segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

POR ENTRE OS PINGOS DA CHUVA

Hoje, durante a corrida habitual nos domingos de manhã debaixo de uma chuva persistente e já encharcado, lembrei-me da tão conhecida expressão "passar entre os pingos da chuva sem se molhar".
Deve ser bom, pensei para comigo e para entreter a cabeça enquanto as pernas andavam, comecei a imaginar como se poderia aceder a essa útil capacidade.
Para tal exercício tentei caracterizar a figuras que nos parecem capazes de tal desempenho e a partir daí estabelecer os requisitos.
Sem preocupação de ordenação creio que importa desde logo esquecer o que significa ética ou qualquer outra coisa da mesma natureza.
Parece também necessário que se desenvolva uma espécie de surdez e cegueira selectivas, isto é, ouvir e ver apenas o que interessa.
Talvez seja útil algo a que poderemos chamar de mimetismo intelectual, ou seja, desenvolver a capacidade de pensar e afirmar sempre o que em cada circunstância seja adequado, quer ao contexto, quer aos interlocutores.
Por outro lado, parece ser desejável uma boa dose de cinzentismo, que se poderá definir como uma discrição "manhosa", aquilo a que na linguagem popular se chama andar "de fininho", "sem levantar ondas". Tal funcionamento permite que o "artista" esteja sempre presente como quem está ausente, o que é notável.
Creio também que seria importante uma visão da vida e do mundo "umbigocentrada" o que significa o entendimento de que a vida e o mundo, incluindo as pessoas, estão ao serviço da pessoa que assim funciona.
Depois destas considerações que não sei se acham aplicáveis a algumas figuras da nossa terra e do que elas implicam, cheguei à conclusão de que sempre que chova, eu e a grande maioria estaremos condenados a ficar encharcados, não conseguiremos nunca passar por entre os pingos da chuva. Como alguns artistas.

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