quinta-feira, 4 de outubro de 2012

A FACE OCULTA

À medida que desfila aos nossos olhos o país político, o país social, o país económico, não consigo descrever com exactidão que sentimento me passa pela cabeça, vergonha, tristeza, revolta, indignação, indiferença resignada, etc. Provavelmente um pouco de tudo isto. Já não nos conseguimos surpreender com o que todos os dias nos interpela.
Do meu ponto de vista, já o tenho referido, a partidocracia que se instalou em Portugal levando a que os partidos, através dos respectivos aparelhos e consoante o calendário tomassem conta do país, minou dramaticamente a estrutura ética de uma democracia que estava ainda em maturação. A agenda dos partidos e os respectivos interesses, institucionais ou pessoais, sobrepõem-se despudoradamente ao bem comum.
Tal cenário não parece facilmente modificável pois, obviamente, os partidos capturaram o quadro normativo que regula a actividade política e, por isso, sendo parte do problema dificilmente serão parte da solução. Veja-se por exemplo a permanente e consistente falta de vontade política de promover o combate à corrupção. Finalmente, ao fim de muita deriva e retórica, conseguiu-se algo no sentido de criminalizar o enriquecimento ilícito.
No entanto, o relatório da Procuradoria-geral da República, hoje conhecido, revela que o Gabinete do Ministério Público existente no Tribunal Constitucional que deveria proceder à fiscalização dos rendimentos dos titulares dos cargos políticos ou equiparados não tem meios suficientes para o cumprimento das suas funções e competências.
São inúmeras as situações conhecidas na sociedade portuguesa com personagens de diferentes quadrantes políticos envolvidos em esquemas e negócios que, nas mais das vezes e mesmo quando levados à justiça, acabam em coisa nenhuma alimentando a devastadora ideia da impunidade e de que o crime compensa e de que, quanto maior mais fácil se torna escapar.
Oiço os politólogos, espécie em proliferação e já quase praga que se juntou aos tudólogos, a perorar sobre o mal-estar da democracia de vários ângulos e com análises sempre muito interessantes mas quase sempre, do meu ponto de vista, ao lado, como se costuma dizer. Seria necessário um movimento forte da sociedade não alinhada nos aparelhos partidários a exigir mudanças e compromissos éticos às lideranças. É necessário uma militância activa no combate aos vícios da partidocracia, denunciando, exigindo responsabilidades. A imprensa teria aqui um papel fundamental, se parte dela não tivesse, ela também, um compromisso mais ou menos evidente com as agendas partidárias.
Quando penso que tudo isto já bateu no fundo, surge algo ainda pior. Quando começarão as faces a ser desocultadas?

1 comentário:

anónimo paz disse...

Só a imprensa poderia dar visibilidade aos movimentos cívicos não alinhados com partidos.

MAS a imprensa é deliberadamente inconsequente.

MAS a imprensa presta vassalagem ao poder político e financeiro vigente.

POR ISSO a imprensa faz parte do problema (salvo raríssimas excepções).


saudações