindo de forma mais clara os perfis profissionais, os
procedimentos e os instrumentos a privilegiar, focando a sua intervenção nos
domínios que melhor respondem às necessidades atuais do sistema educativo, com
base em modelos de intervenção testados e validados cientificamente.
Pretende-se clarificar, junto
dos órgãos de gestão, docentes, encarregados de educação e outros técnicos
especializados, a atuação dos psicólogos no contexto escolar. Este documento
servirá de apoio na tomada de decisão e na definição de estratégias pedagógicas
e psicológicas, para que todos os alunos alcancem as competências previstas no
Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória e se desenvolvam de forma
integral nas suas diferentes dimensões: cognitiva, comportamental, social e
emocional e vocacional, com vista ao seu bem-estar e saúde física e mental,
desenvolvimento pessoal e profissional.”
No entanto, para além da actualização das orientações para quadro de intervenção dos
psicólogos em contextos escolares, é necessário que … existam psicólogos que
efectivamente integrem as equipas de escolas e agrupamentos. Como é óbvio
existem, mas o seu efectivo ainda está longe de corresponder às necessidades.
Para os profissionais parece
claro que num quadro de orientações estabelecidas, do estado da arte em matéria
de psicologia da educação e de contextos de intervenção carregados de
constrangimentos, o empenhamento e a competência dos profissionais pode dar um
contributo sólido para a qualidade dos processos educativos de todos os alunos.
Para além do trabalho com alunos é crítica a colaboração e intervenção com
professores, funcionários, direcções e pais e encarregados de educação, para
além de outras respostas na comunidade dirigidas à população em idade escolar.
No entanto, desde 1991, a
presença dos psicólogos em contextos educativos tem vivido entre as declarações
dos vários actores, incluindo a tutela, sobre a sua necessidade e importância e
a lentidão, insuficiência e precariedade no sentido da sua concretização.
Recordo que no V Seminário de
Psicologia e Orientação em Contexto Escolar em 2017 o Secretário de Estado da
Educação, João Costa, reafirmou a “indispensabilidade de ter psicólogos nas
escolas" sublinhando o seu contributo essencial para o sucesso académico e
bem-estar dos alunos.
É de facto recorrente a afirmação
por parte do ME da prioridade em promover o alargamento do número de técnicos e
a estabilidade da sua presença nas comunidades educativas. Não é um discurso
novo, é apenas algo que tarda em concretizar-se e insisto em notas já por aqui
escritas e marcadas pelo óbvio envolvimento pessoal, tenho formação em
psicologia da educação.
No entanto, o número de
psicólogos a desempenhar funções no sistema educativo público está ainda longe
do rácio aconselhado para um trabalho mais eficiente.
Existem situações, no encontro
estavam vários colegas, em que existe um psicólogo para um agrupamento com
várias escolas e que envolve um universo com mais de 2000 alunos e a deslocação
permanente entre várias escolas numa espécie de psicologia em trânsito. Não é
uma resposta, é um fingimento de resposta que não serve adequadamente os
destinatários como também, evidentemente, compromete os próprios profissionais.
Temos também inúmeras escolas
onde os psicólogos não passam ou têm “meio psicólogo” ou menos e ainda a
prestação de apoios especializados de psicologia em “outsourcing” e com a
duração de meia hora semanal uma situação inaceitável e que é um atentado científico
e profissional e, naturalmente, condenado ao fracasso de que o técnico
independentemente do seu esforço e competência será responsabilizado. No
entanto, dir-se-á sempre que existe apoio de um técnico de psicologia.
O quadro orientador da
intervenção dos psicólogos nos contextos escolares que resultar será um
documento positivo, mas corre o risco ser inaplicável em muitas situações face
ao alargado espectro de funções e actividades previstas associado ao universo
de destinatários.
Neste cenário, a intervenção dos
profissionais, apesar do esforço e competência, tem um potencial de impacto
aquém do desejável e necessário. Áreas de intervenção como dificuldades ou
problemas nas aprendizagens, questões ligadas aos comportamentos nas suas
múltiplas variantes, alunos com necessidades especiais, trabalho com
professores e pais, trabalho ao nível da prevenção de problemas, etc., exigem
recursos e tempo que não estão habitualmente disponíveis.
Acresce que o recurso ao modelo
de “outsourcing” ou a descontinuidade do trabalho é um erro em absoluto, é
ineficaz, independentemente do esforço e competência dos profissionais
envolvidos.
Como é que se pode esperar que
alguém de fora da escola, fora da equipa, técnica e docente, fora dos circuitos
e processos de envolvimento, planeamento e intervenção desenvolva um trabalho
consistente, integrado e bem-sucedido com os alunos e demais elementos da
escola?
Das duas uma, ou se entende que
os psicólogos sobretudo, mas não só, os que possuem formação na área da
psicologia da educação podem ser úteis nas escolas como suporte a dificuldades
de alunos, professores e pais em diversos áreas, não substituindo ninguém, mas
providenciando contributos específicos para os processos educativos e,
portanto, devem fazer parte das equipas das escolas, base evidentemente
necessária ao sucesso da sua intervenção, ou então, é uma outra visão, os
psicólogos não servem para coisa alguma, só atrapalham e, portanto, não são
necessários.
A situação existente parece-me,
no mínimo, um enorme equívoco que além de correr sérios riscos de eficácia e
ser um, mais um, desperdício (apesar do empenho e competência que os técnicos
possam emprestar à sua intervenção), tem ainda o efeito colateral de alimentar
uma percepção errada do trabalho dos psicólogos nas escolas.
Estando no fim da carreira
profissional ainda aguardo que a importância e prioridade sempre atribuídas ao
trabalho dos psicólogos em contextos educativos se concretizem de forma
suficiente e estável.
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