quarta-feira, 14 de março de 2007

TENHA PACIÊNCIA

Hoje, a propósito de uma conversa sobre indicadores de exclusão e pobreza, lembrei-me de alguns episódios da minha infância que ainda agora me causam alguma perplexidade. Na zona onde na altura habitava, era relativamente frequente aparecerem pessoas a bater à porta para, numa humilhante circunstância, pedir esmola, o mais degradante dos pedidos. Nessa altura, sem a actual paranóia securitária, ainda eram as crianças que acudiam a ver quem era. Eu assim fazia. E depois de verificar que era “um pobrezinho” (o tal tranquilizante diminutivo a que já me referi noutro texto) avisava a minha mãe. Sem eu nunca conseguir entender com critérios, ela decidia dar ou não dar esmola, em dinheiro ou géneros. Mas a minha grande perplexidade, que se mantém até hoje, tem a ver com o facto de que, quando decidia não ser caridosa, a minha mãe mandava-me de volta para dizer ao pobrezinho “tenha paciência”. Devo dizer que ainda hoje esta memória me deixa embaraçado. Então o homem, ou mulher, não tem que comer, não tem trabalho, não leva ajuda ou apoio e ainda tem que ter paciência. É extraordinário como até como caridade se oferecia conformismo. E o que hoje me fez lembrar esta história foi exactamente isso, O CONFORMISMO QUE POR AÍ ANDA MASCARADO DE PACIÊNCIA.

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