quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025

SE HOUVERA QUEM ME ENSINARA ...

 No DN encontrei uma peça sobre o trabalho que a ONG “Teach for Portugal” desenvolve em Portugal desde 2019 e que aqui já tenho referido.

Durante estes cinco anos a Teach for Portugal já envolveu mais de 30 mil alunos em 91 escolas de norte a sul do país.

De acordo com uma responsável da organização, “Comparados os resultados dos alunos com mentores e dos alunos sem mentores, verifica-se uma redução de 26% das negativas entre o primeiro e o terceiro período nas turmas em que o programa está ativo”. A intervenção da organização realiza-se sobretudo em escolas em escolas em que a percentagem de alunos apoiados pela Ação Social Escolar é superior a 50%,

Na peça refere-se que a “Teach for Portugal contrata jovens licenciados por dois anos lectivos, pagando cerca de 28 mil euros, para assumirem um compromisso de envolvimento e liderança. Depois de selecionados, têm 350 a 400 horas de formação intensiva, normalmente no período do verão, antes do ano letivo, em metodologias diversas para dinamizar grupos. Em cinco anos a organização já formou 200 mentores e estão atualmente ativos mais de 100. Acabam por ter um horário semanal de 40 horas, sendo que uma parte do horário é destinado à recuperação de aprendizagens a matemática, português e inglês, as disciplinas nucleares.”

A organização tem um conjunto de parcerias envolvendo o Estado, com financiamento enquadrado pelo PT2030, e entidades privadas e municípios. Entre os parceiros privados estão, por exemplo, a Fundação Santander e a Fundação BPI – La Caixa.

Algumas notas no sentido em que algumas vezes já aqui referi sobre este projecto.

Como é evidente, registo todas as iniciativas que possam contribuir para minimizar ou erradicar problemas, mas já me falta convicção no impacto do modelo mais habitualmente seguido.

Para cada constrangimento ou dificuldade percebida nas e pelas escolas e com regularidade, aparece vindo de fora ou gerido de fora, um Plano, um Projecto, um Programa, uma Iniciativa, as combinações são múltiplas, destinado a essa problemática.

Durante as últimas décadas, perco a conta a planos, projectos, programas, experiências inovadoras, que chegaram e chegam às escolas para combater o insucesso ou, pela positiva, promover o sucesso, promover a leitura e escrita, promover a matemática, promover a educação científica, promover a educação inclusiva, a aprendizagem emocional, erradicar ou minimizar o bullying, a relação entre escola e pais e encarregados de educação, promover a expressão artística e a criatividade, promover comportamentos saudáveis e actividades desportivas, literacia financeira, promover a inovação e as novas tecnologias, para não falar de iniciativas mais "alternativas", por assim dizer, e que têm poderes mágicos, parece. A lista enunciada é apenas exemplificativa e não está em causa a pertinência ou juízo sobre as dimensões citadas, trata-se do modelo de abordagem.

Com demasiada frequência muitos destes projectos vêm de fora das escolas, as origens são variadas, não chegam a envolver a gente das escolas, esmagada pelo trabalho, burocracia e outros constrangimentos como, por exemplo, assegurar da melhor forma possível o dia-a-dia do trabalho educativo que tem de ser realizado. Importa ainda não esquecer as dificuldades severas que muitos agrupamentos e escolas têm vindo a sentir com a falta de recursos humanos, professores, técnicos e auxiliares actualmente.

Também com demasiada frequência muitos destes projectos morrem de “morta matada” ou de “morte morrida”, não são avaliados de forma robusta e dão umas fotografias ou vídeos que compõem o portfólio dos organizadores e proporcionam uma experiência que se deseja positiva aos intervenientes no tempo que durou, mas sem mais impacto.

 Todavia, preciso de afirmar que alguns destes Planos, Projectos, Inovações, etc. dão origem a trabalhos notáveis que, também com frequência, não têm a divulgação e reconhecimento que todos os envolvidos mereceriam.

Também demasiadas vezes estas iniciativas consomem recursos com baixo retorno e ao serviço de múltiplas agendas.

Ponto.

Tenho para mim, que não podendo a escola responder a todas as questões que afectam quem nelas passa o dia poderia, ainda assim, fazer mais se os investimentos feitos no mundo à volta da escola e que lhe vem bater à porta com propostas fossem canalizados para as escolas.

Com real autonomia, com mais recursos e com modelos organizativos mais adequados as escolas poderiam fazer certamente mais e melhor que quem vem de fora numa passagem transitória, mais ou menos longa, mas transitória. Sim, tudo isto deveria ser objecto de escrutínio, regulação e avaliação também externa, naturalmente.

Escolas com mais auxiliares, auxiliares informados e formados podem ter um papel importante em diferentes domínios.

Directores de turma com mais tempo para os alunos e menos burocracia poderiam desenvolver trabalho útil em múltiplos aspectos do comportamento e da aprendizagem.

Psicólogos e outros técnicos em número mais adequado, o que se verifica é inaceitável, poderiam acompanhar, promover e desenvolver múltiplas acções de apoio a alunos, professores, técnicos e pais.

Mediadores que promovessem iniciativas no âmbito da relação entre escola, pais e comunidade seriam, a experiência mostra-o, um investimento com retorno.

São apenas alguns exemplos de respostas com resultados potenciais com um custo que talvez não seja superior aos custos de tantos Projectos, Planos, Programas ou Iniciativas Inovadoras destinadas a múltiplas matérias e com custos associados de “produção” que já me têm embaraçado, mas a verdade é que as agendas e o marketing têm custos.

Ainda este propósito, ficar embaraçado, volto a contar uma experiência pessoal.

Há largos anos estava na altura na Direcção-Geral do Ensino Básico e foi-me pedido que apresentasse numa escola do 1º ciclo um Projecto em desenvolvimento pela Direcção-Geral destinado ao ensino de português a crianças de famílias oriundas dos PALOP que aprendiam em português na escola e falavam crioulo em casa. Apresentei o Projecto o melhor que fui capaz aos professores da escola e no fim alguém me disse de uma forma muito simpática, “Colega, o Projecto é muito interessante, mas sabe, já temos 24 Projectos na escola, não podemos fazer mais.”

Na verdade, a Projectite, sobretudo vinda de fora, é uma opção com pouco potencial apesar, insisto, das boas experiências que também se conhecem.

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