sexta-feira, 26 de dezembro de 2025

METEU-SE O NATAL E AGORA METE-SE O ANO NOVO

 E é assim. Meteu-se o Natal e agora mete-se o Ano Novo.

Os dias que medeiam entre o Natal e o Ano Novo têm, do meu ponto de vista, um conjunto de características muito particulares. Fico sempre com a sensação de que os percebemos como não dias. Pode parecer uma ideia estranha, mas vou tentar explicar.

Logo depois do Natal, ainda a recuperar do espírito natalício, entramos numa espécie de ressaca advinda da azáfama das prendas, dadas, recebidas ou sonhadas e da culpa resultante dos excessos. Acresce para muita gente o problema das trocas, ou porque já tinham o que receberam ou porque, por várias razões, não serve o que receberam.

Para que se não saia dos espaços comerciais o ânimo irá recuperar-se entrando de imediato na época de saldos, descontos, promoções ou outra qualquer designação apelativa a mais umas compras. Trata-se do efeito terapêutico do mercado e do consumo.

Deste estado, passamos para os dias de aproximação ao Ano Novo que, independentemente do que de menos bom possamos racionalmente esperar, vivemos com a esperança de que seja mesmo novo e, sobretudo, Bom. Este ano, mais do que nunca, queremos, precisamos, que o próximo seja melhor.

Iremos certamente trocar inúmeras mensagens e votos noutra azáfama que aparenta assentar numa ideia mágica dos tempos de miúdo que nos parece fazer acreditar em que se assim procedermos, o Ano Novo vai ser mesmo Novo e, repito, Bom. De tanto falarmos nisso pode ser que ele se convença de que terá de ser mesmo Bom.

É certo que de há uns tempos para cá, como devem ter dado por isso, foi desaparecendo o Próspero, basta que seja Bom, ou até mesmo que não seja pior do que o que acaba. Já era bem bom, por assim dizer, mas não chega, o ano que acaba foi mau, muito mau, para muita gente.

É também muito provável que nos últimos dias do próximo Dezembro, o de 2026, e mesmo que como precisamos e desejamos ele tenha sido melhor que 2025, estaremos com o mesmo sentimento a enunciar os mesmos discursos apesar das promessas optimistas de que ... a coisa está a mudar.

A passagem deste ano como também não podia deixar de ser vai acontecer e múltiplas formas e cenários, com ou sem réveillons, mas, naturalmente com aquela alegria a que nos sentimos obrigados ou que genuinamente sentimos a cada noite de 31 de Dezembro para 1 de Janeiro.

O problema mais sério é que a 2 de Janeiro está aí o Ano Novo que, para muita gente, vai continuar velho e para muita outra gente não será Bom, longe disso.

Mas para um povo sereno e de brandos costumes como nós, esperemos que haja saúde que é o principal, como sabemos.

De resto, bom de resto … algum jeito se há-de dar.

Bom Ano. De forma mais modesta, o melhor ano possível.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2025

BOM NATAL

 A mensagem de sempre. Bom Natal. Dos simples. Com Tempo, com Afecto.

 


 O presépio que as mãos do Simão modelaram com alguma ajuda das mãos do Tomás e dos avós no apoio.




 

terça-feira, 23 de dezembro de 2025

OS PRESENTES DE NATAL. E OS FUTUROS?

 Hoje durante a manhã precisei de ir ao espírito natalício, perdão ao Almada Fórum, em busca de uns livros ainda em falta. Por estes dias todos os caminhos levam ao Almada Fórum, o grande centro comercial aqui da zona. Estão bem preenchidos como se diz na linguagem das rádios sobre o trânsito. Felizmente, ainda ando de mota.

Como é habitual o espírito natalício será inevitavelmente marcado pelos presentes oferecidos, sobretudo aos mais novos.

Os presentes assumem, em particular nesta época uma importância óbvia e de natureza diversa, sublinham afectos ou aquietam consciências, por exemplo.

No entanto e no que que respeita aos mais novos continuo convencido de que a questão essencial não tem a ver com os presentes que podemos ou lhes queremos dar, mas com os futuros que preparamos para lhes oferecer, esses sim, verdadeiramente importantes.

Bom, daqui a pouco vou ver se preparo uns presentes para os meus Netos. Quanto aos futuros … também vou ajudando como posso, faz parte do mundo mágico da Avozice.

Bom Natal.


 

segunda-feira, 22 de dezembro de 2025

O PAI NATAL NÃO EXISTE. OU EXISTE?

 Estamos a chegar ao Natal. Como é habitual nesta época são múltiplos os trabalhos na imprensa em que se aborda a relação que os mais novos têm com o Natal e, sobretudo, com o Pai Natal, as crenças e a magia do tempo. Ao longo dos anos colaborei em alguns destes trabalhos.

Ainda é frequente ouvirmos crianças afirmar convictamente que acreditam no Pai Natal, bem como pais que, conforme as suas convicções, alimentam ou desincentivam a crença no Pai Natal.

No entanto, deixem-me afirmar com toda a certeza. Os miúdos acreditam no Pai Natal e não numa mentira, como por vezes se ouve de gente menos atenta. Eu tenho a certeza, já fui Pai Natal e vi, senti, como eles acreditavam em mim, isto é, no Pai Natal. Recupero duas histórias pessoais.

Nunca percebi muito bem porquê, mas ao longo da minha vida desempenhei várias vezes a função, sempre fora do contexto familiar. A escolha dever-se-ia, provavelmente, à proeminente mochila que carregava à frente, agora um pouco mais pequena, felizmente, e às barbas brancas que de há muito me acompanham.

Não pensem que é uma tarefa fácil, não é não senhor. Passar umas horas dentro de um fato quentíssimo com umas barbas ainda mais quentes que insistem em deixar a boca cheia de pêlos não é muito simpático. Mas os miúdos acreditam no Pai Natal e isso ajuda a aliviar o desconforto. Felizmente, naquela altura ainda não tinham inventado os Pais Natais que sobem às varandas, caso assim fosse desistiria mesmo, sou um rapaz demasiado pesado para o alpinismo, dado a vertigens sendo ainda que as noites são demasiado frias para que se possam passar pendurado na varanda de cada um.

Numa dessas das vezes em que fui Pai Natal de serviço, há já muitos anos na instituição em que então trabalhava e cena de que ainda possuo uma memória perfeita, lembro-me do ar aflito e preocupado de um gaiato, filho de um colega, que insistiu o tempo todo junto de mim para que não me esquecesse do que queria como presente, Moto Ratos, creio que se tratava de umas personagens de banda desenhada em voga na altura.

E o miúdo, sempre que me lembrava os Moto Ratos e fazia-o sempre que comigo se cruzava tal era o desejo, explicava-me com os olhos muito abertos e com muitos gestos como se ia para casa dele para eu não me enganar no caminho. E não me enganei, Pai Natal que é Pai Natal cumpre sempre. Confirmei depois que ele recebeu os desejados Moto Ratos, claro, o Pai Natal não falha e o pai dele também não.

Ainda uma outra história, esta cá de casa que já aqui contei. Também por esta altura perguntei ao meu neto Pequeno, o Tomás, na altura com cinco anos de sabedoria e descoberta, qualquer coisa sobre os presentes que esperava ter  e ele afirmou da forma convicta que nele era e é habitual.

“O Pai Natal não existe.”

Pensei para comigo, acabou-se a magia, mas procurei certificar-me.

Então achas que o Pai Natal não existe?

“Não, é um homem que anda numa camioneta com uma escada a entregar as prendas nas casas”.

Ficámos por aqui, a magia ainda existia.

Deve ser bom acreditar no Pai Natal. Aliás, deve ser bom acreditar. Por isso, nos vários trabalhos em que tenho colaborado vou afirmando, deixem as crianças acreditarem no Pai Natal até que queiram ou que precisem. Não lhes roubem o encanto em nome de um qualquer conjunto de pseudo-modernices educativas.

Vão ter o resto da sua vida para acreditar e desacreditar, para desacreditar e voltar a acreditar.

Provavelmente, numa busca incessante pelo encanto perdido quando descobrimos que o Pai Natal não existe.

domingo, 21 de dezembro de 2025

QUE QUERES SER QUANDO FORES VELHO?

 Ontem na ida habitual à vila e à volta da bica houve tempo para umas lérias com um amigo. É avô há pouco tempo e inevitavelmente para quem tem netos, estes foram tema de conversa e às tantas chegámos a um caminho que não sabíamos andar, nos tempos que correm o que irá ser a vida deles quando forem grandes?

Claro que não temos resposta para isso e … ficámos por aqui com votos de boas festas.

Já depois, lembrei-me de há já alguns anos e a propósito do inevitável “que queres ser quando fores grande” escrevi por aqui uma história em sentido diferente, “que queres ser quando fores velho?”

Dizia assim:

Não, não é engano, é mesmo isso que queria escrever, não era que queres ser quando fores grande. Esta formulação talvez seja a pergunta que mais vezes é feita a miúdos e adolescentes. Acontece que os miúdos e adolescentes chegam a grandes e boa parte não são o que responderam à inevitável pergunta que tantas vezes lhes fizeram. É curioso que a partir daí, estranhamente, ninguém mais pergunta ou se inquieta com o que um grande quer ser quando for velho. Acresce que hoje, felizmente, cada vez mais os grandes chegam a velhos.

Já sendo grande há uns bons anos e estando mesmo à beira da velhice, interrogava-me há pouco sobre que quero eu ser quando for velho.

Bom, gostava de ser velho, ou seja, existir enquanto velho, com a minha companheira de sempre e com a qualidade de vida física funcional e com capacidade para a lida ainda que ajustada ao peso dos anos.

Costumo dizer que um dos privilégios da velhice é ter histórias para contar por isso gostava de poder contar histórias. Gostava de contar histórias aos netos e a outra gente mais nova, já não para ensinar, ensinar é tarefa para grandes, pais e professores, não é para velhos, mesmo professores velhos. As histórias dos velhos são para ouvir e conversar, não são para ensinar.

Outro privilégio que a velhice traz é assim uma espécie de inimputabilidade, podemos dizer e fazer coisas estranhas que as pessoas aceitam e dizem de forma condescendente, é velho, às vezes até acham graça. Deve ser bom poder dizer e fazer, quase, o que nos vem à cabeça. Quando for velho quero ser assim.

Quando for velho quero ter o tempo, não o tempo do dever, mas o tempo do querer, embora acredite que quando se é velho o tempo parece mais pequeno. Também gostava que os que foram pequenos ao pé de mim fossem permanecendo por perto mesmo que, eventualmente, longe.

Não parece assim grande coisa, mas eu acho que os velhos só ligam ao essencial."

 

Agora que cheguei a velho … estou a ser, até ver, o que gostava de ser quando chegasse a velho. Não, não é perfeito, o mundo está demasiado feio para que não nos inquietemos. Não pensei que com o que vivemos e demos por adquirido os tempos assim seriam.

No entanto e apesar disso, sinto-me um homem, um velho, com sorte.

sábado, 20 de dezembro de 2025

A GENEROSIDADE DAS OLIVEIRAS

 Chegou o frio ao Alentejo e anuncia-se a chuva lá mais para o fim da tarde. Está um tempo cabaneiro que convida estar na cabana ao lume. Eu aceitei o convite, estou de volta destas notas com um olho na chama da salamandra e como sabe bem esta companhia.

Nos tempos crispados e duros em que todos os dias conhecemos as dificuldades que modelos de desenvolvimento, políticas públicas e sistemas de valores nos estão a criar, ainda sabe melhor estar no Meu Alentejo. Lembro-me até da moda da terra que diz "Quando um homem está sozinho no seu monte, bem no meio da natureza, escutando a água a entoar na fonte, é dono de uma riqueza". Felizmente não estou sozinho, o aconchego ainda é maior.

Há pouco dei uma volta pelo monte para desentorpecer as pernas que a lida hoje não é pesada e sempre vou olhando para as oliveiras, árvores que considero das mais bonitas, especialmente aquelas com muitos séculos e que já levam um tronco que dois homens não abraçam. Admiro a sua generosidade.

Começam por dar as azeitonas que se comem em três variantes, pisadas, retalhadas e de conserva, qual delas a mais saborosa. Depois dão o azeite, a alma do comer bom, e como tem alma o azeite do Meu Alentejo.

Para além da azeitona e do azeite, a oliveira ainda é a mais calorosa das árvores, sempre a aquecer-nos. Aquece-nos quando maldosamente a varejamos para nos dar a azeitona, aquece-nos quando lhes tiramos os pés de burro e limpamos ramos e troncos para assegurar a sua renovação e ainda nos aquece quando arde no lume de chão ou na salamandra nos dias e noites longas do Inverno que amanhã chega.

Finalmente, esta generosa capacidade de dar vive numa escala incomensurável para nós, dura séculos.

São tão bonitas e generosas as oliveiras.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2025

"TRANCADOS NUM ECRÃ"

 Estamos em período de férias de Natal com os mais novos em casa. Com mais tempo disponível e livres da proibição escolar de uso do telemóvel, para muitos será uma tentação a sua utilização como forma de ocupar o tempo.

A experiência diária e, como agora se diz, a evidência, mostram de forma cada vez mais clara como o excesso de tempo que crianças e adolescentes (mas não só) passam “trancados” em ecrãs têm impacto negativo no seu bem-estar e saúde mental, no desenvolvimento de competências e capacidades cognitivas, sociais e emocionais e, naturalmente, na aprendizagem. São conhecidos muitos exemplos de situações graves ocorridas no contexto de utilização das redes sociais.

Em muitos sistemas educativos e também por cá, têm surgido iniciativas, sobretudo nos espaços escolares, no sentido de minimizar esse tempo incluindo a redução da utilização dos recursos digitais na aprendizagem, sobretudo em particular com os mais pequenos.

Certamente mais difícil será a mudança nos contextos familiares e comunitários. O próprio comportamento dos adultos não parece favorável a esse trajecto de mudança.

O próprio comportamento dos adultos não parece favorável a esse trajecto de mudança. Creio, aliás, a absoluta desregulação da utilização por parte dos adultos será um enorme obstáculo à auto-regulação por parte dos mais novos. Como já aqui contei, lembro-me de estar numa conversa com pais de crianças no básico a falar sobre esta questão e referir as orientações das associações de pediatria oftalmológica relativas ao tempo aceitável de exposição a ecrãs em diferentes idades. Um pai comentou, "são opiniões". Pois, o problema é esse mesmo, as opiniões.

Na verdade, é clara a dificuldade de mudança dos comportamentos, independentemente dos discursos de concordância com a preocupação ou a expressão de dificuldades.

Não sou apologista de estratégias essencialmente proibicionistas, mas sim do incremento de comportamentos de auto-regulação ajustados às diferentes idades.

No entanto, com alguma frequência se alimenta o equívoco de que não proibir significa a ausência de regras e limites. Do meu ponto de vista, a proibição por vezes necessária não invalida a um trajecto de auto-regulação sempre mais consistente.

É o bem-estar dos mais novos e a qualidade global dos processos educativos que estão em jogo.

É uma questão demasiado importante.


quinta-feira, 18 de dezembro de 2025

AS PESSOAS SEM-ABRIGO

 É claro que não é por muito falar dos problemas que eles se resolvem ou minimizam. No entanto, também me parece que não insistir pode contribuir para uma menor atenção a situações muito séria e atentatórias dos direitos das pessoas. É o caso das pessoas em situação de sem-abrigo, uma situação que nos deveria envergonhar como comunidade, sendo o desemprego e a precariedade laboral as principais causas. Talvez esta dado seja de ter em conta na discussão em aberto relativa à alteração das leis laborais.

Assim, voltemos a insistir.

Dados da Estratégia Nacional paraa Integração de Pessoas em Situação de Sem-Abrigo (ENIPSSA), hoje divulgados referem a existência de mais 14.400 pessoas estavam em situação de sem-abrigo no final de 2024. Verifica-se um aumento 1348 casos de pessoas nesta situação.

Em Lisboa e no Porto a situação mais prevalente é situação de sem-abrigo entre um ano e menos de cinco. No Algarve 36% das pessoas vivem nesta situação há um ano ou menos e em 29% dos casos este período é desconhecido o tempo em que estão sem-abrigo.

É de registar que em 2024 se regista que 1345 pessoas deixaram a situação de sem-abrigo, a maioria na região Norte, 444, e na Área Metropolitana de Lisboa, 314. É uma subida relativamente aos dados de 2023, 987 pessoas que deixaram de estar na situação de sem-abrigo.

No entanto, parece-me que não devemos esquecer que continua a ser muito grande o mundo dos sem-abrigo. São muitos, demasiados, os sem-abrigo do mundo, boa parte integra aquela percentagem que a sondagem nunca mostra de que fala Sam The Kid.

São muitos, os sem-abrigo num porto que os acolha, uma casa, uma família, um espaço a que dêem vida e que lhes apoie a vida.

São muitos, os sem-abrigo, mesmo com família ou em instituições.

São muitos, os sem-abrigo no afecto, nos afectos, sem um coração que os abrigue.

São muitos os sem-abrigo em escolas onde não cabem.

São muitos, os sem-abrigo em mundos que não são seus. São muitos, os sem-abrigo em culturas que não entendem e que não querem entendê-los.

São muitos, os sem-abrigo num corpo que seja aconchego para o seu corpo.

São muitos, os sem-abrigo em valores que cada vez mais parecem predominar e que não os reconhecem.

São muitos, os sem-abrigo em vidas que lhes não pertencem, mas carregam. São muitos, os sem-abrigo no aceder e no gostar das coisas de que a vida também se tece.

Como referi, muitos destes sem abrigo vivem à nossa beira, sem-abrigo, não contabilizados, nem contabilizáveis.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2025

PALAVRAS (MAL)DITAS

 Aos 71 anos e ligado à educação desde que entrei na escola aos seis anos já não é fácil sentir-me surpreendido, mas a verdade é que, recordando Sá de Miranda, "M'espanto às vezes, outras m'avergonho".

Ontem, no final da apresentação do novo modelo de acção social para o ensino superior, o Ministro da Educação, da Ciência e da Inovação afirmou o seguinte: “Quando nós metemos pessoas quesão basicamente todas de rendimentos mais baixos a beneficiar de um serviço público, nós sabemos que o serviço público se deteriora, é assim nos hospitais, é assim nas escolas...”. Assim mesmo!

Posteriormente tentou compor como é habitual, mas foi que disse, palavras mal ditas o que faz parecer que o Senhor Ministro está a perder a aura. Na verdade, lembrando Ettore Scola no imperdível “Feios, porcos e maus” o Senhor Ministro associa com clareza a baixa condição social e económica dos estudantes ao estado degradado das residências universitárias. Não pode!

Umas notas breves de um não especialista sobre a questão da comunicação, sobretudo das lideranças políticas.

A primeira questão é exactamente essa, o peso social do mensageiro condiciona o conteúdo da mensagem, ou seja, a mesma frase não tem o mesmo valor afirmada por um cidadão comum ou proferida por uma figura com responsabilidades de decisão, neste caso em matéria de cultura e políticas públicas nesta área. Aliás, trata-se do ministro da Educação.

Pode sempre afirmar-se que haverá alguma razão nas afirmações ou que a intenção não traduz o valor facial das afirmações que toda a gente ouve não podem deixar de ser analisadas e levadas em consideração.

Quanto à intenção, a sua não existência, e até posso esforçar-me por acreditar que não exista, não colhe, é mesmo uma afirmação inaceitável.

É verdade que numa certa altura do desenvolvimento dos miúdos, o seu desenvolvimento moral e intelectual leva-os a considerar que a sua não intenção de realizar algo, desculpa o que aconteceu, tal entendimento traduz-se no frequente "foi sem querer" e como "foi sem querer", não tem problema.

Neste patamar, não funciona o "foi sem querer" e não podemos dizer a primeira "coisa que nos passa pela cabeça".

A questão é que as lideranças, as que verdadeiramente lideram, apesar de não possuírem, felizmente, o dom da infalibilidade e da perfeição, não podem, não devem proferir determinadas palavras e persistirem teimosamente na sua afirmação.

Trata-se de mais um exemplo de palavras (mal)ditas que ao longo dos anos têm sido proferidas por muita gente dos vários quadrantes políticos e áreas de intervenção.

terça-feira, 16 de dezembro de 2025

TEMPO DE NATAL, UMA SUGESTÃO DE PRENDA

 Estamos perto do Natal que, apesar dos dias duros e estranhos que muitos de nós não esperaríamos viver, traz dentro de si uma inevitável questão, os presentes de Natal. O tempo de Natal é habitualmente um tempo de frio, a que as dificuldades de muita gente ainda retiram calor e muitas outras pessoas, mais velhas e mais novas, nem sequer têm Natal.

No entanto, Natal é Natal e boa parte de nós sente, deseja, precisa, de dar presentes pensando sobretudo nos miúdos que, em particular os mais pequenos, ainda mantêm uma relação quase mágica com este tempo. Sorte a deles.

A escolha dos presentes nem sempre é uma tarefa fácil e os constrangimentos económicos poderão limitar a disponibilidade e dificultar a escolha.

Quando os destinatários dos presentes são os miúdos a coisa complica-se pois, para além dos eventuais custos, acontece com frequência pensarmos que as crianças já têm tudo o que nem sequer é ajustado, porque na verdade, muitas crianças a que nada parece faltar, sentem muitas precisões de que nem sempre nos damos conta.

Nos últimos anos parece notar-se nos discursos das pessoas alguma preocupação com a utilidade das prendas, minimizando a compra de coisas ou bens mais supérfluos e escolher o que possa ser de maior utilidade. Talvez seja mais um desejo que uma realidade.

Neste contexto e conhecendo o que se vai passando no universo dos miúdos, gostava de sugerir, perdoem o atrevimento, um presente de Natal pensando neles, mas que me parece também interessante para muitos dos mais velhos. Aliás, faço esta sugestão com regularidade.

Trata-se de algo que parecendo não ser muito fácil de encontrar, também não é assim tão difícil, se quisermos encontramos.

É um bem que pode assumir diversos tamanhos, podemos oferecer a quantidade que acharmos por bem e não carece de manual de instruções, pois não é muito sofisticado o seu uso. Creio que é um presente que, para além de ser bonito, é bastante útil podendo ser usado das mais variadas formas, em diferentes ocasiões e sempre com agrado.

Apresenta também a vantagem de corresponder a uma enorme necessidade, raramente se encontra alguém que não se queixe da sua falta pelo que oferecendo este presente estamos, para além de expressar o afecto que sentimos pelas pessoas a quem oferecemos, a contribuir com algo de verdadeiramente necessário e, como já disse, útil.

Creio que os mais pequenos vão gostar mais deste presente do que de muitos dos jogos e brinquedos com que frequentemente são submersos, muitas vezes a mascarar algum desconforto nosso, adultos com pouco tempo para lhes dar e que, às vezes, sem nos darmos conta compensamos com presentes.

Por outro lado, os mais crescidos que receberem tempo também se sentirão bem, todos nós gostamos de um "tempinho" para nós vindo que quem anda à nossa beira.

Na verdade, acho que poderia ser mesmo uma boa ideia oferecer tempo às pessoas. É isso, este Natal podíamos poupar nos euros e oferecer tempo, tenho quase a certeza de que as pessoas vão gostar.

Bom Natal para todos. Com tempo.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2025

DO BRINCAR NA RUA (outra vez)


Não é o melhor dos dias para abordar  esta questão, mas ...

No Público encontra-se uma peça centrada no desenvolvimento de actividades de crianças em ambientes naturais. No âmbito de uma iniciativa, a associação Movimento Bloom que tem uma escola, a Escola da Floresta Bloom, no Parque Natural de Sintra-Cascais, onde crianças de diferentes escolas desenvolvem actividades ou são desenvolvidas actividades nas próprias escolas orientadas para o mundo natural.

Como dizia o José Afonso, seja bem vindo quem vier por bem e é importante este tipo de iniciativas, mas a questão é que mudanças nas políticas públicas de educação, do ambiente, do urbanismo e habitação, etc. pouco efeito terão e não estou a minimizar o que de positivo pode trazer às crianças envolvidas, antes pelo contrário.

A qualidade de vida das comunidades e das crianças em particular beneficiaria se fosse promovido nas zonas urbanas a criação de espaços seguros para as crianças brincarem no exterior considerando a importância que que terá para o seu bem-estar e desenvolvimento. Lembro sempre o trabalho incansável do Professor Carlos Neto, com quem muitas vezes me cruzei, na defesa do brincar na rua.

Muitas vezes aqui tenho abordado esta questão e volto a insistir nessa importância e como, do meu ponto de vista, brincar é a actividade mais séria que as crianças realizam, nela põem tudo quanto são e constroem a base de tudo o que virão a ser. Para que o brincar na rua seja possível e seguro exige-se que as políticas públicas tornem os espaços urbanos mais amigáveis para os mais novos. Em muitos países e também por cá, felizmente começam a surgir iniciativas nesse sentido.

Com as alterações nos estilos de vida e as opções em matéria de organização do trabalho, muitas crianças têm a vida preenchida por um tempo significativo de estadia na escola (até lhe chamam Escola a Tempo Inteiro) e muitos pais recorrem ainda ao envolvimento dos filhos em múltiplas actividades transformando-as numa espécie de crianças-agenda. Todas estas actividades, a oferta é variadíssima, são percebidas como imprescindíveis à excelência, aliás, muitas crianças são educadas (pressionadas) para a excelência. Promovem níveis "fantásticos" de desenvolvimento intelectual e da linguagem, desenvolvimento motor, maturidade emocional, criatividade, interacção social, autonomia e certamente de mais alguns aspectos que agora não recordo. Assim, as crianças e adolescentes estão sempre envolvidos em qualquer actividade, a quase todas as horas pois delas se espera não menos que a excelência.

Nada disto esquece a importância que, de facto, podem ter algumas actividades, mas apenas sublinhar alguns riscos no excesso.

Os pais, alguns pais, seduzidos pela sofisticação desta oferta, pressionados por estilos de vida que não conseguem ou podem ajustar e com a culpa que carregam pela falta de tempo para os filhos e sem vislumbrar alternativas aceitam que os trabalhos dos miúdos se desenvolvam para além do que seria desejável, eu diria saudável.

Somos dos países da Europa em que adultos e crianças menos desenvolvem actividades no exterior contrariamente, por exemplo ao que se verifica nos países nórdicos. É verdade que esses países têm habitualmente climas bastante mais amenos que o nosso, mas, ainda assim, poderíamos ter durante mais tempo crianças e adultos a realizar actividades no exterior. Por princípio e sempre que possível, a área curricular Estudo do Meio, mas não só, poderia ser também Estudo no Meio.

Muitas experiências, incluindo em Portugal, sugerem múltiplos benefícios para as crianças, desenvolvem maior autonomia, maior consciência ambiental e competências em dimensões como bem-estar emocional, a partilha de emoções, a autoconfiança, auto-regulação, a criatividade ou o pensamento crítico para além, naturalmente dos benefícios mais directamente associados a qualquer actividade.

Embora consciente das questões como risco, segurança e estilos de vida das famílias, creio que seria possível alguma oportunidade de “devolver” aos miúdos o circular e brincar na rua, ter mais algum tempo as crianças fora das paredes de uma casa, escola, centro comercial, automóvel ou ecrã promovendo, por exemplo, níveis de literacia motora frequentemente aquém do desejável.

Como tantas vezes afirmo e escrevo, também neste espaço, o eixo central da acção educativa, escolar ou familiar, é a autonomia, a auto-regulação, a capacidade e a competência para “tomar conta de si” como fala Almada Negreiros. O brincar, o brincar na rua, a abertura, o espaço, o risco (controlado obviamente, os desafios, os limites, as experiências, são ferramentas fortíssimas de desenvolvimento, de literacia motora também, e promoção dessa autonomia.

Importa sublinhar a necessidade de controlar um eventual perigo que, ainda assim, é diferente do risco, as crianças também “aprendem” a lidar com o risco.

Talvez, devagarinho e com os perigos e riscos controlados, valesse a pena trazer os miúdos para a rua, mesmo que por pouco tempo e não todos os dias.

É, pois, importante que todos os que lidam com crianças, em particular, os que têm “peso” em matéria de orientação, pediatras, professores, psicólogos, etc. assumam como “guide line” para a sua intervenção a promoção do brincar. E a actividade de brincar na infância não se esgota, longe disso, numa disciplina curricular.

Os mais novos vão gostar e faz-lhes bem.

domingo, 14 de dezembro de 2025

DO MODELO DE GOVERNANÇA DA ESCOLA

 Na passada sexta-feira o Ministro da Educação e os secretários de Estado da Educação e da Administração e Inovação Educativa estiveram em reunião por videoconferência com os directores escolares para avaliação de 2025 e alterações para 2026.

 Entre outras questões, foi anunciada a criação do estatuto do director e a revisão do regime de gestão e autonomia das escolas que acontecerá no próximo ano.

Aguardemos pelo estatuto e olhemos o modelo de governança que muitas vezes aqui tenho referido carecer de alteração.  

Começo por uma referência a uma questão concreta verificada na situação actual e que deveria ser alterada, a gestão do limite de mandatos dos directores. Em Abril, uma peça do Público que qui comentei afirmava que durante este ano cerca de 200 directores deverão abandonar a liderança das suas escolas ou agrupamentos por cumprir 16 anos na função, quatro mandatos.

Existem muitas situações de directores que desempenham a função há bem mais que os 16 anos. Por outro lado, tal como noutros sectores, veja-se as candidaturas às autarquias, um director que está obrigado a terminar o tempo de liderança numa escola ou agrupamento pode candidatar-se a outro. Estava nessa situação, em trânsito, o professor Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas, que defende a ausência de limites de mandato e que, tendo estado nos últimos 30 anos na gestão do Agrupamento de Escolas Dr. Costa Matos, em Vila Nova de Gaia, foi eleito para a direcção do Agrupamento de Escolas D. Pedro I, também em Gaia. É assim, nada de novo, as leis em Portugal são basicamente indicativas, não imperativas. Não existindo o estatuto de director, agora outra vez prometido pelo actual Ministro, o director será sempre professor e, portanto, não é director, está como director. Provavelmente, alguns já não saberão como ser professor.

São recorrentes a divulgação e o conhecimento por parte de quem se move neste universo de inúmeras situações negativas envolvendo a direcção de escolas e agrupamentos como, também devemos registar e sublinhar também existem muitas situações que correm de forma positiva dentro do que se pode esperar num universo tão complexo como a educação.

Retomo algumas notas sobre a direcção de escolas e agrupamentos. O modelo de direcção unipessoal das escolas e agrupamentos e a forma como é desempenhado volta com regularidade à agenda incluindo o questionar do próprio modelo face a uma direcção colegial. Têm existido estudos de opinião e tomadas de posição individuais ou manifestos que alimentam a discussão ou mesmo a necessidade de alterar o modelo de direcção.

Como já tenho afirmado a propósito de outras matérias, talvez fruto do ambiente de fortíssima tensão que nos últimos anos envolve a educação, os debates e as ideias também tendem a ser crispados, com opiniões definitivas e sem margem de entendimento e, frequentemente, com agendas menos explícitas. O modelo de gestão das escolas será apenas mais um exemplo deste cenário.

Com o atrevimento de quem não vive por dentro o quotidiano das escolas, mas que nas últimas décadas tem, como profissional e como cidadão, acompanhado de forma atenta o universo da educação, recupero algumas reflexões que já aqui deixei e que continuam actuais. Levo também em conta a experiência de alguns anos de presença como elemento da comunidade nos Conselhos Gerais de dois agrupamentos da zona onde vivo.

Conforme tenho dito, sempre me pareceu claro que a transformação da direcção de escolas e agrupamentos num modelo unipessoal e a sua forma de eleição através dos conselhos gerais, acompanhada por uma política de mega-agrupamentos diminuindo substancialmente o número de unidades orgânicas, gosto desta designação, se inscreveu na sempre presente tentação de controlo político do sistema. A experiência tem vindo a evidenciar essa situação.

São conhecidos casos, alguns chegam à imprensa, de processos de eleição de direcções escolares que mais não são do que formas de colocar pessoas com o alinhamento certo na função. Aliás, o próprio funcionamento dos Conselhos Gerais é, em algumas situações, um exemplo disto mesmo. Assim sendo, o modelo de gestão unipessoal e a forma de eleição dos directores não são garantias de “mais democracia” ou “melhor democracia” nas escolas.

Dado um pecado estrutural do nosso sistema educativo, a ausência ao longo de décadas de dispositivos eficientes de regulação, coexistem boas experiências e práticas em situações de direcção unipessoal com situações bem negativas.

Por outro lado, importa recordar que, em muitas circunstâncias, também a “gestão democrática", de democrática não tinha assim tanto e também se verificavam casos gritantes de menor competência.

Dito isto, parece-me que tanto quanto ou mais do que o modelo de direcção, unipessoal ou colegial, julgo de reflectir a forma de eleição, participam todos os docentes ou um pequeno grupo que “representa” o corpo docente no conselho geral, o mesmo se passando com os funcionários. É ainda de considerar a forma de participação de pais e autarquias no processo de eleição bem como de elementos da comunidade.

Por outro lado, também me parece que deve existir um claro reforço do papel dos Conselhos Pedagógicos no funcionamento de escolas e agrupamentos. Parece-me também clara a vantagem da presidência do Pedagógico ser claramente independente da direcção da escola, sobretudo num modelo de direcção unipessoal.

Importa também que a reflexão sobre a direcção de escolas e agrupamentos seja acompanhada de uma verdadeira reflexão sobre o quadro de autonomia nas suas várias dimensões e equilíbrios. Qual o efeito da municipalização ou “proximidade”, como também lhe chamam, na autonomia e funcionamento de escolas e agrupamentos e, mesmo na sua gestão.

É claro que quanto mais sólido for o modelo de autonomia das escolas mais importante se torna o papel e função da direcção, independentemente do modelo. Esta é do meu ponto de vista a questão central.

Muitos estudos e a experiência mostram que nas organizações, incluindo escolas, a qualidade das lideranças tem um impacto forte no desempenho, em diferentes dimensões, das instituições e também de todos os que nela funcionam. Boas lideranças escolares traduzem-se em melhores e mais estáveis climas de trabalho, maior nível de colaboração entre os profissionais, menor absentismo, melhores resultados ou menos incidentes de natureza disciplinar, ambientes escolares mais amigáveis em termos de educação inclusiva, melhor relação com pais e comunidade, entre outros aspectos. Como exemplo, em 2019 um estudo realizado pela Universidade do Porto da Universidade do Porto sugeria que o estilo de liderança dos directores das escolas tem um impacto importante na motivação dos professores pois existe uma “correlação significativa entre a forma como são geridos os estabelecimentos de ensino e a relação que os docentes têm com a sua profissão”.  Creio que o cenário não se terá alterado.

Camões já afirmava que um “fraco Rei faz fraca a forte gente” o que numa actualização republicana poderá entender-se como a defesa de lideranças competentes, com uma gestão participada, com mecanismos de eleição alargados, transparentes, escrutinados e com, insisto, mecanismos de regulação que previnam excessos e abusos.

Alguns episódios na contratação de docentes ou de funcionários e nos processos que envolvem técnicos e docentes, são exemplos em ter em conta pela forma negativa como foram geridos ou desencadeados por algumas direcções de escolas de escolas e agrupamentos.

Vamos ver como e quando conheceremos as alterações anunciadas e seja possível caminhar num contexto de estabilidade imprescindível ao trabalho de todos os envolvidos nas comunidades escolares.

sábado, 13 de dezembro de 2025

PAIS, ESCOLA, SUCESSO ESCOLAR E EDUCATIVO

 A newsletter semanal do Público tem como tópico de relevo esta semana a relação entre a escola e os pais e, naturalmente, da importância do nível e qualidade de comunicação.

Creio que é consensual a necessidade de que exista e seja positiva a relação entre pais e escola e é sempre oportuno reflectir sobre o papel e o contributo dos pais no sucesso educativo e escolar dos miúdos. Melhorar este papel e a relação dos pais com a escola não é tarefa fácil e não é problema resolvido em nenhum sistema educativo, apesar de em todos os sistemas existirem bons exemplos dessa relação e, naturalmente, entre nós também assim é.

Não é uma questão fácil e as alterações ainda mais difíceis da complexidade de variáveis implicadas.

Uma primeira questão com implicações relevantes remete para os estilos de vida modernos, sobretudo em zonas urbanas, a própria inerência das dificuldades, pela próre, por outro lado, perceber pela inerência das dificuldades, conteúdos curriculares e cultura escolar desconhecidos por muitos pais e encarregados de educação, solicitações e motivações presentes na vida dos miúdos, etc.

De qualquer forma parece inegável a necessidade de o envolvimento dos pais e a qualidade desse envolvimento para que o trajecto educativo dos miúdos seja mais positivo

É reconhecido o afastamento dos pais traduzido, por exemplo, na baixa participação em reuniões. Como causas referem-se as dificuldades em termos de legislação e horários laborais e também o menor empenhamento ou mesmo desinteresse.

Defendo de há muito que em sede de Concertação Social seria de avançar com propostas de alteração legislativa, sobretudo, na organização horária do trabalho que poderia, essa sim, ter impacto na disponibilidade dos pais. Não me parece impossível que em muitas profissões os tempos de trabalho pudessem ter outra distribuição permitindo mais tempo com os filhos e menos tempo destes na escola.

No entanto, julgo de considerar outros aspectos. Costumo afirmar que os pais, exceptuando os pais negligentes, que existem, e vão menos à escola ou não aparecem mesmo, se podem dividir em dois grupos, os pais que não alcançam a escola e os pais que a escola não alcança. Os primeiros são os que entendem consciente, ou inconscientemente, que a sua presença é irrelevante, não sabem discutir a escola, a escola é que sabe e decide sobre os filhos. Os outros, são os pais para quem o discurso produzido pela escola sobre os seus filhos os leva a afastarem-se progressivamente. A experiência mostra que quando as crianças são mais pequenas, pré-escolar 1º ciclo, os pais aparecem e começam a afastar-se sobretudo a partir do 2º ciclo, o que tem como razão principal o crescimento dos filhos o que, evidentemente, não explica esse afastamento.

Neste quadro, creio que se o desejo de maior envolvimento dos pais na vida escolar dos filhos for mais do que uma retórica, o sistema educativo, através dos modelos de funcionamento e recursos das escolas, deverá introduzir alguns ajustamentos.

Ajustamentos nas funções dos Directores de Turma e das condições de exercício da função pois são peças nucleares nos processos educativos e estão muitas vezes com demasiado tempo gasto em burocracia, criação de dispositivos com professores motivados, existem muitos, que possam ir ao encontro dos pais que a escola não alcança. Talvez da carga burocrática que rouba tantas horas de professores se pudessem recuperar algumas para outro tipo de trabalho não docente, mais útil e mais motivador.

Sabemos da situação crítica da falta de docentes que não se resolve de imediato e que os exercícios de “wishful thinking” também não ajudam. No entanto, existem tantas horas de professores adjudicadas a trabalho não docente, burocrático, e a iniciativas, projectos, experiências avulsas e descontextualizadas que seriam certamente mais úteis neste contexto, relação escola e pais

Mudança nas formas e suporte do contacto, relação, comunicação entre a escola e a família, por exemplo, repensar a tipologia e conteúdos das reuniões de pais. Será neste contexto que os recursos digitais podem ser úteis se utilizados de forma regulada, não tóxica.

Parece também importante a existência de estruturas de mediação entre a escola e a família o que implica a existência de recursos humanos qualificados e disponíveis.

Recurso concertado às Associações de Pais como mediadores entre a escola e os pais que não vindo à escola, também não são dos que integram as Associações.

O tempo é curto, os recursos são insuficientes, o clima não é o mais amigável, mas creio que pode ser possível ir um pouco mais longe na tentativa imprescindível de maior envolvimento dos pais na vida escolar dos miúdos, questão em mudança, sempre, e que obriga a uma contínua reflexão sobre os papéis, os processos e formas de envolvimento.

O risco da inacção é, por exemplo, dar asas ao que acontece, por vezes, com o funcionamento de grupos de pais no WhatsApp, por exemplo, que, frequentemente, se transforma em mais um problema.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2025

DEFICIÊNCIA E DIREITOS HUMANOS

 Foi divulgado há dias o relatório Pessoas com Deficiência em Portugal: Indicadores de Direitos Humanos 2025 realizado  pelo Observatório da Deficiência e Direitos Humanos, coordenado por Paula Campos Pinto. Vejamos alguns dados. Em sentido positivo, mantém-se uma trajectória positiva relativamente ao abandono escolar de pessoas com deficiência entre os 18 e os 24 anos, 18,2% em 2023, valor mais baixo que em anos anteriores.

De sublinhar também que mais estudantes com deficiência frequentam o ensino superior. Em 24/25 matricularam-se 5300 estudantes, mais 30,4% do que no ano anterior, 4063.

No entanto, mantemos indicadores preocupantes.

O trajecto após o secundário mantém-se difícil. Em 2024, 32,4% dos jovens com deficiência não trabalhavam nem estudavam nem frequentavam dispositivos de formação. Nos jovens sem deficiência o indicador é de 8,1%, uma diferença significativa, superior a 24%.

A taxa de emprego das pessoas com deficiência em 2023 era de 64,4% sendo que em situações de deficiência grave passava para 50,9%.

A diferença da taxa de emprego entre pessoas com e sem deficiência em 2024 era de 21,3%. Esta taxa estava em decréscimo até 2022 e voltou a subir.

Numa outra área crítica, condições sociais e económicas, 66,4% das pessoas com deficiência com mais de 16 anos estão risco de pobreza antes das transferências sociais, duas vezes mais que as pessoas sem deficiência. Considerando as transferências sociais a taxa baixava para 22,2% nas pessoas com deficiência e para 14,1% nas pessoas sem deficiência. Esta diferença tem-se acentuado.

Parece claro e preocupante que, apesar de alguma evolução, a situação das pessoas com deficiência continua com grande vulnerabilidade face à pobreza e exclusão.

Não é novo, sucessivos relatórios de diferentes entidades vão mostrando o quanto está por fazer e as dificuldades decorrentes da corrida de obstáculos em que se transforma a vida das pessoas com deficiência ameaçando os seus direitos e bem-estar bem como das suas famílias. São por demais evidentes as dificuldades em áreas como, educação, saúde, trabalho e emprego, segurança social, acessibilidades, autonomia, independência ou autodeterminação.

Repetindo-me, a voz das minorias é continua muito baixa, ouve-se mal, existem variadíssimas áreas em que são significativas as dificuldades colocadas às pessoas com deficiência, designadamente saúde, acessibilidades, educação, apoio social, qualificação profissional e emprego, em que a vulnerabilidade e o risco de exclusão continuam elevados como este relatório mostra.

Importa também sublinhar que os direitos fundamentais não podem ser de geometria variável em função de contextos ou hipotecados às oscilações de conjuntura ainda que tenhamos consciência da excepcionalidade destes tempos.

Parece necessário reafirmar mais uma vez que os níveis de desenvolvimento das comunidades também se aferem pela forma como lidam com os grupos mais vulneráveis e com as suas problemáticas. Este entendimento é tanto mais importante quanto mais difíceis são os contextos em que vivemos, os tempos actuais mostram discursos e comportamento hostis e agressivos face à diversidade, ameaçam quem é percebido como diferente como se existissem dois seres humanos iguais.

Mas, mais grave é que estes discursos começam a contaminar as políticas públicas dada a mediocridade de lideranças, e sustentam a negação de valores e culturas que dávamos como adquiridos.

Não passarão.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2025

QUEM QUER SER PROFESSOR?

 Retomo mais um dado do Estado da Educação 2024 divulgado pelo Conselho Nacional de Educação, agora respeitante aos professores.

No estudo realizado, 20% dos docentes admitem o abandono da carreira de professor.

Acresce que considerando o grupo abaixo dos 30 anos sobe para metade os que admitem o abandono da profissão. São dados que sublinham o alerta vermelho em que a educação está mergulhada há já algum tempo criando um contexto de mal-estar para os profissionais e de pouco capacidade atracção de novos docentes.

O estudo do CNE estima que na próxima década será necessário contratar em média 3800 docentes por ano o que configura um problema sério para as próximas gerações de alunos e para todos nós, sociedade.

Como muitas vezes aqui abordei, há décadas que a falta de docentes estava escrita nas estrelas e sucessivas equipas ministeriais, para além de más políticas públicas que afastaram milhares de professores das escolas negavam a evidência, ouvia-se o mantra dos “professores a mais”. Maria de Lurdes Rodrigues e Nuno Crato foram dois exemplos de incompetência e irresponsabilidade nesta matéria e nem um rasgo de seriedade no assumir do que é óbvio, falharam. Continuam serenos e de consciência tranquila, provavelmente, também com uma outra percepção, está na moda, do que é consciência tranquila.

O resultado está à vista, o atropelo a um direito fundamental, o direito à educação, e o desempenho escolar de muitos alunos prejudicado pela falta de docentes.

Apesar de algumas iniciativas recentes na tentativa de em muito curto prazo minimizar os problemas só uma abordagem estrutural pode ter potencial de mudança sustentada.

Nesta perspectiva, julgo absolutamente necessário que as políticas públicas de educação assumissem como um eixo nuclear a valorização da carreira docente, valorização dos professores.

É claro que mudanças estruturais têm custos pelo que será de considerar a necessidade de investimento sério em educação, 6% do Produto Interno Bruto o que está definido pela UNESCO como meta para 2030.

Só esta valorização pode tornar a carreira docente atractiva e com um potencial de retenção e satisfação dos que nela se integram.

Esta valorização passa, evidentemente, pela valorização salarial, mas importa considerar também dimensões como a definição de modelos de carreira e de avaliação justos, simplificados e transparentes e promotores de estabilidade.

Importa que a valorização dos professores resista ao risco de “deskilling” ou “desprofissionalização” através de mudanças nas exigências da habilitação para a docência.

Importa que se definam dispositivos de apoio ao exercício profissional em contextos mais exigentes que, por várias razões, se tornam pouco atractivos para profissionais em início da carreira ou para uma eventual mudança para quem já está integrado.

Importa que se desburocratize o exercício da docência com gastos brutais de tempo e esforço sem retorno pertinente. Sim eu sei, como dizia João dos Santos, que “mais difícil em educação é trabalhar de uma forma simples”, mas desburocratizar não é promover “facilitismo” é uma medida com impacto positivo em termos profissionais e pessoais.

Considerando o que acontece em muitos territórios educativos talvez seja de começar a olhar (reflectir) sobre o modelo de governança das escolas e agrupamentos que parece excessivamente dependente da competência de cada direcção criando assimetrias profissionais e climas institucionais menos favoráveis ao trabalho de alunos, professores e técnicos.

Julgo claro que mudanças neste sentido não são fáceis e que será sempre difícil um caminho de concordância generalizado, mas também tenho a convicção de que medidas conjunturais, mais positivas ou menos ajustadas, concebidas por ciclos políticos continuarão, apesar, de alguns ajustamentos, a “mexer” na conjuntura e a não alterar substantivamente a estrutura que alimenta … as conjunturas.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2025

NÃO É O DESTINO

 O CNE publicou o Estado da Educação 2024, o habitual retrato do nosso sistema educativo. Sem surpresa, continua a verificar-se uma associação forte entre insucesso ou baixo desempenho escolar e contexto familiar social e económico.

Lamentavelmente, nada de novo.

Também não é novo "aceitar" que a explicação destes resultados reside no destino, será uma fatalidade. A verdade é que a pobreza tem claramente uma dimensão estrutural e intergeracional.

A escola é certamente uma ferramenta poderosa de promoção de mobilidade social, mas, por si só, dificilmente funciona como elevador social.

O impacto das circunstâncias de vida no bem-estar das crianças, em particular no rendimento escolar e comportamento, é por demais conhecido e essas circunstâncias constituem, aliás, um dos mais potentes preditores de insucesso e abandono quando são particularmente negativas, como é o caso de carências significativas ao nível das necessidades básicas. Em qualquer parte do mundo, miúdos com fome, com carências, de natureza variada não aprendem e mais provavelmente vão continuar pobres. Manteremos as estatísticas internacionais referentes a assimetrias e incapacidade de proporcionar mobilidade social através da educação. Não estranhamos. Dói, mas é “normal”, será o destino.

Assim, ou nos concertamos na exigência a alterações nos modelos de desenvolvimento de modo a garantir, tanto quanto possível, equidade e um combate eficaz à exclusão com a consequente alteração nas políticas públicas ou, ciclicamente, nos confrontamos com indicadores desta natureza.

Não, não é "o destino" que os filhos dos filhos dos filhos, dos filhos das famílias pobres tenham insucesso e continuem pobres. Se assim acontece e continua a acontecer é a falência das políticas públicas e dos que por elas são responsáveis.

Acontece ainda que se verifica uma estranha e curiosa situação, muitos ocupantes de funções políticas relevantes, na área da educação por exemplo, após terminarem essas funções apresentam sempre uma visão muito clara do que deve ser a política na área de que foram responsáveis, mas que, por incompetência, falta de poder, visão diferente ou qualquer outra justificação, não realizaram. É o que eu chamo a Síndrome Pós-ministério, ou seja, é assim que se deve fazer, mas na altura, não me lembrei, não soube, não fui capaz ou ...

Nos tempos que vivemos, duros e incertos, mais se torna necessário a robustez e competência das políticas públicas. Quero acreditar que é possível fazer diferente, será, como sempre uma questão de opções.

terça-feira, 9 de dezembro de 2025

O FUTURO JÁ MORA AQUI, SERÁ?!

No JN encontra-se uma peça interessante e estimulante.

Foi realizado pela ”plataforma de estudos OnePoll que realizou o relatório da 72Point” um estudo envolvendo cerca de 5000 pais com filhos menores de 18 anos inquirindo se recorrem a dispositivos de IA, Copilot ou ChatGPT, em busca de ajuda para lidar com os filhos.

Ao que se lê, três em cada dez inquiridos referem ter pedido apoio e 33% admite vir a utilizar. O pedido de apoio mais comum é na realização de trabalhos de casa, 45%, e escolha de actividades de entretenimento e de livros de acordo com a idade dos filhos, 39%.

Mais interessante ainda, 34% procurou apoio da IA para compreender o desenvolvimento dos filhos, cerca de um terço para apoio a mudanças comportamentais e 29% refere ter recorrido a bots como dispositivo de apoio à saúde mental e bem-estar emocional dos seus filhos.

Registo que o responsável do estudo recomenda prudência na utilização deste recurso e recomenda depois de uma pesquisa de base na IA uma “consulta de profissionais sempre que necessário e procurar ajuda e apoio de amigos e familiares".

Depois de quase cinco décadas de trabalho na área da psicologia e da educação, agora que estou reformado, abre-se uma nova estrada ou mesmo uma auto-estrada, virtual, é claro.

Talvez venhamos a saber que, por exemplo, amanhã se realiza uma reunião de bots para discussão de casos que pode ser acompanhada online.

Na verdade, lembro-me de João de Melo, “O meu mundo não é deste reino”.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2025

DOS "ESCOLANTES" E DO "PRESENTISMO"

 Nos últimos dias são múltiplas as referências ao clima existente em muitas escolas com frequentes e, por vezes graves, episódios de violência e ainda mais frequentes as situações que envolvem indisciplina.

Não estando as escolas imunes a efeitos de contexto, é preocupante, mas não surpreendente os cenários e episódios que se conhecem e muitos que não são divulgados, mas com que professores, técnicos e auxiliares, têm de lidar.

Muitas vezes aqui tenho abordado estas questões críticas, a última há dois dias. Hoje uma abordagem num outro sentido e que muitas vezes partilhei com professores.

Em todas as escolas parece existir um grupo mais ou menos significativo que parece ter desistido do seu estatuto de “estudantes, mas que, por diversas razões, parecem optar por um outro estatuto para si mais simpático, são “escolantes”, vão à escola, estarão nas aulas, mas … não estudam assumem uma posição de “presentismo”, estão presentes nas aulas ou na escola, mas …, por vezes,  de uma forma disruptiva que, mais cedo ou mais tarde, se poderá transformar em indisciplina ou violência que lhes permitirá recuperar um estatuto valorizado ou temido pelos pares o que alimenta os comportamentos numa espiral que pode ser difícil de reverter.

É verdade que este cenário não acontece apenas agora, no meu tempo de aluno já existiam situações desta natureza, mas é potenciada pela desregulação de discursos e comportamentos que os últimos tempos têm sustentado.

Muitos destes alunos, “escolantes” em modo de “presentismo” criam expectativas de sucesso muito baixas e a desmotivação cresce, aumentam as faltas, as aulas não servem de nada a não ser como cenário de exibição de indisciplina, acham que “já não vão lá” e acabam por ser os grandes candidatos ao empurrão para o ensino vocacional.

No entanto, continuam a deslocar-se diariamente para a escola, é lá que estão os seus amigos e, apesar de tudo, é lá que eles acham que devem estar apesar dos discursos negativos e agressivos que produzem com frequência sobre a escola. Ninguém gosta do fracasso, os discursos e os comportamentos nas mais das vezes mascaram o mal que se sentem pelo fracasso escolar e pelo que isso significa.

A tarefa de alunos e professores não é, longe disso, uma tarefa fácil, mas importa não desistir de reverter a condição de “escolantes” assumindo que são estudantes, alunos.

Como muitas vezes escrevo também muitos alunos identificados (sinalizados) como tenho necessidades especiais não estão incluídos nem integrados, estão “entregados”, constituem um outro grupo de “escolantes”.

Todo este universo sublinha a necessidade e urgência de ajustamento nas políticas públicas, designadamente, de educação e sociais no sentido que tantas vezes aqui refiro.

É essencial promover e tornar acessíveis a alunos, professores e famílias apoios e recursos adequados e competentes a minimizar o risco de insucesso.

É claro que mudanças estruturais têm custos pelo que será de considerar a necessidade de investimento sério em educação, 6% do Produto Interno Bruto o que está definido pela UNESCO como meta para 2030. Talvez a aposta na Defesa condicione a aposta no futuro, a educação.

É crítica a necessidade de uma política que atraia novos docentes com um modelo de carreira valorizada, justa e atractiva.

É imprescindível é dotar as escolas de forma continua e estável dos recursos necessários para minimizar tanto e tão rápido quanto possível as dificuldades que identificam.

É necessário promover a desburocratização asfixiante e reflectir sobre modelos de governança das escolas mais adequados, competentes e participados.

Com real autonomia, com mais recursos e com modelos organizativos, incluindo a gobvernança, mais adequados e desburocratizados as escolas poderiam certamente fazer mais e melhor. que quem vem de fora numa passagem transitória, mais ou menos longa, mas transitória. Sim, tudo isto deveria ser objecto de escrutínio, regulação e avaliação também externa, naturalmente.

Escolas com mais auxiliares, auxiliares informados e formados podem ter um papel importante em diferentes domínios.

Directores de turma com mais tempo para os alunos e professores com menos alunos poderiam desenvolver trabalho útil em múltiplos aspectos do comportamento e da aprendizagem.

Psicólogos e outros técnicos em número mais adequado poderiam acompanhar, promover e desenvolver múltiplas acções de apoio a alunos, professores, técnicos e pais.

Mediadores que promovessem iniciativas no âmbito da relação entre escola, pais e comunidade seriam, a experiência mostra-o, um investimento com retorno. Repetindo e sintetizando, os professores sabem como avaliar e identificar as dificuldades dos alunos.

Uma nota final para sublinhar a necessidade de estabilização curricular e da questão da avaliação e percurso escolar dos alunos e reafirmar a importância da avaliação externa como reguladora do trabalho realizado.

É este o desafio que enfrentam as políticas públicas de diferentes sectores.

Em nome do futuro, não podem falhar, repito, não podemos falhar.

domingo, 7 de dezembro de 2025

FORMAÇÃO, FORMAÇÃO, FORMAÇÃO

 Na passada semana realizou-se em Santarém um encontro com directores de escolas e agrupamentos com a presença do Ministro da Educação, Ciência e Inovação, subordinado ao tema, “Ler os resultados das provas Moda — Implicações para a aprendizagem da leitura”.

Face à preocupação com os resultados dos alunos do 1.º ciclo em Português nas Provas Moda e no Diagnóstico de Fluência Leitora, foi anunciado um plano com dois eixos centrais a desenvolver nos próximos dois anos, a criação de bibliotecas em escolas do 1.º Ciclo e um Programa de Formação de Professores, o Programa de Ensino, Didáctica e Aprendizagem da Leitura.

Umas notas sobre a propósito.

Começando pela criação de bibliotecas escolares e considerando que existem 1487 escolas do 1.º ciclo (46% das escolas - 25% dos alunos – 90000 alunos) parece importante que seja concretizado sendo que em 2026 serão criadas 434.

Como é óbvio a biblioteca é um bem de primeira necessidade numa escola, mas, só por existir, não é suficiente, é necessário que a motivação para a leitura que leva à biblioteca seja trabalhada e que o trabalho dos professores bibliotecários em conjunto com os professores titulares seja apoiado e desenvolvido também no cenário das bibliotecas a criar.

Consideremos agora o Programa de Ensino, Didáctica e Aprendizagem da Leitura que de acordo com o MECI "visa, a nível nacional, actualizar e fortalecer as competências de todos os professores do 1.º ciclo na didáctica da leitura e da escrita, com impacto directo na capacidade leitora e no sucesso dos alunos".

Com algumas décadas de trabalho com colaboração na formação de professores entendo que há sempre lugar à “actualização e fortalecimento” desde que a formação proposta actualize, de facto, as competências profissionais o que nem sempre acontece.

Importa não esquecer que os professores do 1.ºciclo, na sua grande maioria são professores experientes e certamente competentes.

A formação sendo uma dimensão crítica não é mágica e não traz um manual de instruções com o qual se resolvem todos os problemas do complexo processo de ensino e aprendizagem, alguns dos quais, estão para lá da questão da didáctica.

No entanto, se o Ministro sobrevaloriza a questão da formação e assumirmos um alargamento do que se entende por formação existem algumas outras questões que refiro sem esgotar ou hierarquizar.

Em primeiro lugar é crucial a formação de políticas públicas que sejam eficientes e sólidas e avaliadas.

É importante a formação de equipas nas escolas, professores, técnicos, assistentes operacionais suficientes e preparadas. Recordo que há poucos dias se noticiava que 133 turmas do 1.º ciclo estão ainda sem professor titular, mais de 3300 alunos.

É crítica a formação de climas de escola tranquilos e colaborativos e com modelos de governança competentes.

É imprescindível a formação de processos funcionais que eliminem tento quanto possível a burocracia que esmaga os professores e contamina a mais nobre e importante das suas competências, o ensino.

É absolutamente necessária a formação de dispositivos de apoio a alunos e professores que contribuam para minimizar dificuldades de uns e outros.

É importante a formação de …

Na verdade, é sempre uma tentação explicar as dificuldades dos alunos com a competência dos professores. Sem demagogia, sabemos que sim, a competência é uma dimensão crítica, mas não é a única. Pela mesma razão, o bom resultado que muitos alunos atingem não decorre “exclusivamente” da competência do docente.

sábado, 6 de dezembro de 2025

VIOLÊNCIA E INDISCIPLINA EM CONTEXTO ESCOLAR

 No Público encontra-se uma peça centrada na questão da disciplina e violência em contextos escolares. Face aos contornos que a situação nas escolas revela solicita-se mudança no quadro legal, no Estatuto do Aluno, por exemplo, bem como dispositivos de apoio que permitam uma melhor resposta.

Muitas vezes aqui tenho abordado esta questão e durante a minha vida profissional foi matéria de trabalho em muitas escolas.

Deixem-me insistir em duas ou três notas que retomo de reflexões anteriores. Os estilos de vida, as exigências de qualificação têm tornado gradualmente a escola mais presente e durante mais tempo na vida de crianças e adolescentes e, consequentemente, com reflexos na educação em contexto familiar.

Importa também acentuar que fora dos contextos escolares, o padrão relacional entre adultos, de todas as condições, exprime também com demasiada frequência violência e descontrolo de diferente natureza e efeito. O comportamento agressivo, verbal, físico, psicológico, etc., tornou-se quase, um novo normal em múltiplos contextos. Não é de esperar que a comunidade escolar seja impermeável à desregulação que impera nas relações sociais mesmo em contextos formais e, habitualmente, mais regulados. Veja-se, por exemplo, sucessivos episódios degradantes na Assembleia da República ou a facilidade e frequência de conflitos por motivos fúteis.

Este cenário, como não podia deixar de ser, contamina o ambiente das comunidades escolares e as respostas”, por assim dizer, “velhas", da escola são insuficientes para os contornos novos que as relações sociais parecem evidenciar, designadamente, a desregulação, gerando uma perceção de insegurança que não pode deixar de infuenciar todos os "habitam" a escola.

Sabemos também que a ideia de que a “família educa e a escola instrói” já não colhe e espera-se que a escola não forme “apenas” técnicos, mas cidadãos, pessoas, com qualificações ao nível dos conhecimentos em múltiplas áreas.

Um sistema público de educação com qualidade, desde há muito de frequência obrigatória e progressivamente mais extenso, é uma ferramenta fundamental para a promoção de igualdade de oportunidades, de equidade e de inclusão. Uma educação global de qualidade é de uma importância crítica para minimizar o impacto de condições sociais, económicas e familiares mais vulneráveis.

Os dados conhecidos referentes à delinquência juvenil, à violência em contextos escolares, a indisciplina com contornos mais pesados ou os também preocupantes indicadores relativos à violência nas relações de namoro entre jovens, sendo que muitos a entendem como “normal”, tal como inquietam o volume de episódios de bullying, ou os consumos de álcool ou droga.

Parece-me importante que as matérias integradas na "Educação para a Cidadania" façam parte do trabalho desenvolvido na educação em contexto escolar. Com o mesmo objectivo será importante o desenvolvimento de programas de natureza comunitária envolvendo diferentes áreas das políticas públicas.

Como tenho referido precisamos e devemos discutir como fazer, com que recursos e objectivos e promover a autonomia das escolas, também nestas questões. Por outro lado, não acredito na “disciplinarização” destas matérias, julgo mais interessantes iniciativas integradas, simplificadas e desburocratizadas em matéria de organização e operacionalização.

Sabemos que a prevenção e programas de natureza comunitária, socioeducativa, têm custos, mas importa ponderar entre o que custa prevenir e os custos posteriores da pobreza, exclusão, delinquência continuada e da insegurança. A escola, carente de meios e recursos humanos, só por si não pode “resolver”, nem se lhe pode exigir que resolva, algo que é maior, mais complexo e a cerca.

Esta é a grande responsabilidade das políticas públicas e os resultados mostram alguma falência que nos custa caro.

Não é possível que a leitura regular da imprensa escrita, sobretudo nos últimos tempos e no que respeita à educação tenha na terminologia de boa parte dos trabalhos publicados e sem qualquer ordenação de frequência ou preocupação, alunos desmotivados, agressões a professores, agressões a alunos, agressões a funcionários, “bullying”, violência escolar, humilhações, falta de autoridade dos professores, imagem social degradada dos professores, professores desmotivados, famílias incompetentes, pais negligentes, demissão familiar, indisciplina, recusa, contestação, insucesso, facilitismo, burocracia, currículos desajustados, insegurança, medo, receio, etc.

Intencionalmente não referi a onda de informação relativa à situação vivida pelos professores que, também, não pode ser dissociada de todo o universo da educação.

No entanto, insisto na necessidade de uma palavra de optimismo.

A verdade é que, apesar de todos os constrangimentos e dificuldades bem conhecidas e nem sempre reconhecidas e do que ainda está por fazer, o trabalho desenvolvido por professores, técnicos, funcionários e alunos é bem-sucedido na maioria das situações e em termos globais, apesar dos incidentes que se registam e isso deve ser sublinhado. De uma forma geral, professores, técnicos, funcionários e alunos, quase todos, fazem a sua parte.

Uma comunidade não pode conviver com o medo diário de deixar os seus filhos sair de casa para a escola, tal como não pode conviver com o mal-estar persistente dos profissionais. Mantendo um realismo lúcido, é preciso que se aborde e converse sobre o tudo da escola e não apenas sobre o mau da escola. A insistência exclusiva neste discurso terá um efeito devastador na confiança e expectativas de alunos, famílias e professores face ao presente e ao futuro.

Sim, não é tudo, mas os miúdos precisam de se sentir seguros.

Tal como os pais.

Tal como os professores.

Tal como os técnicos.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

A DIRECÇÃO DE TURMA

 O DN recorda que uma das medidas do Plano “+ Aulas + Sucesso” anunciada em 2024 seria um dispositivo de apoio aos directores de turma.

Estranhamente, dada a nossa fortíssima tradição de cumprir planos e objectivos … ainda não aconteceu nada. Pensando melhor, acontece, a notícia refere que muitos professores asfixiados pelo clima das escolas, a insuficiência de recursos, a carga diária de trabalho e o peso de uma burocracia esmagadora estão a recusar horários para não assumir a direcção de turmas.  

Já aqui tenho referido que a função Direcção de Turma assume um papel central no nosso sistema educativo, sendo, lamentavelmente, pouco cuidadas e promovidas as condições para o seu desempenho com qualidade e eficiência. Na verdade, a actividade do DT, para usar a linguagem da escola, tem um conjunto dimensões de extraordinária importância. Vejamos alguns aspectos, obviamente conhecidos, sem preocupação de hierarquia.

O DT é o interlocutor dos pais e encarregados de educação. Toda a comunicação e relação entre a família e a escola, cuja relevância é dispensável acentuar, assentam no DT. A realização das Reuniões de Pais e Encarregados de Educação, a comunicação regular entre pais e escola são dispositivos da sua responsabilidade e a forma como a sua função é desempenhada pode ser um fortíssimo contributo para o envolvimento mais eficaz e positivo dos pais na vida escolar dos alunos.

O DT é um mediador entre os alunos e a escola, ou seja, pode e deve ser um regulador da relação dos alunos com os colegas, tentando perceber fragilidades ou dificuldades, com outros professores, detectando questões ou aspectos que careçam de alguma atenção e eventual intervenção.

O DT pode, no trabalho que realiza com os alunos, providenciar informação, orientação, apoio, etc., para as inúmeras dúvidas que nas diferentes idades se podem colocar. Informação sobre o estudo e como estudar, informação sobre trajectos escolares face à oferta educativa, promoção de competências sociais, analisando e discutindo problemas do quotidiano escolar ou pessoal potenciando a formação pessoal dos alunos, etc.

O DT tem um papel importante também na promoção da articulação e coerência das intervenções educativas que envolvem alunos com necessidades educativas especiais.

Apenas com estes exemplos, e não passam disso, sempre entendi com alguma dificuldade que a escolha para DT não fosse realizada fundamentalmente com critérios de perfil, motivação e experiência dando azo a situações conhecidas de inadequação.

Neste quadro torna-se difícil entender a carga burocrática e administrativa que foi sendo colocada nos DT, como em todos os professores, inibindo a utilização do tempo, (pouco) para a função de forma mais útil e adequada.

Também estranho a pouca atenção dada à necessidade de dispositivos de apoio dirigidos a aspectos como gestão de conflitos, percepção de sinais de risco nos miúdos e nos seus comportamentos, (alunos envolvidos em episódios de bullying ou vítimas de maus tratos, por exemplo) organização e gestão de reuniões de pais ou modelos e técnicas de estudo, poderiam ser ferramentas úteis para o desempenho com mais eficiência dessa função essencial.

Na verdade, quem conhece o universo das escolas, reconhece a importância da função DT e todos conhecemos professores que pelas suas qualidades pessoais e profissionais são muito bons exemplos do que é ser DT.

Melhores condições e apoio para o seu o exercício são necessárias e urgentes.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

NOTÍCIAS DA CHAMADA EDUCAÇÃO INCLUSIVA

 Foi divulgado o mais recente inquérito realizado pela Fenprof direccionado para a resposta aos alunos com necessidades especiais.

Responderam ao inquérito 147 directores de agrupamentos e escolas, 18% do total no continente, e envolveu 9252 turmas, 188 262 alunos e 19 231 docentes, 1 303 de educação especial. Alguns dados.

No conjunto das turmas envolvidas, 15 437 alunos beneficiam de apoio específico, 8,2% do total, sendo que 12 237 são abrangidos por medidas selectivas e 3 200 por medidas adicionais. A estes alunos acrescem   17 132 estudantes, 9%, que recebem "apoio indirecto", sem intervenção directa do professor de educação especial, apenas orienta o professor da turma. que que o docente de educação especial dá orientações ao docente titular da turma sobre como trabalhar com os alunos, mas não trabalha directamente com eles.

De acordo com os directores 47,6% das turmas envolvidas no estudo deveriam ser reduzidas, deveriam ter menos de 20 estudantes e, no máximo, dois alunos com necessidades especiais. Das 9252 turmas examinadas, 27,1% das turmas com alunos com necessidades educativas está sobrelotada, 12,4% tinha mais de 20 alunos, 8% tinha mais de dois alunos com NE e 6,7% tinha mais de 20 alunos e mais de dois alunos com NE considerando a legislação.

No que respeita a recursos humanos, 82,3% dos directores referem "não ter os recursos necessários para aplicar uma educação efectivamente inclusiva, ou seja, o que está previsto" na legislação.

De forma mais fina, 74,3% refere a insuficiência de professores de educação especial suficientes e 71,6% afirmaram ter ficado com horários por preencher sem qualquer candidato. No entanto, 8,1% dos docentes com esta especialização, na sua maioria dos quadros dos agrupamentos, tiveram de assumir turmas.

Acresce que 76,9% dos directores refere a falta de assistente operacionais e 79,6% a insuficiência de técnicos especializados, psicólogos, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas, mediadores sociais e culturais ou assistentes sociais.

É um quadro preocupante, mas expectável face ao resultado de anos anteriores e, naturalmente, da situação global do nosso sistema educativo, falta de recursos humanos, professores e técnicos e a questão de fundo, políticas públicas de educação no sentido correcto e com os meios necessários. É notícia no Expresso que ainda existem 133 turmas do 1.º ciclo, cerca de 3300 alunos, sem professor titular o que sustenta um manifesto subscrito por várias associações de pais.

Nada de novo, mas umas notas que espero breves. Muitas vezes aqui tenho abordado esta questão, vou repetir algumas ideias mas esta área foi a minha vida profissional, quase 50 anos. Comecei a trabalhar no universo da educação, em particular da educação para alunos com necessidades especiais, (à época os alunos com deficiência) em 1976 e aposentei-me definitivamente em 2024, sempre nesta área, a educação. Como as pessoas ligadas à educação sabem ou irão saber, de professor e de pai nunca nos reformaremos por mais longa que seja a nossa vida. Também é curioso que a minha companheira de estrada tenha sido professora de educação especial no 1.º ciclo durante a quase totalidade da carreira, achando eu que tive alguma responsabilidade nessa opção.

Dito isto, comecei no tempo das escolas especiais organizadas por deficiência (eu ligado à primeira CERCI que se constituiu, a de Lisboa), trabalhei no tempo da educação especial, no tempo da integração e das equipas de professores de ensino especial e, finalmente, no tempo da inclusão.

Sempre com esperança, acompanhei a mudança de quadro conceptual e legal que enquadrava este trabalho, ah, já me esquecia, também acompanhei as mudanças de paradigma, como sabem as coisas só mudam quando muda o paradigma, passei do paradigma da escola especial, para um paradigma combinado já com salas de ensino especial (salas de apoio) na escola regular, passei depois para o paradigma da integração, os alunos passaram a estar fundamentalmente integrados em turmas de ensino regular com acompanhamento dos professores de educação especial e, finalmente, o paradigma da inclusão, os alunos, todos os alunos, estão incluídos, já não são estigmatizados como alunos com necessidades educativas especiais. Assim, os alunos que revelavam algum tipo de dificuldade passaram a ser objecto de medidas educativas arrumadas em três categorias, as medidas “universais”, as medidas “selectivas” e as medidas “adicionais”. Isto parece que é uma outra forma de categorizar, mas não é. No paradigma da educação inclusiva é assim que se faz.

E pronto, chegámos à educação inclusiva, somos um exemplo para muitos países que se organizam nos velhos paradigmas, ainda não chegaram à educação inclusiva. Esperemos que lá cheguem, mas os ventos não vão de feição para os mais vulneráveis.

No entanto, a maldita realidade nem sempre colabora. Eu reconheço e conheço, sempre conheci, excelentes e inspiradores trabalhos de professores, técnicos, pais, escolas ou instituições ao longo destas quase cinco décadas de paradigmas diferentes. No entanto, também importa reconhecer, veja-se os dados acima e outros, por exemplo de relatórios da IGEC, que propagandear discursos sobre inclusão assentes em “wishful thinking” ou torturar a realidade para que se mostre diferente não é assim muito eficaz. Não, muitos alunos não estão incluídos nem sequer integrados, estão “entregados” com as consequências que professores, técnicos e pais bem conhecem. E importa considerar que não estou apenas a referir-me aos alunos “categorizados” pelas "não categorias", os “Selectivos”, os “Adicionais” ou os “Universais”. De facto, existem ainda muitos outros alunos que, lembrando Sam the Kid, fazem parte de uma percentagem que a sondagem nunca mostra. 

Desculpar-me-ão a heresia ou descrença, mas uma escola inclusiva é algo que não existe e, provavelmente, não existirá nos tempos mais próximos. Os modelos e estilos de vida actuais, económicos, políticos, sociais, culturais, as assimetrias brutais que se mantêm são pouco compatíveis com “uma escola inclusiva”. São brutalmente inquietantes os tempos que vivemos. Existem escolas, isso sim, que desenvolvem excelente trabalho com alguns alunos, o que é diferente de “uma escola inclusiva”.

Eu sei e gosto de acreditar que a escola é, também, uma alavanca de mudança, mas a verdade é que a escola, de uma forma ou de outra, é sobretudo um reflexo da sociedade que serve no tempo histórico em que vive.

No entanto, em nome dos meus netos e de todos os netos que serão o futuro, bem como das minhas convicções e como disse acima, acredito numa escola que possa, quanto possível, promover educação, a relação diária entre quem está na escola, assente em princípios de educação inclusiva. E neste sentido em todas escolas existirá educação inclusiva, há sempre quem a promova mesmo em contextos menos favoráveis.

A designação está tão desgastada que já nem sabemos bem o que significa. No entanto e de uma forma simples, entendo que a inclusão assenta em cinco dimensões fundamentais, Ser (pessoa com direitos), Estar (na comunidade a que se pertence da mesma forma que estão todas as outras pessoas), Participar (envolver-se activamente da forma possível nas actividades comuns), Aprender (tendo sempre por referência os currículos gerais) e Pertencer (sentir-se e ser reconhecido como membro da comunidade). A estas cinco dimensões acrescem os princípios inalienáveis da autodeterminação, autonomia e independência.

Finalizo voltando ao início, as políticas públicas são onerosas, a política pública de educação é onerosa, a suficiência de recursos será sempre uma questão problemática, mas é, também, por aqui que se avaliam a competência e adequação das… políticas públicas. E, fazendo bem as contas, a exclusão tem custo bem mais elevados.

Reafirmo que não esqueço o que positivo se faz, mas conheço tantas práticas e tantos discursos que alimentam exclusão, mas que são desenvolvidas e enunciados ... em nome da inclusão. Sempre recordo o Mestre Almada Negreiros na "Cena do Ódio" quando falava da "Pátria onde Camões morreu de fome e onde todos enchem a barriga de Camões".

Desculpem a extensão do texto.