sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

ELES NÃO SOSSEGAM

Parece uma notícia extraordinária, “Polícia fecha creche ilegal que alegadamente dava calmantes a crianças”. O caso passou-se no centro de Lisboa e, lamentavelmente, não tem nada de extraordinário.
Em primeiro lugar, porque espaços, espeluncas, ilegais que recebem crianças são bem mais frequentes do que se imagina, sobretudo nas zonas de demografia mais densa, por inexistência de respostas suficientes e a preços acessíveis, o recurso dos pais é a resposta clandestina como em várias áreas da nossa vivência.
Em segundo lugar temos a questão da administração de calmantes às crianças. À primeira vista poderia parecer algo de surpreendente, mas não. Em Portugal verifica-se uma das mais altas taxas de consumo de psico-fármacos e de auto-medicação, a cultura é tomar “qualquer coisinha” que ajude a sossegar da vida e dos problemas que enfrentamos. Parece-me também de referir que mesmo por parte dos profissionais de saúde me parece existirem práticas de prescrição excessiva de medicamentos para “acalmar” as crianças. Estamos a alimentar um processo de ritalinização de muitos miúdos a quem, apressadamente e de forma excessivamente ligeira, é colocado um rótulo de “dismiúdo” que justifica a medicação, estou a lembrar-me, por exemplo, do aumento exponencial de crianças a quem chamam “hiperactivas” quando algumas estão bem longe de justificar o rótulo.
Finalmente, uma nota sobre a minha convicção de que a agitação das crianças de que se fala com muita frequência, mais não é, na maioria dos casos, do que uma imagem reflexa da agitação dos adultos que as rodeiam. Adultos agitados, embalam e sustentam crianças agitadas. Por isso, talvez seja melhor tomar qualquer coisinha para ajudar a sossegar.
Acabo como começo, lamentavelmente, uma creche ilegal que dá calmantes às crianças não é uma notícia que me surpreenda. Embaraça-me e entristece-me.

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