domingo, 1 de setembro de 2019

EDUCAÇÃO E EMOÇÃO


No Público encontra-se uma peça sobre o papel das emoções nos processos educativos acentuando a importância do desenvolvimento da chamada “inteligência emocional”. Confesso que com alguma frequência muito do que vejo escrito e afirmado me suscita algumas reservas, quer pela visão mágica com que é informado, quer pela regular apresentação de um receituário ou programa que garante “inteligência emocional”.
No entanto a importância e actualidade destas questões leva-me a retomar algumas notas.
As alterações nos estilos de vida, nos valores sociais, culturais, económicos, etc., nos modelos de desenvolvimento económico e consequente visão política e as suas consequências nas políticas educativas parecem ter criado um tempo em que emerge a necessidade de “trabalhar” as emoções nos contextos educativos.
Os climas sociais e de aprendizagem em diferentes escolas e salas de aula nem sempre são particularmente amigáveis para todos os alunos, mas também para professores como múltiplos estudos evidenciam.
Talvez tenhamos que reflectir sobre isto e retomar coisas velhas, nada “inovadoras”, nada "revolucionárias", nenhum “novo paradigma”, a educação escolar é estruturada e alimentada pela relação e a relação, para que exista e seja positiva, tem como ingrediente … a emoção. Nas minhas conversas por aí sobre estas coisas da educação desafio muitas vezes pais ou professores a recordarem muito brevemente professores de quem guardam boas memórias. Quando lhes pergunto porquê, as justificações remetem muito significativamente para a relação que com eles tiveram, para além do que com eles aprenderam das “coisas da escola”.
Como dizia em cima, a educação escolar, a acção do professor, tem esse princípio fundador, assenta na relação que se operacionaliza na comunicação. Também por isso são também preocupantes os tempos que vivemos em que os professores têm pouco tempo para comunicar, para conversar com os alunos e as emoções entram em turbulência e descontrolo.
Também a pressão para os resultados, a natureza dos conteúdos e gestão curriculares ou o número de alunos por turma por exemplo, dificultam essa relação. O professor “fala com o programa”, a maioria dos alunos entende, outros não e com esses é preciso falar, mas … para os mandar calar ou até sair. Há pouco tempo para conversar, para “cativar”, como diria Saint-Exupéry.
Por isso tantas vezes afirmo que os professores, tanto ou mais do que ensinar o que sabem, ensinam o que são. Quando nos lembramos com ternura e admiração de alguns professores é pelo que eles eram e nem sempre pelo que nos ensinaram apesar da importância que tenha tido.
A este propósito uma pequena história que vivi e que por vezes aqui refiro. Há uns tempos, num trabalho com professores numa cidade do interior, uma Professora, das grandes, contava que tinha uma experiência muito interessante com uma turma CEF, as dos "alunos de segunda" como muitas vezes são vistas. A professora comentava com os miúdos como estava satisfeita com as mudanças positivas que eles apresentavam e perguntava a que se deviam.
Um dos miúdos, o "chefe", respondeu "sabe, boceses gostam da gente, falam com a gente e a gente gosta de boceses". Quando nos contou isto a professora não escondeu uma lágrima.
O Mestre João dos Santos quando afirmava que alguém tinha sido seu professor justificava, "porque foi meu amigo".
São assim os professores que nos marcaram de forma positiva, ensinam-nos o que são, não só o que sabem como acima escrevi.
Sendo certo que precisamos de ajustamentos regulares no que fazemos, no como fazemos e para que fazemos, não “inovemos” tanto, não queiramos tantos “novos paradigmas”, não "mudemos" tudo pela ilusão mágica da mudança.
Criemos, apenas, o tempo e o modo para que nas salas de aula os professores e os alunos, todos os alunos, tenham o tempo e a circunstância que lhes permita comunicar, entre si, com a razão e com a emoção. Irão aprender e serão gente de bem.

2 comentários:

Manuela Espadinha disse...

Parabéns, Professor, pelos textos que escreve sobre o Ser e Estar em Educação.
Para ser professor há que ter paixão por aquilo que fazemos, ouvir os alunos e percecionar o que cada um precisa que lhe demos.Não é tarefa fácil, mas felizes daqueles professores que na sua missão nobre daquilo que ensinam, ficam sempre a sonhar a aventura para o dia seguinte.
Felizes daqueles que adoram ver o brilho dos olhitos dos seus alunos, a cumplicidade que travam com eles, sentindo a utilidade da sua partilha diária, numa relação pedagógica são e construtiva.
Obrigada pelas palavras intensas e profundas que dedica aos Professores.
Um abraço,
Manuela Espadinha

Zé Morgado disse...

Olá Manuela, obrigado, bom trabalho.