sexta-feira, 12 de outubro de 2012

DUAS MÃES, DOIS PAIS. (Novo capítulo)

O Tribunal de Família e de Menores do Barreiro decidiu a atribuir a guarda provisória de uma criança a um casal homossexual. A decisão não configura a atribuição de responsabilidades parentais e muito menos a adopção, possibilidade chumbada pelo Parlamento em Fevereiro deste ano. No entanto e ao que parece, os termos da decisão do Tribunal parecem fundamentar um argumentário favorável à adopção o que é mais um contributo para o debate em aberto sobre a homoparentalidade, questão a que me parece oportuno retornar.
A questão da adopção por parte de casais homossexuais é, na maior parte das vezes, dirimida mais em torno dos valores que da racionalidade da argumentação. Sem querer, nem sequer consigo, trazer nada de novo para a discussão, apenas umas notas.
As três grandes preocupações ou obstáculos mais frequentemente aduzidas para impedir a adopção por casais homossexuais são a eventual dificuldade da criança em lidar com a sua orientação sexual, a vulnerabilidade psicológica e problemas de comportamento e o risco de discriminação nos contextos escolares. Como foi afirmado há algum tempo numa conferência realizada em Lisboa sobre a homoparentalidade, uma revisão exaustiva de estudos sobre estas questões realizada pela Associação Americana de Psicologia não confirmou nenhuma destas preocupações o que também transparece em alguns testemunhos expressos num trabalho que o Público realizou na altura.
Neste sentido, podemos também lembrar que a maioria das pessoas homossexuais terão sido educadas em famílias heterossexuais, que existem crianças com sérios problemas emocionais e vulnerabilidade psicológica a viverem situações familiares heterossexuais e, finalmente, que existem múltiplos casos de crianças discriminadas em contexto escolar o que não nos faz retirar de lá as crianças mas, pelo contrário, combater a discriminação.
Do meu ponto de vista e de uma forma propositadamente simplista, a questão central é o que faz mal às crianças é serem maltratadas e os maus tratos não decorrem do tipo de famílias mas do tipo e competência dos pais. Quando as crianças são bem tratadas e crescem com adultos que gostam delas, as protegem e as ajudam a crescer elas encontram caminhos para lidar com dois pais ou com duas mães.
O que as crianças quase sempre não sabem como resolver é quando têm por perto adultos, heterossexuais, que não gostam delas, que as maltratam, negligenciam, abandonam, etc. Isso é que faz mal às crianças.
O resto é uma discussão não conclusiva, assente em valores de que não discuto a legitimidade, mas que não podem ser confundidos com um discurso de defesa das crianças de males que estão por provar.
É mais importante defendê-las dos males comprovados e que todos os dias desfilam aos nossos olhos.

2 comentários:

Anónimo disse...

Caro professor acho muito bonito a guarda da criança ter sido entregue a uma casal homossexual pelo tribunal, neste caso um modelo internacional e um cabeleireiro famoso, não sei se houve uma avaliação psicológica aos sujeitos, mas isso é uma questão pormenor.

Não sei se sabe que recentemente houve um casal heterossexual que ganhou uma indeminização do estado pelo facto de o processo de adopção ter demorado 4 anos e ainda não estar concluído, estou certo que se fosse no tribunal do Barreiro a situação estaria resolvida já que são céleres e modernos.

Também não sei se ouviu um Psicólogo seu amigo e de quem eu gosto muito, dizer que assim com há casais heterossexuais que não reunem condições para serem adoptantes também acontecerá com alguns casais homossexuais.

Mas tal situação não configura problema porque as pessoas interessadas podem ir a Espanha fazer inseminação artificial.

Os estudos da American Psychologycal Association valem o que valem, eu pessoalmente acho que a APA é o FMI da Psicologia e acho extraordinário que tenha de realizar os trabalhos Científicos segundo umas normas Americanas, é o chamado imperialismo psicológico.

Mas pode sempre consultar alguns artigos de revistas da International Psychoanalytical Association, onde aparecem casos clínicos de casais homossexuais que negaram aos seus filhos uma identificação ao sexo oposto.

Ao mesmo tempo tem muitos psicanalistas com posições contrárias à minha e eu sou um mero psicólogo clínico.

O que me chateia não são as posições contrárias, o que me aborrece são as pessoas que não têm a frontalidade de assumirem as suas posições.

A minha discussão sobre este tema nunca assentou na racionalidade nem nos valores.

Mas permita-me fazer uma adivinhação, não sobre os rankings das escolas, mas sobre estas crianças: a certa altura da vida estas crianças vão fantasiar sobre quem são os progenitores, e isto é uma questão com que os técnicos que trabalham com adopção lidam, seja adopção homossexual ou heterossexual. As crianças questionam-se sobre quem são os pais, uma prostituta? um toxidependente? porque me abandoram? Estão vivos? etc. Como deve imaginar isto origina nas crianças fraturas internas enormes muitas vezes irreparáveis. Isto configura uma situação completamente diferente do que por exemplo das crianças que perderam os pais na guerra do ultramar, porque essas ao menos sabem que os pais morreram e que não foram abandonadas. Aliás convido-o a fazer uma pesquisa antropológica para saber porque no nosso país muitos corpos são velados de caixão aberto.

Continuando a minha adivinhação direi que muitas crianças adoptadas por casais homossexuais se questionarão suplementarmente da ausência do addoptante do sexo oposto, esta questão não tem nenhum juízo de valor ou de racionalidade. mas como a APA diz que está tudo bem não temos que nos preocupar.

Também deve conhecer casos de famílias monoparentais em que a fantasia da criança é: porque é que a minha mãe ou pai não arranjou um pai ou mãe para mim?

Aliás muita da patologia que vemos nos miúdos de famílias monoparentais, é que na idade em que se devem sentir protegidos sentem que devem proteger a mãe, e o sentimento de incapacidade e medo que se gera em muitos miúdos causa enormes transtornos, mas como disse alguém que me atacou isto é psicologia especulativa, antes fosse, infelizmente é o que se vê nos consultórios.

Pessoalmente não defendo um modelo familiar particular. Acho sobretudo que os miúdos merecem um bom pai e uma boa mãe independentemente da sua orientação sexual.

Apesar da minha adivinhação não sei se as coisas vão correr bem ou mal, se calhar para uns sim, para outros não, e isso é o que me preocupa.

Gosto muito da Série A Família Moderna nomeadamente do casal homossexual adoptante, no entanto falta a dimensão da sexualidade na vida do casal, mas aquilo é só uma comédia, infelizmente a vida real no nosso país tem sido trágica.

Da última vez chamaram-me besta homofóbica, espero que me tratem melhor desta vez.

Abraço
António Caroço

Zé Morgado disse...

Caro António, questões desta natureza, como comecei por dizer no texto, são analisadas numa mistura entre os valores e crenças e a "Teoria" que tentamos mobilizar para dar sustentação aos nossos valores c e crenças. Não tenho numa posição fechada e tal como você diz, em qualquer situação ou tipo de família podemos ter miudos saudáveis ou não.
Um abraço