segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

"REFERENCIADOS", "SINALIZADOS", MAS ... PARTIRAM

Estarão certamente lembrados da tragédia que vitimou duas crianças em Alenquer há poucas semanas. Agora um novo drama em Oeiras com a morte de outras duas crianças e da mãe. Embora em averiguação, o cenário parece apontar para que a mãe tenha terminado com a vida dos três.
Como na altura escrevi, estas tragédias mostram o muito que ainda temos de fazer em matéria  de protecção a menores em risco.
Ao que parece e tal como em Alenquer, também estas crianças estavam sinalizadas por parte da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens da área mas os pais recusaram apoios ou intervenção. Dado que a Comissão não pode intervir sem consentimento, sendo eles eventualmente responsáveis pelos riscos que as crianças enfrentam, o processo é enviado para Tribunal e … ficamos à espera. A decisão pode vir em tempo útil a uma intervenção que de facto proteja os menores ou, como foi o caso, acontece mais uma tragédia.
De há muito e a propósito de várias questões, que afirmo que em Portugal, apesar de existirem vários dispositivos de apoio e protecção às crianças e jovens e de existir legislação no mesmo sentido, sempre assente no incontornável “supremo interesse da criança, não existe o que me parece mais importante, uma cultura sólida de protecção das crianças e jovens. Poderíamos citar a insuficiência e falta de formação de juízes que se verifica nos tribunais de Família, as frequentemente incompreensíveis decisões em casos de regulação do poder parental, etc.
Temos também em funcionamento as Comissões de Protecção de Crianças e Jovens que procuram fazer um trabalho eficaz mas em difíceis circunstâncias, para além da falta de agilidade processual na articulação das múltiplas entidades envolvidas como também é frequente entre nós e terá acontecido nestas duas situações dramáticas.
É verdade que existem situações que se desenvolvem, por vezes, de forma extremamente rápida e imprevisível, em ambos os casos parece existir nas mães alguma perturbação do foro da saúde mental o que torna tudo ainda mais difícil, mas também exige maior celeridade e atenção.
No entanto, boa parte das Comissões têm responsabilidades sobre um número de situações de risco ou comprovadas que transcendem a sua capacidade de resposta. A parte mais operacional das Comissões, a designada Comissão restrita, tem muitos técnicos a tempo parcial. Tal dificuldade repercute-se, como é óbvio, na eficácia e qualidade do trabalho desenvolvido, independentemente do esforço e empenho dos profissionais que as integram.
Este cenário permite que ocorram situações, frequentemente com contornos dramáticos, envolvendo crianças e jovens que, sendo conhecida a sua condição de vulnerabilidade não tinham, ou não tiveram, o apoio e os procedimentos necessários. Ouve-se então uma das expressões que me deixam mais incomodado, a criança estava “sinalizada” ou “referenciada” o que foi insuficiente para a adequada intervenção. Em Portugal sinalizamos e referenciamos com relativa facilidade, a grande dificuldade é minimizar ou resolver os problemas referenciados ou sinalizados.
Por isso, sendo importante registar a menor tolerância da comunidade aos maus tratos aos miúdos, também será importância que desenvolva a sua intolerância face à ausência de respostas e surgimento de tragédias como a de Alenquer ou agora a de Oeiras. 

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