segunda-feira, 23 de novembro de 2009

O HOMEM QUE FALA SÓ

A maioria das pessoas daquele bairro conhece-o, o Homem que fala só. Conhecem-no exactamente por esta característica, fala só. No café à frente de um chá e de um livro ou de um jornal, no jardim, se o tempo o permite, ou mesmo quando deambula pelas ruas para desenferrujar o corpo, o Homem mantém consigo mesmo animadas conversas. Apenas se dirigia a outras pessoas para o indispensável do dia a dia e logo retornava á conversa consigo.
Claro que a generalidade das pessoas o achava esquisito, por assim dizer, na verdade em voz mais baixa pensavam que o juízo do Homem estava um bocado abalado, ninguém passa o tempo a falar só. Quando ele entrava em algum espaço as pessoas calavam-se e ficam discretamente a olhar e a ouvi-lo e depois comentavam como era triste alguém comportar-se assim, perder o juízo.
As pessoas não percebiam que o Homem se foi cansando de falar com pessoas que só têm certezas, não conversam com os outros, afirmam as suas ideias, gostos ou opiniões e nem sequer estão muito interessadas no que os outros têm a dizer pois bastam-se a si próprias. Não percebiam que o Homem continuava cheio de dúvidas sobre o que lia e ouvia pelo que discutia consigo mesmo essas dúvidas. E quanto mais lia, ouvia e discutia, mais dúvidas tinha pelo que mais discussões continuava a manter consigo mesmo.
As pessoas sem juízo são assim, estão sempre cheias de dúvidas.

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