terça-feira, 20 de março de 2007

RENDIMENTO SOCIAL DE INSERÇÃO. INSERÇÃO?!

Há uns anos atrás, numa das minhas primeiras idas a Moçambique, realizada pouco tempo depois de assinados os acordos de Roma que puseram fim à guerra civil, tive oportunidade de estar duas semanas a trabalhar em Inhambane, terra da boa gente. Durante esse tempo e realizando habitualmente o mesmo trajecto, cruzava-me com pessoas que, acocoradas e encostadas a uma parede, me davam a sensação de aí permanecerem todo o tempo, todas as horas, evidenciando uma expressão ausente, dormente e triste como que expressando o nada que lhes acontecia, o nada que lhes iria acontecer e o tudo que lhes tinha acontecido. Numa noite de conversa com o velho Carlos Bata, um velho de vida comprida e cheia, ele explicava que a atitude visível nessas pessoas se devia a que a vida os tornou tão pobres, que acham que nem um sonho podem comprar. Esta memória também me aproxima dos homens do largo das aldeias alentejanas, de que fala Vitorino, que, com um banco baixinho, vão atrás do sol no inverno e atrás da sombra no verão e já não esperam nada nem dão danos a ninguém.
Tudo isto me lembrou porque, de acordo com o Instituto de Informática e Estatística da Segurança Social, em Janeiro de 2007 existem 107 207 famílias que recebem o Rendimento Social de Inserção correspondendo a mais de 260 000 pessoas, das quais cerca de 120 000 são menores e idosos. Deste universo, apenas 48,7% das famílias têm acordos de inserção assinados e em 2006 apenas 16,3% das acções de inserção passaram pelo emprego (Público de 18/03/07). Será que muitas das pessoas envolvidas nesta teia de exclusão alguma vez terão acesso a uma conta-poupança que lhes permita comprar um sonho? Inserção?!
(Foto de Gonçalo Romeiras)

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