sábado, 15 de fevereiro de 2020

DA DIRECÇÃO DE ESCOLAS E AGRUPAMENTOS

O PS e o PSD mostram-se disponíveis para ajustamentos, “melhorias”, no quadro legislativo da direcção e administração das escolas e agrupamentos desde que não se altere o modelo unipessoal de governação  regressando ao anterior modelo colegial. Seria surpreendente que admitissem a alteração.
Esta posição é expressa face a projectos de lei do BE e do PCP que surgem na sequência de uma petição da Fenprof que recolheu o número de assinaturas que obriga à sua discussão.
Entretanto, aguarda-se a avaliação do Governo ao modelo unipessoal em vigor, ao seu ajustamento ao quadro de municipalização e a algumas mudanças em termos de autonomia e flexibilidade curricular. Creio que não será difícil antecipar a substância dos resultados, algumas alterações em aspectos menos relevantes em nome da inovação e a manutenção da substância do modelo e da visão de municipalização.
O actual modelo de direcção unipessoal das escolas e agrupamentos e forma como é desempenhado volta com regularidade à agenda incluindo o questionar do próprio modelo face a uma direcção colegial. Têm existido estudos de opinião e tomadas de posição individuais ou manifestos que alimentam a discussão ou mesmo a necessidade de alterar o modelo de direcção.
Como já tenho afirmado a propósito de outras matérias, talvez fruto do ambiente de fortíssima tensão que nos últimos anos envolve a educação, os debates e as ideias também tendem a ser crispados, com opiniões definitivas e sem margem de entendimento e, frequentemente, com agendas menos explícitas. O modelo de gestão das escolas será apenas mais um exemplo deste cenário.
Com o atrevimento de quem não vive por dentro o quotidiano das escolas, mas procura acompanhar de forma atenta o universo da educação, retomo algumas notas.
Conforme tenho dito, sempre me pareceu claro que a transformação da direcção de escolas e agrupamentos num modelo unipessoal e a sua forma de eleição através dos conselhos gerais, acompanhada por uma política de mega-agrupamentos diminuindo substancialmente o número de unidades orgânicas, gosto desta designação, se inscreveu na sempre presente tentação de controlo político do sistema.
São conhecidos casos, alguns chegam à imprensa, de processos de eleição de direcções escolares que mais não são do que formas de colocar pessoas com o alinhamento certo na função. Aliás, o próprio funcionamento dos Conselhos Gerais é, em algumas situações, um exemplo disto mesmo. Assim sendo, o modelo de gestão unipessoal e a forma de eleição dos directores não são garantias de “mais democracia” ou “melhor democracia” nas escolas.
Dado um pecado estrutural do nosso sistema educativo, a ausência de dispositivos de regulação ao longo de décadas, coexistem boas experiências e práticas em situações de direcção unipessoal com situações bem negativas.
Por outro lado, importa recordar que em muitas circunstâncias também a “gestão democrática", de democrática não tinha assim tanto e também se verificavam casos gritantes de menor competência.
Dito isto, parece-me que tanto quanto ou mais do que o modelo de direcção, unipessoal ou colegial, julgo de reflectir na forma de eleição, participam todos os docentes ou um pequeno grupo que “representa” o corpo docente no conselho geral, o mesmo se passando com os funcionários.
Por outro lado, também me parece que deve existir um claro reforço do papel dos Conselhos Pedagógicos no funcionamento de escolas e agrupamentos. Parece-me também clara a vantagem da presidência do Pedagógico ser claramente independente da direcção da escola, sobretudo num modelo de direcção unipessoal.
Importa também que a reflexão sobre a direcção de escolas e agrupamentos seja acompanhada de uma verdadeira reflexão sobre o quadro de autonomia nas suas várias dimensões e equilíbrios. Qual o efeito da anunciada municipalização ou “proximidade”, como também lhe chamam, na autonomia de escolas e agrupamentos.
É claro que quanto mais sólido for o modelo de autonomia das escolas mais importante se torna o papel e função da direcção, independentemente do modelo. Esta é do meu ponto de vista a questão central.
Muitos estudos e a experiência mostram que nas organizações, incluindo escolas, a qualidade das lideranças tem um impacto forte no desempenho das instituições e também de todos os que nela funcionam. Boas lideranças escolares traduzem-se em melhores e mais estáveis climas de trabalho, maior nível de colaboração entre os profissionais, menor absentismo, melhores resultados ou menos incidentes de natureza disciplinar, ambientes escolares mais amigáveis em termos de educação inclusiva, melhor relação com pais e comunidade, entre outros aspectos. Como exemplo, em 2019 um estudo realizado pela Universidade do Porto da Universidade do Porto sugeria que o estilo de liderança dos directores das escolas tem um impacto importante na motivação dos professores pois existe uma “correlação significativa entre a forma como são geridos os estabelecimentos de ensino e a relação que os docentes têm com a sua profissão.  
Camões já afirmava que um fraco Rei faz fraca a forte gente” o que numa actualização republicana poderá entender-se como a defesa de lideranças competentes, com uma gestão participada, com mecanismos de eleição alargados, transparentes, escrutinados e com, insisto, mecanismos de regulação que previnam excessos e abusos.
Alguns episódios na contratação de docentes, de funcionários ou nos processos que envolvem técnicos e docentes em funções nas AEC, são exemplos em ter em conta pela forma negativa como foram geridos por algumas direcções de escolas de escolas e agrupamentos.


3 comentários:

MFernandes disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
MFernandes disse...

Assiste-se à quebra da solidariedade entre docentes, à competição (zinha) e mesmo ao assédio moral nas escolas, assente neste modelo de gestão combinado com muita, mas muita falta de preparação, não apenas do diretor, mas dos cargos intermédios. Sem formação em administração, gestão, liderança, ethos comunitário, evolução educacional e até com pouca formação pedagógica. Os professores sofrem. Os técnicos nem lhe falo!

Zé Morgado disse...

Uma outra dimensão deste universo.