domingo, 17 de julho de 2011

LANÇAR O BARCO À ÁGUA

O Público de hoje apresenta um trabalho sobre a crise que envolve os Estaleiros de Viana do Castelo e o risco real de encerramento devido aos prejuízos acumulados decorrentes da gestão e das decisões políticas que nos têm levado a voltar costas ao mar e à terra, tornando-nos num mau país de serviços.
Este trabalho sobre o voltar de costas ao mar, no caso envolvendo a indústria naval, causou-me alguma nostalgia.
Numa das maiores rotundas da minha terra, sim também temos muitas rotundas, foi instalado um conjunto escultórico de grandes dimensões dedicado à construção naval uma das actividade emblemáticas do concelho de Almada, com o extinto estaleiro da Parry & Son, do Arsenal do Alfeite em vias de extinção e da mais recente Lisnave também em maus lençóis.
Na minha família, o meu pai como serralheiro, o meu sogro como caldeireiro e vários tios, para além de muita gente conhecida, a maioria já com a narrativa terminada, foram operários da construção naval pelo que aquele monumento acorda ressonâncias e, mais do que isso, acho-o bonito. Um dos seus elementos de maior dimensão representa um barco no plano, aprendi desde miúdo que o plano é o local seco, não uma doca, inclinado, onde os barcos são construídos e reparados. Quando prontos, procedia-se ao seu lançamento à água, partiam-se as cordas que seguravam o barco no plano e este deslizava, ganhava velocidade e entrava na água levantando um enorme cachão e ficava a flutuar ganhando a sua condição de barco.
Nos idos de 50 e 60 o meu pai tentava, por vezes, conseguia, com a conivência dos guardas que eu, miúdo, umas vezes só, outras com o meu primo, passasse o mítico Portão Verde do Arsenal do Alfeite para assistir ao lançamento de um barco.
Nem dormia, era algo que me impressionava e ainda hoje está bem vivo na memória, no lado das coisas mais bonitas que carrego na mochila já bem composta pela estrada andada.
Lamentavelmente, hoje estão a acabar com os lançamentos dos barcos à água nas nossas terras.
Parece que toda a nossa terra, ela própria, se transformou num enorme barco, à deriva.

3 comentários:

piedosa mente disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Jota Pê disse...

Boa Zé! Excelente exercício de nostalgia. Coisa boa de sentir, desde que não nos afecte a memória nem nos impeça que a emoção, com que colorimos as imagens, falseie os momentos recordados. Bom, já agora, resta-me pegar na tua frase terminal e fazer votos (todos os disponíveis) para que tal barco à deriva não se afaste muito da margem. Abraço e boa semana de trabalho, sendo caso disso.

Zé Morgado disse...

Ainda é caso disso, caro Jota Pê