quinta-feira, 17 de novembro de 2011

AS ESPECIAIS DIFICULDADES DOS MIÚDOS ESPECIAIS

No Público adianta-se a redução de 14,2 % do orçamento para a educação especial, a educação dos mais vulneráveis dos vulneráveis.
Creio que ninguém estranhará tal notícia. A área da educação é uma das que mais cortes sofrerá no próximo orçamento. É certo que o Ministro Nuno Crato se propõe levar à cena o milagre dos pães. Lamento, mas não acredito em milagres, muita gente passará fome, o pão não chegará para todos.
As crianças com necessidades educativas especiais, as suas famílias e os professores e técnicos, especializados do ensino regular sabem, sobretudo sentem, um conjunto enorme de dificuldades para, no fundo, garantir não mais do que algo básico e garantido constitucionalmente, o direito à educação e tanto, quanto possível, junto das crianças da mesma faixa etária. É assim que as comunidades estão organizadas, não representa nada de extraordinário e muito menos um privilégio.
Eu sei que também nesta área encontramos desperdícios e abusos que devem ser eliminados e os processos devem ser regulados mas sei mais coisas.
Sei que com base num incompetente normativo que carece de urgente revisão, o lamentável Decreto-Lei 3/2008, temos milhares de crianças com necessidades de apoio educativo e que estão abandonadas e "entregadas" em vez de integradas, pese o empenho de muitos profissionais dedicados.
Sei também que esta legislação inibe a prestação de apoios a crianças que deles necessitam, quer por via da gestão de recursos impondo taxas de prevalência de problemas fixadas administrativamente e sem qualquer correspondência com a realidade quer pelos modelos de organização de respostas que impõe.
Sei ainda que a prestação de serviços educativos em "outsourcing" é um serviço assente num enorme equívoco e que agora com os cortes orçamentais se perceberá melhor o logro criado junto das instituições privadas que intervinham na área da educação especial.
Como é evidente, sei finalmente que em situações de dificuldade económica, as minorias, são sempre mais vulneráveis, falta-lhes voz.
Como sempre afirmo, os níveis de desenvolvimento das comunidades também se aferem pela forma como cuidam das minorias.
Lamentavelmente, estamos num tempo em que desenvolvimento se confunde com mercados bem sucedidos.

3 comentários:

IFIGÉNIO OBSTRUZO disse...

Pois é meu caro quando as pessoas qu estão no poder só vêm números dá nisto..para eles estas pessoas são pesos mortos dispensáveis ...pesam no orçamento não dão lucro...nem votam ...presumo que para o ano serão inseridos nas turmas e irão a todas as disciplinas independentemente do grau de deficiência...tudo ao molho e fé em nada...

Já notei que a maior parte dos homens se sente açulada e indignada quando, em pleno combate moral, recorremos à ternura e ao afecto. É vê-los feras amansadas e apanhadas de surpresa assim que recorremos à violência ou à dureza. Raça detestável! Tal preceito mantém-se praticamente inalterável no que respeita ao amor.
Realidade estranha e deplorável, pois, em muitos casos, é igualmente aplicável à amizade; realidade pavorosa, desesperante, mas inevitável, necessária à subsistência das nossas sociedades, dos governos mais democráticos aos mais despóticos. Quando não é refreado nem reprimido, o homem aproveita imediatamente para cometer abusos. Despreza quem o receia e maltrata quem o ama; receia quem o despreza e ama quem o maltrata.

George Sand, in 'Diário Íntimo'

Anónimo disse...

Caro Zé

O assunto mereceria mais algum cuidado,ou espaço narrativo, uma vez que se levantam tantas e espinhosas questões.

Quanto ao 3/2008, é um ninho de vespas que mereceria, só por si, um estudo sério e dedicado sobre como transformar uma boa intenção numa coreografia para impressionar as famílias e fintar as estatísticas.

A operacionalização do 3/2008 é um autêntico filme de terror, mas em muitas escolas existem de facto NEE a mais, no sentido em que se empurram alunos com dificuldades de aprendizagem para a "twilight zone", com muita ligeireza, sobretudo porque não se activam as outras hipóteses de apoios que implicam maior esforço e disponibilidade dos professores.

A "dislexia" e a "hiperactividade" são diagnosticadas à toa, os apoios fora do 3/2008 mantêm-se, apesar de tudo, através de esquemas e as famílias apostam nos "direitos" independentemente das necessidades concretas.

A tão falada "taxa de prevalência" é um expediente burocrático que infelizmente tem alguma razão de ser, uma vez que na maioria das escolas ninguém controla com rigor a entrada dos alunos no 3/2008.Mas a verdade é que ninguém leva isso a sério e os apoios são decididos, muitas vezes, na base das pressões e não das reais necessidades. Basta dizer que não existem listas nominais para os apoios, o que favorece o tráfico de influências e a confusão.

A falta de formação dos professores, mesmo dos de EE, é algo de chocante, a desresponsabilização é inquietante e a guetização dos alunos com NEE na escola pública é, em muitos caos, mais perversa do que a verificada nas instituições particulares.

Em resumo, existem recursos humanos especializados suficientes, mas estão a ser desbaratados num processo mal gerido e ainda pior estruturado, pela simples razão de que ninguém está verdadeiramente preocupado em organizar e desenvolver um sistema integrado de respostas aos alunos com NEE, assente no rigor e na transparência.

Zé Morgado disse...

Caro anónimo,

A realidade que descreve, lamentavelmente, não é um filme de terror, é algo que se passa nas nossas escolas apesar do empenho e profissionalismo de muitos profissionais. E é tão complexa que, obviamente, não cabe este espaço, um blogue não "especializado" nestas questões, trata-se apenas de chamar atenção para uma realidade pouco falada do nosso sistema educativo.