segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

HISTÓRIA COM PODER DENTRO

Finalmente no meu Alentejo o tempo permitiu que se semeassem as favas e ervilhas, tarefa dura que a terra está muito carregada. No fim da lida, um copo e umas lérias com o Velho Marrafa. No meio, a propósito das voltas da vida e dos trambolhões das pessoas, o Velho Marrafa contou a história parecida de duas pessoas, o Manel Soldado e o Zé Curto mas vamos por partes. O Manel Soldado era um manajeiro, um homem que, como certamente saberão, angariava o pessoal para o trabalho nas herdades. Naquele tempo era coisa de muito poder, decidia quem trabalhava e quanto recebia, ganhando aliás com isso. Pois o Manel Soldado era tratado com o maior respeitinho, as pessoas descobriam-se à sua chegada e calavam-se para ouvir a sua voz, os que têm mais poder têm mais voz, diz o Velho Marrafa. Havia até muita gente que o tratava por Parente Manel Soldado o que, de acordo com o Mestre Marrafa, significava o apreço que lhe queriam mostrar.
Acontece que devido às mudanças na vida a herdade desfez-se e o Manel Soldado perdeu o lugar de manajeiro, ou seja, perdeu o poder. Passava então o tempo na taberna onde sempre tinha sido uma presença especial. Só que se alguém perguntava quem estava na taberna, a resposta que se ouvia era, ninguém, só o Manel Soldado. O Velho Marrafa mostrava como sem o poder o respeitado Parente Manel Soldado passou a Ninguém.
A outra história é quase uma repetição, apenas muda o personagem, o manajeiro Zé Curto, homem que, quando chegava a cavalo e devido ao poder que tinha, logo apareciam três ou quatro homens a oferecer-se para segurar o cavalo, também era tratado por Parente Zé Curto. Tal como na história do Manel Soldado, os tempos mudaram, a vida complicou-se e o Zé Curto passou a andar aos fretes com um carroça e uma besta e a fazer alguma "searita" que lhe davam. Deixou de ser o Parente Zé Curto e ganhou até a estranha alcunha do Tarraia.
O Velho Marrafa concluiu que são lérias que vieram de histórias que aconteceram. Ele sabe e nós também que estas histórias continuarão a acontecer, algumas viram lérias.

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