quarta-feira, 18 de setembro de 2024

SEMENTES DE MAL-ESTAR

 É impossível não ficar impressionado com o grave episódio ocorrido numa escola básica da Azambuja. Um aluno com 12 anos feriu de forma aleatória seis colegas, sendo que três ainda estão hospitalizados.

É ainda causa de grande perplexidade a ocorrência de uma situação desta natureza desencadeada por alguém com 12 anos que, aparentemente, não demonstrava sinais que indiciassem o risco de o realizar.

Dito isto, também sabemos que nos tempos que correm o clima social, relacional e emocional nas comunidades de que fazemos parte nem sempre é muito amigável e cria caldos de cultura relacional em que o clima nas comunidades é ele próprio menos favorável ao bem-estar.

Apesar de em Portugal estes casos de violência extrema serem menos frequentes e de menor gravidade que noutros países, levam-nos a questionar os nossos valores, modelos educativos, códigos e leis pela perplexidade que nos causam.

Esta perplexidade exige a necessidade de tentarmos perceber um processo que designo como "incubação do mal" que se instala nas pessoas, muitas vezes logo na infância e adolescência, a partir de situações de mal-estar que podem passar relativamente despercebidas, mas que insidiosamente começam a ganhar um peso interior insuportável cuja descarga apenas precisa de um gatilho, de uma oportunidade. 

A fase seguinte pode passar por duas vias, uma mais optimista em que alguma actividade, socialmente positiva, possa drenar esse mal-estar, nessa altura já desregulação de valores, ódio e agressividade. Uma outra via em que aumenta exponencialmente o risco de um pico que pode ser um ataque numa escola ou noutro espaço público ou uma investida contra alguém arriscando a entrada numa espiral de violência cheia de "adrenalina", em nome de coisa nenhuma a não ser de um "mal-estar" que destrói valores e gente.

É evidente que a detenção constitui um importante sinal de combate à sensação de impunidade perigosamente presente na nossa comunidade, mas é minha forte convicção de que só punir e prender não basta assim, como apenas a mudança do quadro legal de acesso a armas não faria, só por si, com que não acontecessem episódios desta dimensão trágica.

Sabendo que prevenção e programas comunitários e de integração têm custos, importa ponderar entre o que custa prevenir e os custos posteriores da violência, de delinquência continuada ou de insegurança.

Importa ainda estratégias mais proactivas e eficientes de minimizar, a exclusão, o abandono e insucesso educativos, o “mal-estar” psicológico e problemáticas de saúde mental, a guetização e "quase total" e, muitas vezes, a desocupação de quem não estuda, nem trabalha. Para esta gente, o futuro passa por onde, por quem e porquê?

Finalmente, a importância de uma precoce e permanente atenção às pessoas, ao seu bem-estar, tentando detectar, tanto quanto possível, sinais que indiciem o risco de enveredar por um caminho que se percebe como começa, mas nunca se sabe como acaba.

Sem comentários: