Lê-se no Público que, de acordo com dados da Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, o número de estudantes inscritos no ensino superior, público e privado, no último ano lectivo voltou a ser o mais alto embora com uma subida menor que no ano anterior.
Não pode deixar de ser uma boa notícia, a qualificação é um
bem de primeira necessidade para sustentar projectos de vida bem-sucedidos.
No entanto, nas actuais circunstâncias sociais e económicas,
designadamente na situação de deslocados, muitos estudantes têm dificuldade em
continuar.
Como aqui escrevi há algum tempo, de acordo com o Infocursos
de 2024, que está a subir a taxa desistência dos alunos do superior no final do
primeiro ano. Em 2022/2023, a taxa de desistência dos estudantes de
licenciatura nestas circunstâncias era de 11,10% considerando a oferta de mais
de 6 mil cursos de 282 instituições de ensino superior. É o número mais elevado
dos últimos 8 anos e está a subir há quatro anos consecutivos.
A mesma situaçãoverifica-se com os alunos de cursos técnicos
superiores profissionais revelando uma taxa de desistência de 26,9% em
2022/2023.
A estes indicadores não serão certamente alheios os custos
da frequência do ensino superior ou o “desencanto” com a escolha.
Como referi acima, a qualificação é um bem de primeira
necessidade e um forte contributo para projectos de vida bem-sucedidos o
abandono é sempre preocupante.
Temos assistido um aumento do número de candidatos a bolsa,
tal como em aumentado o número de estudantes que entra no ensino superior.
Também é reconhecido que se tem verificado perda de rendimento de muitas
famílias em consequência do impacto económico e social da pandemia e dos tempso
qua também agora se vivem.
No entanto, apesar destas dimensões poderem constituir
alguma justificação creio que importa não esquecer uma questão de natureza
estrutural, estudar no ensino superior é muito caro em Portugal. Também a
recente alteração do regulamento de atribuição de bolsas não minimizou esta
situação.
Algumas notas começando por alguns dados que já aqui tenho
citado.
De acordo com Relatório do CNE, "Estado da Educação
2019", a percentagem de alunos que em Portugal acede a bolsas de estudo
para o 1º ciclo do superior está no segundo escalão mais baixo da análise,
entre 10 e 24,9%. Para comparação, Irlanda, Países Baixos estão no intervalo
entre 25% e 49,9% e a Suécia no superior a 75%. Países como Espanha, França,
Reino Unido e muitos outros têm percentagens de alunos com apoio superiores a
nós e, sem estranheza, também maior nível de qualificação.
Em 2018 foi divulgado um estudo já aqui citado, “O Custo dos
Estudantes no Ensino Superior Português” da responsabilidade do Instituto de
Educação da U. de Lisboa, relativo ao ano lectivo de 2015/2016 mostrando que
cada estudante universitário gastou em média 6445€ em despesas como propinas,
material escolar, alojamento ou alimentação. Os alunos de instituições
universitárias privadas têm uma despesa perto dos 10000€ e nos politécnicos
privados o custo será de 8296€. De facto, sendo a qualificação superior um bem
de primeira necessidade para os cidadãos e para o país, é um bem muito caro,
demasiado caro para muitas famílias e indivíduos.
Estudos comparativos internacionais, “Social and Economic
Conditions of Student Life in Europe”, por exemplo, também mostram que as
famílias portuguesas são das que suportam uma fatia maior dos custos de
frequência do superior sendo que ainda se verifica uma forte associação entre a
frequência do ensino superior e nível de escolarização e estatuto económico das
famílias.
Apesar de um abaixamento do valor as propinas no ensino
público, as dificuldades sentidas por muitos estudantes do ensino superior e
respectivas famílias, quer no sistema público, quer no sistema privado com
valores bem mais altos de propinas, são, do meu ponto de vista, consideradas
frequentemente de forma ligeira ou mesmo desvalorizadas. Tal entendimento
parece assentar na ideia de que a formação de nível superior é um luxo, um bem
supérfluo pelo que ... quem não tem dinheiro não tem vícios.
A qualificação é a melhor forma de promover desenvolvimento
e cidadania de qualidade pelo que apesar de ser um bem caro é imprescindível.
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