sábado, 9 de março de 2013

DEIXEM-ME INFLUENCIAR

O Presidente da República, na busca de um segundo mandato tranquilo e sem ondas, acentuou a sua semi-clandestinidade num período em que seria fundamental ter uma presença próxima e envolvida com os portugueses.
No tom de quem nunca tem dúvidas e raramente se engana, típico de uma arrogância que procura mascarar com referências recorrentes às suas humildes origens e o horror a essa coisa da política, terreno pouco recomendável, de que afirma não fazer parte, quando é justamente o político em exercício com mais tempo de poder político, gere milimetricamente a sua intervenção e actividade pública. No seu tom professoral propõe-se dar-nos lições de como se deve comportar um Presidente em tempos de crise.
A nós, alunos bem comportados e também sem dúvidas, resta-nos retirar apontamentos com diligência e reconhecer os dotes do Presidente.
Como seria de esperar de quem não quer problemas e apenas um tempo final de mandato sem sobressaltos e uma sofrível reforma em seguida, as intervenções do Professor Cavaco Silva são razoavelmente inócuas para que, quer as oposições, quer o governo, concordem com o tom geral das diferentes e cada vez mais raras intervenções.
Aproveitando a publicação do Volume VII dos Roteiros, Cavaco Silva volta a tentar demonstrar como exerce a sua “magistratura de influência”, um dos mais estimulantes enunciados políticos dos últimos anos. Na verdade, magistratura de influência parece ser o guarda-chuva de uma atitude distanciada e pouco envolvida com os problemas graves das pessoas apesar das palavras de circunstância, que de retórica não passam pois são inconsequentes. A referência ao "cansaço" dos portugueses face à austeridade é um bom exemplo. Cansaço?! A pobreza não "cansa", agride a dignidade e as condições de vida.
O Presidente procura demonstrar, o que do meu ponto de vista, não deveria fazer pois fragiliza justamente a mensagem que quer fazer passar, de que trabalha imenso nos bastidores e que é assim que as coisas se fazem, Professor sabe, obviamente. Mais do que acreditar, o cidadão comum precisa de “sentir” que existe um Presidente está atento, aos problemas dos portugueses e “sentir” que tem um Presidente que analisa as políticas em função do impacto nas pessoas e não em função de  outros interesses.
No quadro da nossa organização política e quando se atravessam tempos de tanta dificuldade para tanta gente, seria de esperar uma maior proximidade do Presidente da República, a expressão da preocupação e solidariedade para com as condições de vida de muitos milhares de pessoas e não um silêncio quebrado, incompreensivelmente, no Facebook e a cobertura óbvia a políticas que reconhecidamente carecem de ajustamentos para que não se mate o doente com uma suposta e milagrosa cura.
Apesar de tudo e estranhamente, não emitiu um “Deixem-me influenciar”.

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