sexta-feira, 5 de julho de 2013

ESCOLA A TEMPO INTEIRO OU EDUCAÇÃO A TEMPO INTEIRO

Segundo a imprensa e contrariamente ao contido no Despacho que "estabelece os princípios orientadores da organização e da gestão dos currículos dos ensinos básico e secundário”, a possibilidade de redução do tempo horário semanal que os alunos do 1º ciclo, menos uma hora por dia, entre horário lectivo e Actividades de Extensão Curricular, o MEC garantiu que as escolas do 1º ciclo, continuarão a funcionar entre as 9h e as 17h30 no próximo ano lectivo.
Esta referência ao tempo de permanência dos alunos mais pequenos nas escolas, para além de mais um exemplo da confusão de orientações e determinações do MEC, leva-me a retomar algumas notas sobre esta matéria.
O alargamento progressivo do tempo de estadia nas escolas dos alunos do 1º ciclo (mas não só) procurou responder a um problema importante das famílias, a guarda das crianças após as actividades lectivas dados os horários e estilos de vida das famílias.
O caminho escolhido, um programa designado “Escola a Tempo Inteiro”, como repetidamente tenho afirmado, assentou numa espécie de pecado original, um enorme equívoco, a confusão entre Escola a tempo inteiro e Educação a tempo inteiro. Acresce a este programa que, por “antecipação” ou “prolongamento” previstos num dispositivo designado por “Componente de Apoio à Família”, as crianças podem ainda chegar mais cedo às escolas, às 8h ou ficar até mais tarde, às 19 horas.
Na verdade e para além do subaproveitamento do muito que nesta matéria era já realizado, por exemplo, através de ATL(s) a funcionar no âmbito de parcerias com as Associações de Pais e de muitas instituições sociais e que nos últimos temos tem vindo a retomar-se, criaram-se respostas que por falta de regulação e orientação e recursos adequados transformaram a escola numa “overdose” asfixiante para muitos miúdos.
Em termos práticos, conheço muitas situações em que:
- A dificuldade óbvia e esperada de encontrar recursos humanos com experiência e formação em trabalho não curricular com crianças dos 6 aos 10. Este obstáculo acaba por resultar na réplica para as crianças de aulas e actividades pensadas para pré-adolescentes e adolescentes. O benefício imediato é quase nulo e a consequência a prazo poderá ser a desmotivação, no mínimo.
- O modelo de organização do trabalho, sendo desenvolvido por professores ou outros elementos desconhecedores do modelo de funcionamento do 1º ciclo, mostra-se, com frequência, completamente desajustado. Como exemplo real, refiro o horário de um grupo de 1º ano (crianças com 6 anos): trabalham com a professora da turma das 9h às 12 e das 13 e 15 às 15 e 15, e todos os dias têm a seguir dois ou três tempos de 45 minutos até às 17 e 30 ou 18.
Verificamos assim que as crianças estão envolvidas em tarefas de natureza escolar durante um tempo que nestas idades se torna completamente excessivo e contraproducente.
Quero sublinhar que o que me parece errado não é o tempo em que as crianças se envolvem em trabalho e que estão na escola, mas sim a natureza desse trabalho, "disciplinarizado", ou seja, organizado por tempos, de forma rígida e ocupado com conteúdos e tarefas não compatíveis com crianças deste escalão etário.
Este quadro ilustra, creio, o equívoco a que me referi. Em vez de tentarmos estruturar um espaço que seja educativo a tempo inteiro, preenchido na escola ou em espaços e equipamentos da comunidade, com qualidade, assistimos à definição de uma pesada agenda de actividades que está a motivar situações de relação turbulenta e reactiva com a escola. Alguns pais têm optado por retirar (quando e se podem) os seus filhos deste tipo de actividades.
A possibilidade de optarem por ATLs que tem vindo a retomar-se parece-me de sublinhar, importando, evidentemente, não esquecer dispositivos de regulação da qualidade do trabalho realizado, sendo mais importante o que se realiza do que o tempo da estadia que provavelmente decorre dos custos económicos de a manter e, naturalmente, das necessidades e recursos das famílias.

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