sexta-feira, 19 de abril de 2024

O MIÚDO BLINDADO

 Um destes dias estava a Professora Manuela na sala de professores à espera de mais uma das imensas reuniões que ocupam o tempo dos docentes, as mais das vezes sem utilidade de maior, quando apareceu o Professor Velho, o que está na biblioteca e fala com os livros, para o chá habitual.

Como não podia deixar de ser, trabalho de professor é assim, a conversa deslizou para os gaiatos, em particular para o Márcio que andava a inquietar a Professora Manuela porque o sentia menos bem, desatento, desinteressado, com reacções que não eram muito frequentes, a deixar as tarefas por acabar e sem muita preocupação com a qualidade. Para além disso, e era a maior inquietação da Professora é que, quando tenta falar com o Márcio, com quem até acreditava ter uma reacção tranquila, ele mostra-se nada disponível, diz que está tudo bem, fecha-se como se estivesse numa concha.

O Professor Velho, acenando a cabeça sublinhou, "é talvez um miúdo blindado, agora tem estado em moda falar de blindados".

Que queres dizer com isso, Velho?

Algumas vezes, alguns miúdos, por razões que nem sempre são muito nítidas mergulham num mal-estar que os empurra para a construção de uma espécie de concha, blindagem como eu lhe chamei, no sentido de ficar, ou de sentir, ou mesmo de parecer que estão bem e mascarar o seu desassossego que poderá vir de dentro, de fora, ou de dentro e de fora.

Mas Velho, sendo assim, e estando o Márcio blindado como tu dizes, como posso perceber o que o inquieta e tentar ajudar.

Baixinho e sem pressionar tenta perceber que sonhos sonha o Márcio. Como sabes, não é possível fechar os sonhos numa concha e talvez consigas perceber o que carregam os sonhos do Márcio. Se conseguires, vais ser capaz de o ajudar e tenho quase a certeza que ele quer e precisa dessa ajuda. A que chega dos professores e dos outros adultos atentos aos sonhos dos miúdos.

quinta-feira, 18 de abril de 2024

DA VALORIZAÇÃO DA CARREIRA DOCENTE

 Iniciam-se hoje as reuniões entre o MECI e as estruturas representativas dos professores. Em discussão estarão, naturalmente, múltiplas questões, mas a recuperação do tempo de serviço e a valorização da carreira docente são centrais.

O Ministro afirmou ontem na Universidade do Minho que a valorização da carreira é a solução para combater o problema da falta de professores no país e que está a ser preparado um plano de emergência para o imediato a pensar já no próximo ano lectivo.

Como tantas vezes aqui tenho abordado e recuperando notas já escritas, os problemas que envolvem a classe docente e as suas consequências a curto e médio prazo, sendo conhecidos de há muito, são agora claramente reconhecidos apesar de algumas tentativas de torcer a realidade. Nos últimos anos têm sido recorrentes as referências, relatórios e estudos evidenciando a preocupante falta de professores, o envelhecimento da classe, os níveis de cansaço e de exaustão emocional, a baixa atracção dos mais jovens pela profissão associada a modelos de carreira, contratação e valorização pouco motivadores e justos. Os professores passam por dispositivos de avaliação pouco transparentes e competentes que desmotivam, causam mal-estar e climas institucionais pouco amigáveis, para ser simpático na adjectivação.

Por outro lado, parece ter-se desenhado um caminho que transformará técnicos em professores, num processo questionável e preocupante de “desprofissionalização”. No entanto, também é de registar que de uma forma geral continuam a merecer a confiança das comunidades.

Este quadro, de um mal-estar reconhecido, não pode deixar de ter impacto. Como muitas vezes afirmo, crianças, enquanto grupo social, e professores, enquanto grupo profissional, constituem dois grupos nucleares nas sociedades contemporâneas. Os mais novos porque são o futuro e os professores porque, naturalmente, o preparam, tudo (quase) passa pela escola e pela educação. Entre nós, este entendimento ainda me parece mais justificado porque, devido a ajustamentos na organização social e familiar e, é minha convicção, devido a políticas públicas sociais e educativas inadequadas, os miúdos passam tempo excessivo na escola, alterando a dinâmica educativa familiar o que sobrevaloriza o papel da escola através dos professores.

Raramente a profissão professor tem estado tanto em foco como nos últimos anos bem como a necessidade de defender a qualidade da escola pública. Os tempos que vivemos sublinham uma questão e outra de forma crítica.

Múltiplas acções e decisões políticas, bem como alguma imprensa e "opinion makers" têm contribuído para degradar a sua função, fragilizar a sua imagem social e comprometer o clima e a qualidade do trabalho desenvolvido nas escolas apesar dos professores continuarem a ser uma das classes profissionais em que os portugueses mais confiam.

A atenção que tem estado centrada nos professores advém de boas e más razões. Não cabe aqui um balanço, e entendo que, tal como os miúdos, os professores não têm sempre razão, os discursos dos seus representantes são, por vezes parte do problema e não parte da solução e também sei que existem alguns professores que o não deviam ser. No entanto, a verdade é que a esmagadora maioria dos docentes são ... Professores, muito bons Professores.

Ser professor no ensino básico e secundário por razões conhecidas e por vezes esquecidas, é hoje uma tarefa de extrema dificuldade e exigência que social e politicamente justifica um reconhecimento e valorização frequentemente negligenciados. Acresce que é uma tarefa desempenhada por uma classe extremamente envelhecida e cansada como tem sido amplamente estudado e divulgado.

Por um momento, pensemos no que é ser professor em algumas escolas que décadas de incompetência na gestão urbanística, nas políticas sociais e consequente guetização social produziram.

Pensemos ainda na forma como milhares de professores cumprem a sua carreira, muitos deles sem a possibilidade de desenharem projectos de vida para si quando são os principais responsáveis por lançar projectos de vida para os miúdos com quem trabalham. Aliás, nos últimos anos, milhares de professores, de bons professores e professores necessários, foram constrangidos à reforma e muitos ao desemprego por uma política de contabilidade inimiga da educação pública e da qualidade.

Pensemos em como os professores são injustiçados nas apreciações de muita gente que no minuto a seguir a dizer uma qualquer ignorante barbaridade, vai numa espécie de exercício sadomasoquista entregar os filhos nas mãos daqueles que destrata, depreendendo-se assim que, ou quer mal aos filhos ou desconhece os professores e os seus problemas.

Pensemos como é imprescindível que a educação e os problemas dos professores não sejam objecto de luta política baixa e desrespeitadora dos interesses dos miúdos, mesmo por parte dos que se assumem como seus representantes.

Pensemos que a forma como os miúdos, pequenos e maiores, vêem e se relacionam com os professores está directamente ligada à forma como os adultos os vêem e os discursos que fazem.

Pensemos finalmente nos professores que nos ajudaram a chegar ao que hoje cada um de nós é, aqueles que carregamos bem guardadinhos na memória, pelas coisas boas, mas também pelas más, tudo contribuiu para sermos o que somos.

A valorização social e profissional dos professores em diferentes dimensões é uma ferramenta imprescindível a um sistema educativo com mais qualidade. A valorização e reconhecimento passam também pela necessidade de modelos de carreira e de avaliação justos e transparentes que sustentem, reconheçam e promovam competência, empenho e atracção pela profissão.

Gostava ainda de recordar outra vez uma ideia do enorme João dos Santos, “O Professor João, foi meu professor porque foi meu amigo” e uma convicção pessoal que a idade cada vez mais cimenta, qualquer professor ou educador, tanto ou mais do que aquilo que sabe, ensina aquilo que é. É da relação que tudo nasce numa sala de aula, qualquer que seja a configuração.

A verdade é que de todos os professores que connosco se cruzaram, os que mais nos marcaram positivamente foi sobretudo pelo que eram e menos pelo que nos ensinaram, por mais importante que seja.

Estamos a entrar num novo ciclo e importa que traga mudanças nas políticas educativas, e não só. Este caminho está a esgotar-se e o futuro está comprometido. Não vale a pena negar a realidade.

Deixem lá ver o que acontece.

quarta-feira, 17 de abril de 2024

CATAVENTOS

 De há muito que naquela terra onde acontecem coisas surgem frequentemente cataventos na paisagem.

São figuras que se orientam face ao vento, a qualquer vento que lhes traga algo. Não importa a natureza do vento, importa o que possa trazer, um lugarzinho, visibilidade, qualquer coisa que alimente o umbigo.

Normalmente, são figuras menores que se julgam maiores e que (se) vendem (por) qualquer produto que os faça sentir iluminados, desconhecem ética e valores.

Hão-de ser sempre gente pequena no seu pequeno mundo de enganos.

Não sei porque me lembrei de escrever isto hoje.

terça-feira, 16 de abril de 2024

DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO

Lê-se no JN que segundo dados da Fenprof existirão cerca de 32500 alunos sem aulas a todas as disciplinas por falta de docentes. Este número corresponde a 419 horários por preencher em oferta de escola e é o dobro do número verificado no ano anterior por esta altura.

Este cenário negro e penalizante para muitos alunos está obviamente associado a várias legislaturas em que se desenvolveram políticas públicas de educação no sentido errado, a narrativa insustentável sobre os professores a mais, a desvalorização das carreiras tornando-as pouco atractivas para novos professores e produzindo cansaço e desânimo para muitos dos que estão enquanto não chega a reforma, a asfixiante carga burocrática de docentes e escolas, etc.

É verdade que a falta de docentes é também um problema de outros sistemas educativos e não tem resolução imediata.

No entanto, talvez seja de recordar o recente relatório da ONU, “United Nations Secretary-General’s High-Level Panel on the Teaching Profession: Recommendations and summary of deliberations”, produzido por iniciativa de António Guterres.

Talvez pudesse inspirar as políticas públicas de educação para os próximos anos agora que se está a iniciar um ciclo governativo.

Será de considerar a necessidade de investimento sério em educação, 6% do Produto Interno Bruto o que está definido pela UNESCO como meta para 2030, a valorização profissional dos professores combatendo o risco de “deskilling” ou desprofissionalização através de mudanças nas exigências da habilitação para a docência, valorização salarial que recupere a atractividade pela carreira e definição de dispositivos de apoio ao exercício profissional em contextos mais exigentes. Importa ainda que se definam carreiras profissionais de forma estável e valorizadas.

As medidas mais recentes nestas matérias, designadamente no que se refere à formação exigida, e a ausência de propostas sólidas e concretas nas dimensões referidas no texto da ONU não serão um bom augúrio.

domingo, 14 de abril de 2024

PSICOLOGIA, EDUCAÇÃO E ESCOLA

 É uma coincidência curiosa, o novo Referencial para a Intervenção dos Psicólogos em Contexto Escolar foi aprovado em 15 de Março pelo anterior ME e hoje ficamos informados que centenas de psicólogos a intervir em contextos escolares (mas não só na área da educação) contratados ao abrigo de projectos comunitários que terminam em Junho não existindo ainda indícios de abertura de processos de vinculação.

O Referencial é um documento importante como regulador da e orientador da intervenção, mas é necessário que … existam psicólogos que efectivamente integrem as equipas de escolas e agrupamentos. Como é óbvio existem, a situação ´de muitos é precária e o seu efectivo ainda está longe de corresponder às necessidades.

Para os profissionais parece claro que num quadro de orientações estabelecidas, do estado da arte em matéria de psicologia da educação e de contextos de intervenção carregados de constrangimentos, o empenhamento e a competência dos profissionais pode dar um contributo sólido para a qualidade dos processos educativos de todos os alunos. Para além do trabalho com alunos é crítica a colaboração e intervenção com professores, funcionários, direcções e pais e encarregados de educação, para além de outras respostas na comunidade dirigidas à população em idade escolar.

No entanto, desde 1991, a presença dos psicólogos em contextos educativos tem vivido entre as declarações dos vários actores, incluindo a tutela, sobre a sua necessidade e importância e a lentidão, insuficiência e precariedade no sentido da sua concretização.

É recorrente a afirmação por parte de sucessivas equipas do ME da prioridade em promover o alargamento do número de técnicos e a estabilidade da sua presença nas comunidades educativa mas é algo que, como se percebe, tarda em concretizar-se e insisto em notas já por aqui escritas e marcadas pelo óbvio envolvimento pessoal, tenho formação em psicologia da educação.

No entanto, para além da precariedade, o número de psicólogos a desempenhar funções no sistema educativo público está ainda longe do rácio aconselhado para um trabalho mais eficiente.

Temos situações em que existe um psicólogo para um agrupamento com várias escolas e que envolve um universo com mais de 2000 alunos e a deslocação permanente entre várias escolas numa espécie de psicologia em trânsito. Não é uma resposta, é um fingimento de resposta que não serve adequadamente os destinatários, a comunidade educativa, como também, evidentemente, compromete os próprios profissionais.

Temos também inúmeras escolas onde os psicólogos não passam ou têm “meio psicólogo” ou menos e ainda a prestação de apoios especializados de psicologia em “outsourcing” e com a duração de meia hora semanal uma situação inaceitável e que é um atentado científico e profissional e, naturalmente, condenado ao fracasso de que o técnico independentemente do seu esforço e competência será responsabilizado. No entanto, dir-se-á sempre que existe apoio de um técnico de psicologia.

O quadro orientador da intervenção dos psicólogos nos contextos escolares é um documento positivo, mas corre o risco ser inaplicável em muitas situações face ao alargado espectro de funções e actividades previstas associado ao universo de destinatários.

Neste cenário, a intervenção dos profissionais, apesar do esforço e competência, tem um potencial de impacto aquém do desejável e necessário. Áreas de intervenção como dificuldades ou problemas nas aprendizagens, questões ligadas aos comportamentos nas suas múltiplas variantes, alunos com necessidades especiais, trabalho com professores e pais, trabalho ao nível da prevenção de problemas, etc., exigem recursos e tempo que não estão habitualmente disponíveis.

Acresce que o recurso ao modelo de “outsourcing” ou a descontinuidade do trabalho é um erro em absoluto, é ineficaz, independentemente do esforço e competência dos profissionais envolvidos.

Como é que se pode esperar que alguém de fora da escola, fora da equipa, técnica e docente, fora dos circuitos e processos de envolvimento, planeamento e intervenção desenvolva um trabalho consistente, integrado e bem-sucedido com os alunos e demais elementos da escola?

Das duas uma, ou se entende que os psicólogos sobretudo, mas não só, os que possuem formação na área da psicologia da educação podem ser úteis nas escolas como suporte a dificuldades de alunos, professores e pais em diversos áreas, não substituindo ninguém, mas providenciando contributos específicos para os processos educativos e, portanto, devem fazer parte das equipas das escolas, base evidentemente necessária ao sucesso da sua intervenção, ou então, é uma outra visão, os psicólogos não servem para coisa alguma, só atrapalham e, portanto, não são necessários.

A situação existente parece-me, no mínimo, um enorme equívoco que além de correr sérios riscos de eficácia e ser um, mais um, desperdício (apesar do empenho e competência que os técnicos possam emprestar à sua intervenção), tem ainda o efeito colateral de alimentar uma percepção errada do trabalho dos psicólogos nas escolas.

Estando no fim da carreira profissional ainda aguardo que a importância e prioridade sempre atribuídas ao trabalho dos psicólogos em contextos educativos se concretizem de forma suficiente e estável.

sábado, 13 de abril de 2024

UMA CASA, UM ABRIGO

No Observador encontra-se um trabalho sobre um projecto, “Casas Primeiro”, desenvolvido pela Associação para o Estudo e Integração Psicossocial (AEIPS), instituição particular de solidariedade social  que desenvolve programas e prestas serviços de apoio a pessoas com doença mental, nas áreas da habitação, educação e emprego.

O projecto tem o envolvimento de diversas entidades, incluindo a Câmara de Lisboa e apoia fundamentalmente pessoas sem abrigo e com doença mental. A estratégia de apoio tem como primeiro passo assegurar uma casa, daí a designação. 

Seria desejável que mais iniciativas desta natureza se desenvolvessem, uma casa, um abrigo, é um bem de primeira necessidade e um passo para um projecto de vida mais positivo.

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sexta-feira, 12 de abril de 2024

OS ERRANTES

 Nas escolas, em todas as escolas, existe um grupo de miúdos, sobretudo na fase da adolescência, a que podemos chamar de Errantes. Não são, naturalmente, os miúdos que erram no que fazem, são aqueles miúdos que erram pela vida e pela escola numa espécie de deriva sem destino sonhado e, muito menos, com destino desejado.

Em particular no terceiro período, ou segundo semestre, parece relativamente fácil identificar os errantes, quase sempre não têm boas notas, embora alguns, poucos, as consigam, quase sempre nos mostram o seu Errante estado com comportamentos que nos incomodam e embaraçam, de que muitos deles também não gostam, mas que fazem questão de assumir, numa tentativa, perante si próprios, de esconder a condição de Errante e de ganharem uma identidade.

Existem também alguns Errantes que parecem transparentes, transparecem tristeza, mal damos por eles de tão invisíveis.

Estes Errantes estragam as estatísticas do sucesso e da qualidade, contribuem para as estatísticas dos problemas e do abandono e, por isso, não são desejados, sobretudo nas escolas muito boas, que não gostam de Errantes, preferem os Destinados, ou seja, os miúdos que já no presente carregam o destino que lhes sonharam e que eles assumem, desejando ou não.

Os Errantes que agora estão na escola, tal como aconteceu com a maioria dos Errantes que já por lá andaram, serão os Errantes da vida, seja lá o que for a vida que os espera, porque eles não esperam a vida. Imaginam apenas o amanhã, que ainda assim e como se costuma dizer, já é longe demais. E esse amanhã imaginado é rigorosamente igual ao hoje vivido.

Se nos abeirarmos dos Errantes, o que nem sempre conseguimos, sabemos, podemos ou queremos, fazer talvez possamos perceber como é difícil a história dos Errantes.

Ninguém gosta de andar perdido.

quinta-feira, 11 de abril de 2024

UMA NO CRAVO ...

 A história tem demonstrado que, de uma forma geral, os programas de Governo são instrumentos de natureza mais indicativa que imperativa. Assim, mais do que olhar para o enunciado no programa parece mais útil reflectir sobre as medidas decididas.

O ME, perdão o MECI, decidiu que as provas finais do 9º ano serão realizadas em papel e as provas de aferição do 2.º, 5.º e 8.º mantêm o formato digital.

A decisão no que respeita às provas finais parece-me adequada face aos riscos de potencial desigualdade entre alunos e de eficiência dos recursos das escolas.

Por outro lado, esses mesmo riscos, desigualdade entre alunos, dificuldades com equipamentos, insuficiência dos recursos e infra-estruturas, ameaçam a realização das provas de aferição que se mantêm.

Para além da decisão constituir um, mais um, atestado de menor importância para as provas de aferição que já são percebidas de forma desvalorizada, contraria o que parece ser um caminho de prudência e recuo na chamada transição digital em curso em muitos sistemas educativos.

Tem sido produzida evidência e conhecem-se medidas de política educativa que revelam a necessidade de equilíbrio e prudência na utilização dos recursos digitais, designadamente nos primeiros anos de escolaridade.

quarta-feira, 10 de abril de 2024

DO ABANDONO ESCOLAR

 Foi divulgado o Relatório do Tribunal de Contas, “Recomendações da Auditoria, “Abandono Escolar Precoce”. O TdC considera que o Governo, Ministério da Educação, não cumpriu as recomendações relativas ao abandono escolar já expressas no Relatório de 2022. Não estranho a conclusão como também não estranho a resposta do ME refutando as questões levantadas pelo TdC. Algumas notas no sentido em que já aqui tenho abordado a questão do abandono escolar que, inevitavelmente, deverá constar do caderno de encargos do novo Governo.

De acordo com dados do INE, o abandono escolar em 2023 foi de 8%. Considera-se abandono escolar a situação de jovens que não terminaram o secundário nem frequentam qualquer actividade de educação ou formação.

Em 2021 e 2022 registaram-se 6,7% e 6,5% valores que o ME considera atípicos pelo que compara com 2020 cuja taxa 8,9% ficou abaixo da média da UE que tem como objectivo para 2030 uma taxa de abando escolar precoce de 9%.

Recordo que no final de 2021 a Direcção-Geral de Estatística da Educação divulgou que estava a desenvolver uma ferramenta com o objectivo de avaliar e construir uma informação mais robusta sobre o abandono escolar. Em linha com o que já é feito noutros países pretende-se construir informação que permita o acompanhamento próximo do aluno e das escolas, identificando perfis de risco ou preditores de abandono que possibilitarão o desenvolvimento de intervenções oportunas prevenido e combatendo o abandono escolar.

Acresce a óbvia necessidade de que o abaixamento da taxa de abandono escolar signifique conhecimentos e competências adquiridas pelos alunos.

Como já aqui tenho abordado, existe forte incoerência nos resultados da avaliação interna, percursos de sucesso, e os dados das avaliações externas, provas de aferição, exames ou estudos comparativos internacionais.

No mesmo sentido, importa ainda recuperar que também em 2020 o Tribunal de Contas afirmava que no sistema educativo nacional não existem indicadores ajustados, a imprescindível avaliação externa, que permita conhecer "os reais números do Abandono em Portugal, frustrando quer a implementação eficiente das medidas preventivas e de recuperação dos alunos em Abandono ou em risco de Abandono, quer o direccionamento adequado do financiamento".

Na realidade, o abaixamento do abandono escolar precoce é fundamental e, sendo importante que os alunos não abandonem, é necessário assegurar que a sua continuidade tenha sucesso. Aliás, à semelhança do que tem sido o caminho da designada educação inclusiva, não basta que tenhamos os alunos com necessidades especiais “entregados” nas escolas regulares para que possamos falar de educação inclusiva.

Temos indicadores que mostram que muitos alunos, estando “ligados” à máquina educativa, ainda lutam, por razões diversas, por uma trajectória bem-sucedida e importa que cumprir a escolaridade signifique mesmo carreiras escolares promotoras de competências e capacidades como escrevi acima.

Só assim se promove a construção de projectos de vida viáveis, que proporcionem realização pessoal e base do desenvolvimento das comunidades.

Neste caminho é fundamental que a qualidade dos processos educativos e que a existência de dispositivos de apoio competentes e suficientes às dificuldades de alunos e professores na generalidade das comunidades educativas seja uma opção clara pois é uma ferramenta imprescindível à minimização do abandono e insucesso.

Por outro lado, importa não perder de vista a população que abandona e a que está em alto risco de que tal aconteça. Neste sentido é fundamental que a oferta de trajectos diferenciados de formação e qualificação ou iniciativas em desenvolvimento como o programa Qualifica, sucessor do Novas Oportunidades ou os anunciados no âmbito do ensino superior, tenham os meios necessários e se resista à tentação do trabalho para a “estatística”, confundindo certificar com qualificar.

Apesar dos indicadores de progresso é necessário insistir, merecemos e precisamos de mais e melhor sucesso e qualificação e menos abandono e exclusão.

terça-feira, 9 de abril de 2024

PROJECTO DE VIDA, A ESPERANÇA ADIADA

 Dados hoje divulgados de um estudo realizado por uma equipa do SINCLab. Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto, mostram que 65,6% dos jovens até aos 30 anos que trabalham recebem menos de 1000€ de salário sendo que as mulheres recebem menos 26%. Acresce que 24% do total não têm trabalho a tempo inteiro.

No que respeita à habitação, 87,7% dos inquiridos vive com a família. Recordo os dados do Eurostat de 2022, segundo os quais a idade média da saída de casa dos pais em Portugal está em 29,7. Em 2021 tinha a idade média mais alta da EU, 33,6 anos. A média europeia de 2022 é 26,4. Para comparação as idades médias mais baixas registam-se na Suécia, 21,4, e na Finlândia, 21,3.

Parece claro que os jovens portugueses continuam a experimentar dificuldades em construir projectos de vida autónomos e positivos. Num tempo em que tudo parece ser para hoje, boa parte dos jovens sentirá procurar um projecto de vida percebido para uma amanhã longínquo.

Estão identificadas dimensões contributivas para esta situação como a dificuldade em aceder a trabalho digno, a precariedade laboral, os custos elevados da educação e qualificação e os também elevados custos no acesso, renda ou compra, de habitação que como se sabe se acentuou dramaticamente nos últimos tempos.

Este cenário ajuda a perceber algumas das mais fortes razões pelas quais os jovens em Portugal abandonam a casa dos pais cada vez mais tarde e adiam projectos de vida que incluam paternidade e maternidade. Para além das questões de natureza cultural e de valores que importa considerar, bem como as políticas de família nos países do norte da Europa, as actuais circunstâncias de vida dos jovens e as implicações da conjuntura económica sustentam este cenário que provavelmente demorará a ser revertido.

Temos ainda um número muito significativo de jovens entre os 20 e os 34 anos que não estudam, nem trabalham, nem estão em formação, a geração “nem, nem" ou, na terminologia em inglês os jovens NEET (Not in Education, Employment or Training). Acresce que uma parte significativa não está inscrita nos Centros de Emprego.

Parece importante assinalar que esta situação afecta sobretudo os jovens com menos qualificações o que também não é novo. A exclusão escolar é quase sempre a primeira etapa da exclusão social.

A estes indicadores, já a merecer preocupação, deve juntar-se os dados sobre precariedade, abuso do recurso a estágios e outras modalidades de aproveitamento de mão-de-obra barata e a prática de vencimentos que mais parecem subsídios de sobrevivência mesmo para jovens altamente qualificados.

Esta situação complexa e de difícil ultrapassagem tem obviamente sérias repercussões nos projectos de vida das gerações que estão a bater à porta da vida activa. Entre outras, contar-se-ão o retardar da saída de casa dos pais por dificuldade no acesso a condições de aquisição ou aluguer de habitação própria ou o adiar de projectos de paternidade e maternidade que por sua vez se repercutem no Inverno demográfico que atravessamos e que é uma forte preocupação no que respeita à sustentabilidade dos sistemas sociais. As gerações mais novas que experimentam enormes dificuldades na entrada sustentada na vida activa, vão também, muito provavelmente, conhecer sérias dificuldades no fim da sua carreira profissional.

No entanto, um efeito potencial, mas menos tangível desta precariedade no emprego e na construção de um projecto de vida autónomo e sustentado, é a promoção de uma dimensão psicológica de precariedade face à própria vida no sentido global e que, com alguma frequência, os discursos das lideranças políticas acentuam. Dito de outra maneira, pode instalar-se, está a instalar-se nos jovens, uma desesperança que desmotiva e faz desistir da luta por um projecto de vida de que se não vislumbra saída mobilizadora e que recompense.

O aconchego da casa dos pais pode ser a escapatória para a sobrevivência, mas potenciar o risco da desistência o que certamente poderá ter implicações sérias.

segunda-feira, 8 de abril de 2024

O TERCEIRO PERÍODO

 Estamos num tempo de alguma expectativa face ao que no imediato e a prazo serão as políticas públicas de educação que, provavelmente começarão a ser conhecidas as políticas públicas de educação. Confesso que face ao programa e entendimentos já divulgados publicamente pelos elementos da equipa do ME, a expectativa é baixa e tenho algumas inquietações que não gostava de ver confirmadas.

Entretanto, cumprindo os tempos que creio ainda serem os da esmagadora maioria das escolas, inicia-se hoje o terceiro período escolar.

Para muitos alunos será o período da decisão, das decisões. Uma boa parte dos alunos estará já "arrumada", ou porque convivem com um "chumbo" anunciado ou porque terão perspectivas de sucesso, com excelência ou com suficiência. Para quase todos os outros o terceiro período é o da recuperação, a última tentativa para "salvar" o ano. Alguns destes alunos ainda poderão ser incorporados no “contingente” da avaliação simpática, por vezes forçada, que compõe as estatísticas que alimentam os percursos de sucesso.

Também existe um grupo significativo de alunos dos quais se espera que recuperem o rendimento escolar de forma a salvar o ano, pelo que crescerá exponencialmente o recurso à velha "explicação", um importante nicho de mercado para professores, ex-professores, candidatos a professores ou simples curiosos que se dedicam à lucrativa arte. Aliás, ainda durante as férias de Páscoa muitas crianças e adolescentes terão passado já algum tempo nos centros de explicações. É preciso ir adiantando para garantir a "recuperação", a nota que permita “passar” ou dê acesso ao curso escolhido, pelo aluno ou pela família.

É também um período de promessas, "se passares, nós oferecemos-te ...", "se tiveres notas para entrar, terás ...". Chamam-se incentivos e providenciam, esperam os pais, uma ajuda extra à motivação para este terceiro período.

Para alguns alunos este terceiro período vai anteceder, espera-se uma mudança, de ciclo, de escola ou a por muitos desejada passagem para o ensino superior, esperemos que não desistam de estudar.

No final do ano uma parte dos alunos ainda vai realizar algumas provas ou exames. No 2.º, 5.º e 8.º ano teremos provas de aferição (que, de facto, não são de aferição) desmaterializadas, decisão que levanta sérias dúvidas sobretudo no 1º ciclo por razões que já aqui referi. Talvez fosse de apostar mais na desburocratização e na “desgrelhação” dos processos que realização de provas em suporte digital. No 9º e 12º teremos os exames com as mudanças já verificadas no ano anterior.

No entanto, para outros alunos, o terceiro período vai deixá-los mais perto do insucesso, da desmotivação, do abandono revoltado ou resignado. Eles terão falhado, mas não terão sido só eles, nós também.

Existe ainda um grupo de alunos que, à luz de um novo paradigma e de uma onda de inovação, vive dentro de espaços curriculares ou físicos que os podem “guetizar” e de quem também não se espera muito, são “adicionais”, são “selectivos”, são “redutores”, são outra qualquer designação muitas vezes começada em “dis”, que procuram sobreviver a ambientes que nem sempre são muito amigáveis e inclusivos apesar de algumas boas práticas que se saúdam e registam.

Na verdade, os próximos meses vão ser pesados, exigentes, apesar de haver quem entenda como fáceis os trabalhos dos alunos … ou dos professores.

Boa sorte e bom trabalho, para alunos, professores e pais.

domingo, 7 de abril de 2024

ECRÃS NA VIDA DAS CRIANÇAS

 Na SIC Notícias encontra-se uma peça, “Agarrados ao ecrã”, sobre a relação dos mais novos com os ecrãs que merece atenção e divulgação. Realizado por investigadores da Universidade de Aveiro mostra que o tempo excessivo que crianças de 4 e 5 anos podem passar em frente a um ecrã tem um impacto negativo no desenvolvimento da linguagem. Ainda assim, importa sublinhar que não devemos diabolizar os recursos digitais, mas sim, promover uma utilização adequada.

Muitas vezes aqui tenho abordado esta questão assim como, frequentemente, é tema de conversas com pais e educadores. Retomo algumas notas.

Em Agosto de 2023 foi publicado pela revista JAMA Pediatrics um trabalho, “Screen Time at Age 1 Year and Communication and Problem-Solving Developmental Delay at 2 and 4 Years”, em que se analisa a relação entre o tempo de exposição a ecrãs com riscos no seu desenvolvimento. Estar um tempo superior a duas horas em frente aos diversos tipos de ecrãs pode potenciar o risco de atraso no desenvolvimento nos anos seguintes.

A investigação envolveu 7097 crianças e concluiu que quanto maior for o tempo de exposição maior a probabilidade de compromissos no desenvolvimento, designadamente nas comunicação e resolução de problemas embora se reflicta noutras áreas e aumente com maior exposição.

O trabalho parece ser suficientemente robusto para que consideremos esta questão que tem estado na agenda e aumentou exponencialmente com os períodos de confinamento e para muitas crianças o ecrã é algo omnipresente no seu dia-a-dia.

Recordo ainda um trabalho divulgado em 2020 e que aqui comentei “Social inequalities in traditional and emerging screen devices among Portuguese children: a cross-sectional study” publicado em BMC Public Health e realizado por uma equipa do Centro de Investigação em Antropologia e Saúde da Universidade de Coimbra que também mostra dados que devem ser levados em conta.

O trabalho envolveu 8.430 crianças entre os três e os dez anos e sugere que até aos cinco anos as crianças passam por dia e em média 154 minutos em frente a um ecrã considerando os diferentes dispositivos disponíveis. Nas crianças mais velhas o tempo de exposição é superior, 201 minutos em média. Independentemente de outras variáveis como género, idade ou dispositivo utilizado, o tempo de exposição é sempre maior em famílias de menor estatuto académico e económico.

Recordo que em 2023 a agência francesa de saúde pública lançou um novo alerta a partir de estudos realizados relativos à exposição excessiva das crianças aos ecrãs, sobretudo nas crianças até aos três anos.

Sublinhe-se também que a OMS, tal como a Associação Americana de Pediatria, indicam extrema prudência para crianças até aos dois e anos e aconselham a que tempo de exposição ao ecrã não exceda uma hora diária até aos cinco anos e duas horas depois dos seis anos.

Uma pequena nota para referir que estando numa conversa com pais a propósito destas questões, referi estas orientações da OMS. Um pai pede a palavra para me dizer, “isso são opiniões”. Felizmente, para comentar tive a ajuda de alguns pais. É que já não tenho muita paciência.

Estão também identificados os riscos da sobreexposição, sedentarismo e obesidade, falta de qualidade e tempo de sono ou alterações no desenvolvimento, por exemplo na linguagem como mostra o estudo que justificou estas notas. A evidência também sugere que os riscos aumentam quando, como é frequente, a presença excessiva em frente de um ecrã está associada a um menor nível de interacção com adultos, designadamente com os pais.

Como tantas vezes já tenho referido, o ecrã, qualquer ecrã, é hoje a “baby-sitter” de muitíssimas das nossas crianças e adolescentes que neles, ecrãs, passam um tempo enorme “fechados”. Por vezes, sobretudo em adolescentes e jovens, "acompanhados" de outros tão sós quanto eles.

Acontece também que, como referido acima, durante o período de sono e sem regulação familiar muitas crianças e adolescentes estarão diante de um ecrã, pc, tv ou "smartphone". Desculpem insistir nestas questões, mas, como é óbvio, esta situação não pode deixar de implicar consequências nos comportamentos durante o dia, sonolência e distracção, ansiedade e, naturalmente, o risco de falta de rendimento escolar num quadro geral de pior qualidade de vida.

Comer é necessário e faz bem às crianças, mas comer excessivamente e produtos de má qualidade, provocam sérios problemas de saúde. Que se eduque o consumo, sem se diabolizar ou exaltar o produto.

Estas matérias, a presença das novas tecnologias na vida dos mais novos, são problemas novos para muitos pais, alguns deles com níveis baixos de alfabetização informática, sobretudo no que respeita aos riscos, como constato em muitas conversas que mantenho com grupos de pais.

Considerando as implicações sérias na vida diária e que só estratégias proibicionistas não são muito eficazes, importa que se reflicta sobre a atenção e ajuda destinada aos pais para que a utilização imprescindível seja regulada e protectora da qualidade de vida das crianças e adolescentes.

sábado, 6 de abril de 2024

DEIXEM LÁ VER

 O novo Governo já tomou posse e na próxima semana conhecer-se-á o programa que, provavelmente, será viabilizado.

Umas notas relativas à educação. Como tem sido anunciado e seria previsível, o Ministério de Educação começará a negociação que desencadeie a reposição progressiva das perdas na carreira docente. Esta será a parte mais fácil e o tão referido excedente que talvez não seja assim tão excedente, permitirá acomodar a medida.

Apesar de se conhecerem os programas eleitorais, sabemos que … são apenas programas eleitorais, pelo que há que aguardar a divulgação e eventual aprovação do programa do governo.

Em matéria de políticas públicas de educação existem, como sempre, algumas dimensões cuja gestão e desenvolvimento é imperativo conhecer.

Sem hierarquizar ou esgotar vejamos alguns aspectos.

Qua ajustamentos podemos esperar nos modelos de formação, contratação, avaliação e carreira dos professores, bem como da sua valorização e capacidade de atracção.

Como evoluirá, ou não, a autonomia e o modelo de governança de escolas e agrupamentos.

O que poderemos esperar em matéria de municipalização da educação e o que acontecerá na área da transição digital que a transforme em ferramentas e não em problemas e excessos inúteis ou até com efeitos negativos.

Como será definida a imprescindível avaliação externa, provas de aferição, exames, em que anos com que contornos se realizarão ou não.

Que medidas ou orientações teremos, ou não, para minimizar a asfixiante carga de burocracia com que professores e escolas têm de lidar.

Que recursos e dispositivos poderão mobilizar as escolas no sentido de responder à diversidade de populações e alunos e às inúmeras situações de desigualdade de forma a promover sucesso e não a “fabricar” sucesso que não significa aprendizagem como a disparidade entre avaliação externa e interna frequentemente sugere.

Esta abordagem não é exaustiva e teremos de aguardar pelo programa do Governo e, sobretudo, pela sua operacionalização.

Como dizemos no Alentejo, deixem lá ver.

sexta-feira, 5 de abril de 2024

OS DIAS MÁGICOS

Os dias, todos os dias, nos mostram algo, nos dão algo ou nos tiram algo. O dia 5 de Abril assim é e, desculpar-me-ão, cá estou de novo a recordar a perplexidade e o gozo da última grande descoberta nesta minha viagem que já vai longa, a avozice. É sempre assim a cada 5 de Abril ou 4 de Julho e sempre assim será enquanto não chegar o dia que nos tira tudo.

Cumprem-se hoje oito anos desde que entrei pela segunda vez no mundo encantado, no mundo mágico da avozice, nasceu o Tomás. O tempo voa e o tempo dos velhos parece que voa mais depressa.

Esta mudança de geração tem sido uma bênção em cada dia que passa e contribui decisivamente para cumprir a narrativa de um Homem de sorte, eu.

Felizmente, as circunstâncias têm mantido os netos por perto. Às vezes, quando brincam ou quando dormem, fico assim a olhar para eles, para os meus netos, o grande neto Grande, o Simão, que nasceu há dez anos e o grande neto Pequeno, o Tomás, agora com oito e fico a imaginar que viagens irão fazer. Nessas alturas sinto-me assim …  desculpem o atrevimento... um anjo da guarda.

Na verdade, que mais deve ser um pai ou um avô que não um anjo da guarda.

Às vezes, não sabemos, não percebemos, não queremos ou não podemos.

Mas é bonito, muito bonito.

A magia da avozice recorda-me sempre, já aqui o contei, a fala de um Velho de Cabo Verde, amigo do meu amigo Amílcar, que dizia a propósito do quanto gozava a sua condição de avô, "Se soubesse que ter netos era assim, tinha tido os netos antes dos filhos".

Acho engraçada a ideia e elucidativa deste mundo mágico, ser avô.

No entanto, a ordem das coisas é a ordem das coisas, cresce um filho até ser Gente, vão crescer os netos até serem Gente.

E eu espero estar por perto mais algum tempo.


terça-feira, 2 de abril de 2024

SINALIZADOS

 Uma peça do JN retoma o relatório recentemente divulgado pela Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, “Síntese de resultados - Suporte à aprendizagem e à Inclusão, 2022/2023”, que já aqui referi.

Considerando um total de 88 682 alunos sinalizados e com Relatório Técnico Pedagógico, 39529 (44,6%) receberam pelo menos um apoio especializado nos termos definidos pelo DL 54/2018 que também prevê que os alunos possam beneficiar de mais do que um apoio especializado.

Este dado sobre os alunos sinalizados e o que daí decorre ou não, lembrou-me uma história que já aqui contei, a história do Sinalizado.

Era uma vez um rapaz chamado Sinalizado. Filho de uma mãe muito nova e pouco preparada para ser mãe, nasceu antes de tempo e ficou Sinalizado, nome curioso. E assim continuou.

Em pequeno, devido às condições muito precárias e com bastante dificuldade em que a sua família vivia, continuou Sinalizado.

À entrada na escola com a mochila que já carregava logo perceberam que devia ser Sinalizado. E foi. Toda a gente conhecia o Sinalizado, toda a gente sabia das circunstâncias de vida do rapaz, por isso mesmo era um Sinalizado.

Mais crescido, os problemas em que estava frequentemente envolvido continuavam a fazer com que o Sinalizado assim continuasse, Sinalizado.

Já no final da adolescência o Sinalizado envolveu-se em algo de mais grave e sucedeu uma tragédia que encurtou a sua vida.

Muita gente que conhecia o Sinalizado se interrogava e dizia ter dificuldade em perceber como podia tal vida ser vivida por um Sinalizado. Até foi notícia de rodapé em alguns jornais mais dados a estas coisas que acontecem aos Sinalizados.

Mas isto, desculpem lá, foi só uma história triste e sem jeito. Os Sinalizados raramente entram em histórias bonitas e bem contadas.

segunda-feira, 1 de abril de 2024

OS DIAS DAS MENTIRAS

 Como acontece com quase tudo o que está no nosso mundo, as mentiras também têm o seu dia, o 1 de Abril. Lembro-me que ainda miúdo o dia 1 de Abril era aguardado com alguma excitação. Numa rígida matriz judaico-cristã em que a ideia do pecado desempenha um papel essencial, ter um dia em que se pode pecar, mentir, era algo de estimulante. Esmerávamo-nos na tentativa de criar a melhor das mentiras.

A imprensa tinha, alguma tem ainda, o hábito de colocar uma mentira e ficaram célebres algumas das que ao longo dos anos fizeram primeiras páginas de jornais ou abertura de noticiários televisivos.

O problema grande é que nos tempos que atravessamos não temos O Dia das Mentiras. Numa espécie de concorrência desleal vivemos nos dias das mentiras. Com a capacidade de inovação que caracteriza a humanidade agora fala-se “pós-verdade”, “factos alternativos” ou, em inglês é mais sofisticado, em “fake news”. O processo de “fact check” tornou-se imprescindível e nem sempre esclarecedor.

Os padrões éticos da nossa vida política, económica e social baixaram e a mentira, as mentiras, são regra, deixaram de ser excepção seja qual for a designação.

Mente-se para alimentar relações laborais precárias e lesivas dos direitos das pessoas a projectos de vida viáveis e positivos.

Mente-se para proteger agendas pessoais ou interesses corporativos.

Mente-se para manipular ou alimentar clientelas que sirvam de patamar para o poder, os poderes, pequenos ou grandes e de natureza diferenciada.

Mente-se para fazer ou pedir um “jeitinho” que só varia na escala, dos cêntimos aos milhões.

Mente-se para legitimar decisões incompreensíveis.

Mente-se para vender ilusões ou promessas.

domingo, 31 de março de 2024

A COMICHÃO DO CRESCER

 A meio das férias escolares da Páscoa e num dia de encontro em muitas famílias, deixem-me recuperar umas notas relativas aos mais novos e aos que deles cuidam, os pais, sobretudo, mas também os professores.

Não é raro que a entrada na pré-adolescência e adolescência seja acompanhada pelo aparecimento de uma irritante comichão decorrente das "borbulhas" do crescimento. Ainda menos raramente, os pais dos miúdos que entram nesta fase desenvolvem também uma fortíssima comichão resultante dos comportamentos, nem sempre esperados ou entendidos, dos seus miúdos.

A esta fase de comichão em filhos e pais corresponde também com alguma frequência uma espécie de afastamento e abaixamento dos níveis de comunicação recíprocos o que, naturalmente, acentua a comichão que sendo ela irritante, acaba por deixar todos muito irritados.

Como também é previsível nestas idades, os miúdos tendem a procurar os anti-histamínicos junto dos amigos que, claro, também atravessam um período em que sentem a comichão do crescer e "padecem" das mesmas inquietações.

Por outro lado, os pais, muitas vezes assustados, não sabem como procurar os miúdos e viram-se, na melhor das hipóteses para outros pais com comichão e falam deles, dos filhos, não falando com eles, os filhos. Na pior das hipóteses, os mais assustados escondem, tentam esquecer e não sentir a preocupação com a comichão, esperando que a simples passagem do tempo, que se deseja rápida, a cure.

Talvez fosse de recordar que a comichão do crescer é algo de absolutamente natural e, como talvez se lembrem, nem sempre é fácil crescer, ficar diferente.

Assim, a gente mais crescida, mais experiente, estando atenta aos sinais, pode contribuir para tranquilizar os miúdos, não se assustando, dando-lhes espaço e tempo para perceber que vão ser capazes de lidar com a comichão do crescer.

Talvez o tempo de férias que se está a passar proporcionar mais algum desse tempo e desse espaço. Será bom para todos.

sexta-feira, 29 de março de 2024

O FUTURO É AGORA

 É conhecido o novo governo e, naturalmente, o novo Ministro da Educação, a área de que estou mais próximo. Dado o perfil de Fernando Alexandre aguardo pela divulgação da equipa que formará.

São conhecidas as áreas do universo da educação que exigem mudanças o que não significa necessariamente fazer o “novo”, mesmo por um “novo” governo, um novo ME.

Em educação, mas não só, cansa-me a narrativa da inovação. Mudar algo na forma como se faz ou nos objectivos que se definem, não é o mesmo que inovar, fazer qualquer coisa de novo, seja lá o que for.

Nestas matérias, talvez de forma simplista, mas é intencional, penso como Almada Negreiros quando referia na "Invenção do Dia Claro”, "Nós não somos do século de inventar palavras. As palavras já foram inventadas. Nós somos do século de inventar outra vez as palavras que já foram inventadas”. Dito de outra maneira, e recorrendo a Pedro Abrunhosa, “fazer o que ainda não foi feito” e sabemos que precisa de ser feito.

O desenvolvimento das comunidades exige ajustamentos regulares no que fazemos em matéria de educação e em todos os patamares do sistema. Umas vezes melhor, outras vezes com mais sobressaltos temos feito um caminho importante e muito mais ainda vamos ter de fazer, mas os ajustamentos que decorrem da regulação e avaliação não têm que ir atrás da “mágica” ideia da inovação.

As escolas são o agora, o presente, e é neste presente que se constrói o futuro. Não existem poções mágicas em educação por mais desejável que possa parecer a sua existência e desafiante a chuva de discursos e projectos de inovação.

Também sei, tantas vezes escrevo e afirmo, que são necessárias mudanças que acompanhem o tempo. As mudanças reflectem-se em dimensões como currículo e organização, práticas e metodologias, autonomia, organização e recursos das escolas, valorização profissional e social dos professores, etc.

Tal como as crianças que só aprendem a partir do que já sabem, nós também só mudamos a partir do fazemos e do que sabemos. Este processo assenta num processo que deve ser robusto e apoiado de auto-regulação e regulação que envolve actores e estruturas, ou seja, o aluno, o professor, a escola, o ME, o sistema educativo. Dito de outra maneira, a escola do futuro, seja lá isso o que for, constrói-se valorizando e cuidando da escola do presente, o futuro é agora.

Como se diz por aqui no Alentejo, deixem lá ver.

quinta-feira, 28 de março de 2024

A HISTÓRIA DO PUZZLE

 Era uma vez um rapaz chamado Puzzle. É um nome um bocado estranho para um rapaz ter, mas era mesmo o nome dele.

Quando nasceu, através de um exercício frequente nas famílias, descobriram ou quiseram descobrir que ele tinha os olhos da mãe Maria, a testa e o nariz do pai João, o cabelo do avô paterno Manuel e a boca da avó materna Leonor.

À medida que crescia o Puzzle ficava mais complexo, tinha o andar e o feitio do pai João, a maneira doce de falar da mãe Maria e um ar esperto e atento do avô materno António. Na escola a esperteza era a da mãe Maria e o comportamento era o do pai João e tinha ainda a vontade de despachar tudo bem depressa, mesmo se não estivesse muito perfeito, que era tal e qual o avô Manuel.

O Puzzle foi crescendo e um dia, um sobressalto daqueles muito grandes, que por vezes a vida proporciona sem se esperar, fê-lo dar um tombo, um tombo muito sério que deixou o Puzzle bastante maltratado. Com a energia que a vontade de continuar vivo lhe emprestava, tentou erguer-se de novo, mas sentiu a maior das dificuldades para juntar aquelas peças todas de que era feito.

Após muitos esforços e recaídas, decidiu que ficaria só com aquilo que era seu e até mudou o nome, agora chama-se Eu.

quarta-feira, 27 de março de 2024

NOTÍCIAS DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA

 A Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência divulgou num relatório sobre o estado da “educação inclusiva” em 2022/2023. Uma nota breve.

Considerando a terminologia do DL 54/2018, em 22/23 88682 alunos, (cerca de 8% do total) foram abrangidos por “medidas selectivas e/ou adicionais de suporte à aprendizagem e à inclusão”. Este indicador representa um aumento de 13% face a 20/21.

Em 2018 o ME decidiu que já não podíamos referir alunos com “necessidades educativas especiais” porque a designação não era conforme a “educação inclusiva”, categorizava alguns alunos o que não é uma boa prática. Assim, determinou que os alunos que revelavam algum tipo de dificuldade eram objecto de medidas educativa arrumadas em três categorias, as medidas “universais”, as medidas “selectivas” e as medidas “adicionais”. Isto parece que é uma outra forma de categorizar, mas não é. Na educação inclusiva é assim que se faz.

De resto, não sabemos, eu não sei, muito bem como interpretar os dados globais, aumenta o número de alunos com dificuldades de alguma natureza, ou aumenta o número de alunos com medidas aplicadas. E onde param as dificuldades dos alunos que se inscrevem nas medidas “universais” e assim ficam incluídos.

No que respeita a recursos, verifica-se um aumento de 1,4% nos docentes e de 8% de técnicos especializados face a 20/21.

Como se refere na peça do Público, as escolas continuam a revelar sérias dificuldades em matéria de recursos. Estranha e de forma desajustada, o Público ainda fala de alunos com necessidades especiais, embora refira que o ME decretou o fim da sua utilização o que como sabemos foi claramente seguido pela comunidade educativa.

Portanto … nada de novo na educação inclusiva.

terça-feira, 26 de março de 2024

FUGA EM FRENTE

 Ficámos a saber que o ME colocou 6,5 milhões de euros ao dispor das escolas para que estas pudessem proceder à substituição dos computadores avariados a tempo de realizar em formato digital as provas de aferição do 2.º, 5.º e 8.º bem como as provas finais do 9.º.

As escolas, de acordo com Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas, e Manuel Pereira, da Associação Nacional de Directores Escolares, foram apanhadas de surpresa e não receberam orientações relativas aos procedimentos administrativos habituais e exigidos nos processos de aquisição.

Por outro lado, o recurso aos professores de informática para o desempenho de técnicos de informática, para além da questão das funções que lhes tão cometidas, também não resolve os muitos problemas das escolas.

A teimosia com que o ME insiste num caminho, a chamada transição digital, que claramente está a ser questionado em muitos sistemas educativos que reajustam a forma como os recursos digitais devem ser usados nas escolas e salas de aula, leva a uma espécie de fuga em frente que temos dificuldade em atender.

Acresce que todo este processo parece informado pela conhecida lei de Murphy que se pode traduzir em algo como “o que o que pode correr mal, está mesmo a correr mal”. Numa versão mais portuguesa podemos recordar a muito conhecida “cada cavadela, cada minhoca”.

Continua a divulgação de inúmeras dificuldades e de diferente natureza que as escolas, professores e alunos estão a sentir com os recursos informáticos, desde questões de natureza técnica, qualidade dos equipamentos e do acesso a rede, avarias e dificuldades de reparação, às de natureza administrativa(?), garantias caducadas ou dificuldade de substituição, por exemplo.

Queria muito estar enganado, os meus netos também realizam este ano provas de aferição, mas creio que as dificuldades e assimetria de recursos possam ter um impacto negativo e potenciem disparidade entre escolas e alunos,  

Esta fuga para a frente rebocada pelo deslumbramento com o novo mantra, transição digital, poderá gerar problemas de que ninguém assumirá a responsabilidade.

Nada de novo. Lamentavelmente.

domingo, 24 de março de 2024

A LONGA MARCHA DA DESMATERIALIZAÇÃO

 Segundo o Público está a decorrer uma petição já assinada por mais de duas mil pessoas com o objectivo de pedir o fim do projecto-piloto do uso de manuais digitais nas escolas. A petição será entregue em Abril na Assembleia da República.

Em 23/24 está em curso a 4ª fase do Projecto-Piloto Manuais Digitais envolvendo 160 escolas e 23.159 alunos do 3.º ao 12.º ano de todo o país.

O recurso aos manuais em suporte digital é mais um passo na longa marcha para a desmaterialização ou transição digital como também lhe chamam. É verdade que temos andado enredados numa trapalhada sobre a devolução ou não devolução dos manuais do 3º e 4º ano, na aceitação ou na aceitação dos manuais usados e escritos pelos miúdos, mas isto são minudências no que não atrapalham o deslumbrado chamamento sentido pelo ME.

Continuo cada vez mais convencido da necessidade de reflexão sobre esta questão. Será certamente interessante o acesso a um Relatório de 2023 da Unesco, “Technology in education: A tool on whose terms?”. Também se registam iniciativas e análises em diferentes sistemas educativos que pretendem repensar a utilização dos recursos digitais. Mais perto, volto a sugerir estimulante texto de Francisco Laranjo, “Regresso ao futuro da escola: dos ecrãs aos livros” divulgado no Público há algum tempo e que aqui reflecti retomando as notas da altura.

Apesar do seu enorme potencial as ferramentas digitais não são a poção mágica para o ensino e aprendizagem. Os computadores ou tablets na sala de aula, os smart boards, não promovem sucesso só pela sua existência. A forma como são utilizados por professores e alunos é que pode potenciar a qualidade e os resultados desse trabalho. Aliás, o mesmo se pode dizer de qualquer outro recurso ou actividade no âmbito dos processos de aprendizagem.

É certo que múltiplos estudos e experiências valorizam estes recursos nos processos de ensino e aprendizagem pelo que é importante garantir o acesso pela generalidade dos alunos, mas, não podem passar a ser o tudo no trabalho escolar.

Neste contexto e como já tenho afirmado, considerando o que se sabe em matéria de desenvolvimento das crianças e adolescentes, dos processos de ensino e aprendizagem e da sua complexa teia de variáveis, das experiências e dos estudos neste universo, mesmo quando aparentemente contraditórios:

1 – O contacto precoce com as tecnologias digitais é, por princípio, uma experiência positiva para os alunos, para todos os alunos, se considerarmos o mundo em que vivemos e no qual eles se estão a preparar para viver. Nós adultos ainda estamos a pagar um preço elevado pela iliteracia, os nossos miúdos não devem correr o risco da iliteracia informática. Os tempos da pandemia mostraram isso mesmo.

2 – O computador/tablet, kits robóticos, smart boards, etc., na sala de aula são mais uma ferramenta, não são A ferramenta, não substituem a escrita manual e a leitura em papel, não substituem a aprendizagem do cálculo, não substituem coisa nenhuma, são “apenas” mais um meio, muito potente sem dúvida, ao dispor de alunos e professores para ensinar e aprender e agilizar o acesso a informação e conhecimento.

3 - O que dá qualidade e eficácia aos materiais e instrumentos que se utilizam na sala de aula não é a tanto a sua natureza, mas, sobretudo, a sua utilização, ou seja, incontornavelmente, o trabalho dos professores é uma variável determinante. Posso ter um computador para fazer todos os dias a mesma tarefa, da mesma maneira, sobre o mesmo tema, etc. Rapidamente se atinge a desmotivação e ineficácia, é a utilização adequada que potencia o efeito as capacidades dos materiais e dispositivos.

4 - Para alguns alunos com necessidades especiais o computador pode ser mesmo a sua mais eficiente ferramenta e apoio para acesso ao currículo.

5 – Para além de garantir o acesso dos miúdos aos materiais é obviamente imprescindível promover o acesso a formação e apoio ajustados aos professores sem os quais se compromete a qualidade do trabalho a desenvolver bem como, evidentemente, assegurar as condições exigidas para que o material possa ser rentabilizado. São por demais conhecidas as dificuldades sentidas nas escolas com os recursos e acessibilidade.

6 – Finalmente, como em todo o trabalho educativo, são essenciais os dispositivos de regulação e avaliação do trabalho de alunos, professores e escolas. Estes dispositivos devem incluir avaliação externa.

Como referi acima, não existem poções mágicas em educação por mais desejável que possa parecer a sua existência. Não deixemos que o fascínio deslumbrado pelo que se julga ser as "salas de aula do futuro" faça esquecer os problemas das salas de aula do presente.

sábado, 23 de março de 2024

FINALISTAS, UM "ESPÍRITO" E UM NICHO DE MERCADO

 No JN encontra-se uma peça sobre as viagens de finalistas do secundário. Embora possa parecer estranho, o universo da educação também tem produtos sazonais, as viagens de finalistas são um deles.

De facto, por esta altura surge inevitavelmente um fenómeno migratórío que atinge um grupo social extremamente importante e organizado por camadas etárias, os diversos grupos de finalistas, sobretudo os do secundário.

Assim que me lembre e tanto quanto consigo acompanhar, temos finalistas da educação pré-escolar, os finalistas do ensino básico, no 9º ano, os finalistas do ensino secundário, os finalistas do 1º ciclo do ensino superior, a licenciatura inventada pela bolonhesa ideia e os finalistas do 2º ciclo do ensino superior, os que abandonam o superior após cinco anos de estadia.

Os finalistas transformaram-se num nicho de mercado apetecível e rentável. Realizam-se festas e viagens de finalistas em todas as faixas etárias, iniciativas que as instituições acarinham e às quais os pais não sabem como resistir, é o espírito da escola, o convívio, a juventude, o divertimento, etc. etc. Provavelmente, devido ao momento mais optimista que vivemos as dificuldades de anos anteriores foram revistas em baixa e a coisa parece bem, oferta esgotada, lista de espera, etc.

Sem estranheza também este produto tem riscos de contrafacção e qualidade, são recorrentes as queixas e as situações de incumprimento ou expectativas criadas e não cumpridas.

Nos últimos anos a migração, sobretudo no que respeita aos alunos do secundário, tem tido alguma vigilância das autoridades e parece haver alguma maior preocupação dos pais face à experiência iniciática e aos riscos decorrentes dos excessos nos consumos e na adrenalina. São conhecidas situações muito sérias com consequências graves e experiências radicais como o “balconing”, salto do quarto de hotel para a piscina.

Como já tenho escrito, devo sublinhar que estas notas não têm qualquer intenção moralista e também gostava de dizer que o meu filho fez parte, provavelmente, das primeiras gerações de estudantes do secundário que rumaram a Lloret de Mar, já lá vão uns anos. Eu ainda sou do tempo da viagem de finalistas do secundário se quedar por três ou quatro dias a viajar pelo norte do país, isto lá para os idos de sessenta.

A oferta nas estâncias balneares olha para este nicho de mercado, os estudantes portugueses e não só, como uma fonte extremamente significativa de receitas em época baixa no turismo com destino praia. Nesse sentido, de forma mais ou menos explícita, toda a estrutura, hotelaria, restauração, divertimento nocturno ou lazer, esmeram-se no sentido de criar a apetência por uma “histérica” e desregulada “desbunda” cheia de pica e adrenalina, o famoso espírito de Lloret, dos vários “Llorets” que o mercado vai gerando. No “espírito de Lloret” tudo cabe, os jovens soltam-se e apesar de causarem uns "estragos", uns distúrbios e alguns excessos, no final das contas, a operação compensa, aliás, segundo a opinião expressa dos empresários locais, os ingleses são piores, claro, não é novo, somos gente habitualmente bem comportada, não criamos muitos problemas e deixamos os apetecidos euros.

Talvez seja mesmo necessário adequar a fiscalização da oferta nestas paragens, por exemplo das campanhas indutoras do consumo de álcool.

Para não variar, isto é conversa de velho, a malta precisa de se divertir, depois de dois períodos de árduo estudo e antes da dura recta final dos exames.

Para o ano há mais.

Entretanto … quando lá estiverem divirtam-se.

sexta-feira, 22 de março de 2024

A INDISCIPLINA ESCOLAR

 No Público divulga-se que organizações representativas dos professores, directores escolares e pais tomaram a iniciativa de criar um Observatório da Convivência Escolar, com o objectivo de ajudar a denunciar e a monitorizar a indisciplina nas escolas.

Na notícia é também referida a séria preocupação como o bullying nas suas diversas formas, designadamente o cyberbullying e a violência.

Parece claro que indisciplina escolar, bullying e violência são comportamentos inadequados, muitas vezes graves e que provocam sofrimento, mas merecem uma abordagem diferente ainda que, naturalmente, estejam interligados e com frequência realizados pelos mesmos alunos.

Ainda assim parece-me pertinente algumas notas sobre o comportamento dos alunos em sala de aula, designadamente, as situações de indisciplina que tanto solicitam a intervenção dos docentes com impacto nas actividades de ensino e aprendizagem e constituem tema recorrente no trabalho realizado com professores.

Sobre esta questão recordo que o trabalho da OCDE, “TALIS 2018 Results (Volume I) Teachers and School Leaders as Lifelong Learners”, referia que em Portugal e de acordo com as respostas dos docentes inquiridos, o tempo gasto em sala de aula no controle do comportamento dos alunos é superior à média da OCDE. Nas nossas salas de aula, 73.5% do tempo é usado em actividades de ensino e aprendizagem e na OCDE a média é de 78.1% sendo o tempo restante dedicado a questões de burocracia, controle de assiduidade e, sobretudo ao controlo do comportamento. Aliás, o comportamento é também um dos factores fortemente associados aos níveis de cansaço e risco de exaustão verificados na classe docente e potenciados pela elevada média de idades.

Em primeiro lugar julgo que importa clarificar o que está em causa. Quebrar as regras de funcionamento da sala de aula ou da escola serão indisciplina, insultar, humilhar, confrontar fisicamente um professor, comportamentos frequentes de agressão ou roubos a colegas configuram pré-delinquência ou delinquência e comportamentos disruptivos podem ainda estar ligados a perturbações de natureza psicológica, daí a introdução.

A escola, os professores, não pode ser responsabilizada e considerada competente para lidar e “resolver” todo este universo de problemas nos comportamentos dos mais novos. Para situações de pré-delinquência ou perturbações do comportamento pode, evidentemente, dar contributos, mas não assumir a responsabilidade pelo que importa clarificar a análise.

Centremo-nos então na indisciplina escolar que considero matéria de competência da escola e matéria de responsabilidade de toda a comunidade, incluindo obviamente os pais.

Ainda no 1º ciclo e de uma forma geral as crianças têm um entendimento ajustado sobre quais os comportamentos adequados em sala de aula que, naturalmente, com a idade se torna mais sólido. Assim sendo e numa abordagem simples, sabendo as crianças e adolescentes quais os comportamentos adequados por que razão ou razões não os assumem de forma consistente? Não estou a falar de alunos “certinhos”, testar regras e limites faz parte do desenvolvimento, mas de comportamentos que de uma forma continuada e excessiva perturbam o funcionamento das aulas.

A este cenário e para além do que se passa em matéria de educação familiar no que respeita à promoção da auto-regulação dos comportamentos parece-me importante referir que todas as figuras sociais a que se colam traços de autoridade por exemplo, pais, professores, médicos, polícias, idosos, etc., viram alterada a representação social sobre esses traços o que, se traduz, na relação estabelecida.

As mudanças significativas no quadro de valores e nos comportamentos criam dimensões novas em torno de um problema velho, a indisciplina. Daqui decorre, por exemplo, que restaurar a autoridade dos professores, tal como era percebida há décadas, é uma impossibilidade porque os tempos mudaram e não voltam para trás. Pela mesma razão, não se fala em restaurar a relação pais – filhos nos termos em que se processava antigamente e falar da "responsabilização" dos pais é interessante, mas é outro nada.

Um professor, de qualquer ciclo ou nível de ensino, ganha tanta mais autoridade quanto mais competente, apoiado e valorizado se sentir. Os dispositivos de apoio suficientes e competentes ao trabalho de professores e alunos constituem uma variável central no que respeita à indisciplina, mas não só à indisciplina.

Também por isto se questiona a constituição de mega-agrupamentos e de escolas e turmas com dimensões excessivas, variável associada à indisciplina escolar.

É também importante reflectir sobre a formação de professores nestes conteúdos. As escolas e os dispositivos de formação de professores não podem “ensinar” só o que sabem ensinar, mas o que é necessário ser aprendido pelos novos, mas poucos professores que o sistema recebe, e pelos professores em serviço.

Parece também importante a existência de estruturas de mediação entre a escola e a família o que implica a existência de recursos humanos qualificados e disponíveis. Já temos suficiente experiência, existem boas iniciativas em muitas escolas permitem disponibilizar algum apoio aos pais dos miúdos “maus” que querem ter miúdos “bons” e identificar as situações para as quais, a comprovada negligência dos pais exigirá outras medidas que envolvam, eficazmente e em tempo oportuno as CPCJ.

Um caminho de autonomia, com a alteração desejável dos modelos de organização e funcionamento das escolas e na gestão curricular, deve permitir que as escolas, algumas escolas, mais problemáticas, estando ou não integradas em TEIP tivessem menos alunos por turma, mais assistentes operacionais com formação em mediação e gestão de conflitos, mais técnicos ou ainda que se utilizassem mais professores em dispositivos de apoio a alunos em dificuldades. As dificuldades dos alunos estão com muita frequência na base do absentismo e da indisciplina, os alunos com sucesso, em princípio, não faltam e não apresentam grandes problemas de indisciplina.

Parece-me de acentuar que os estudos sugerem com clareza a existência de impacto positivo do menor número de alunos por turma no clima e comunicação na sala de aula, na maior facilidade de práticas educativas mais diferenciadas, no comportamento dos alunos, etc., o que, evidentemente deve ser considerado.

Dispositivos assentes em tutorias que envolvam os alunos mais problemáticos parecem um bom contributo desde que realizadas com tempo, recursos e formação ajustados.

Por outro lado, os estudos e as boas práticas, mostram também que a presença simultânea de dois professores é uma boa ferramenta de promoção de sucesso na aprendizagem e para a minimização de problemas de comportamento bem como se conhece o efeito do apoio precoce às dificuldades dos alunos também na prevenção da indisciplina.

Os professores também sabem que na maior parte das vezes, os alunos indisciplinados não mudam os seus comportamentos por mais suspensões que sofram. É evidente que importa admitir sanções, no entanto, fazer assentar o combate à indisciplina nos castigos aos alunos é ineficaz, é facilitista na medida em que é a medida mais fácil e mais barata, é demagógica porque vai ao encontro dos discursos populistas que aplaudem a ideia do "prender" do "expulsar" até ficarem só os nossos filhos.

O problema é quando também nos toca a nós, aí clamamos por apoios.

Os discursos demagógicos e populistas, ainda que bem-intencionados, não são um bom serviço à minimização dos muito frequentes incidentes de indisciplina que minam a qualidade cívica da nossa vida além, naturalmente, da qualidade e sucesso do trabalho educativo de alunos, professores e pais.

quinta-feira, 21 de março de 2024

OBRIGADO

 A propósito do lançamento do livro, “A Arte de Saber Escolher: Guia para uma outra versão de nós mesmos”, o primeiro de uma colecção intitulada “A Arte de …”, no Público encontra-se uma entrevista com Margarida Gaspar de Matos que merece leitura atenta.

Também por imperativo de afecto, importa expressar o reconhecimento pelo trabalho notável que ao longo dos anos acompanhada de uma excelente equipa tem realizado em diferentes dimensões e sempre com o objecto último de promover e cooperar na promoção do bem-estar das pessoas, designadamente das pessoas mais jovens, adolescentes e crianças. É um mundo que em parte nos é comum e o seu trabalho é sempre fonte de reflexão e aprendizagem.

Obrigado, Margarida.

quarta-feira, 20 de março de 2024

DA RESPONSABILIDADE

 Continuam os alertas e a manifestação de preocupação relativos à dificuldade de realização em forma digital das provas finais do 9º ano e das provas de aferição do 2º, 5º e 8º ano. A preocupação agora expressa presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas é maior com as provas do 9º ano devido ao peso que têm na nota final.

A questão é recorrente e ainda tive alguma esperança de que o bom senso e a reflexão sobre o que se passa noutros sistemas educativos que desencadearam uma reflexão e tomadas de decisão relativamente à introdução em termos excessivos dos recursos digitais pudesse contribuir para um maior equilíbrio e prudência na utilização destes recursos, designadamente nos primeiros anos de escolaridade.

Quando são regularmente referidas as dificuldades com equipamentos, insuficiência dos recursos e infra-estruturas seria aconselhável alguma prudência.

No entanto, como há dias escrevia, a tutela, que parece entender que a realidade é a projecção dos seus desejos, insiste na digitalização, na base do “vai correr bem” habitual e, por deslumbramento ou teimosia insiste nas provas digitais, para já no secundário ainda não.

Se a decisão se mantiver e se verificarem problemas e prejuízo para alguns alunos quem se responsabiliza?

Repetindo-me, este processo não podia correr assim, é mau, muito mau.

terça-feira, 19 de março de 2024

CARTA

 Pai, 

Trouxe esta prenda para ti lá da escola. É para o Dia do Pai. Demorou três dias a fazer.

Desculpa lá, mas é outra vez a mesma coisa do outro ano. Desta vez eu acho que está mais bem feita. A professora diz que nós somos descuidados, pediu à D. Maria, a empregada, para ir com a gente para o recreio e acabou ela as nossas prendas para o Dia do Pai.

Não sei porquê, mas temos sempre que fazer assim, eu acho que os pais gostavam à mesma se fossem feitas só por nós.

Sabes uma coisa? Um dia a professora perguntou se os nossos pais brincavam com a gente. Eu disse que nós os dois não brincamos muito, mas estamos sempre a falar. Ela riu-se e disse que isso também é brincar. Eu já sabia.

O que ela não sabe é que a gente fala muito, mesmo que tu estejas nesse lugar muito alto, para onde a mãe diz que foste quando morreste. Mas isso é um segredo.

Agora vou brincar e tu ficas a ver. Olha Pai, depois conto-te uma história muito engraçada que aconteceu à minha amiga Joana.

 José

Hoje e sempre. Ao Meu Pai que partiu demasiado cedo, mas não sem antes me ter mostrado o que nunca viu e caminhos para onde nunca esteve.

domingo, 17 de março de 2024

NOTÍCIAS DO APOIO TUTORIAL ESPECÍFICO

 A Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência divulgou dados relativos a 22/23 da medida Apoio Tutorial Específico que, sem surpresa, mostram resultados positivos. Importa registar, que nem todas escolas aderem a programas desta natureza, existe um problema sério nos recursos docentes disponíveis e são identificados alguns constrangimentos.

Os modelos de natureza tutorial, conforme as boas práticas já existentes em muitas escolas e os estudos nacionais e internacionais sustentam, são ferramentas sólidas e eficazes para acomodar e responder a dificuldades de alunos e professores nos processos de ensino e aprendizagem.

Defendo de há muito dispositivos desta natureza até como forma de gerir de forma adequada os recursos docentes já integrados no sistema e que manifestamente podem ser utilizados em programas de tutoria ou coadjuvação. Aliás, é também interessante o recurso a alunos para programas de tutoria com vantagens recíprocas, para tutores e para tutorandos.

Existem ainda outras iniciativas com o envolvimento de entidades exteriores à escola que também se podem integrar neste tipo de intervenção.

No entanto, e como afirmo desde o início, o Programa de Tutoria em desenvolvimento, da forma como está desenhado, quatro horas semanais por professor tutor para 10 alunos como princípio, e considerando o perfil de intervenção definido e que julgo adequado, tem evidentes constrangimentos. No entanto, também já estamos habituados a que o empenho, competência e profissionalismo da generalidade dos professores minimizem insuficiências que ninguém estranhará. No entanto, não existem milagres e a negação de dificuldades ou exercícios de “wishfull thinking” não resolvem os problemas.

Recordemos as funções atribuídas.

a) Reunir nas horas atribuídas com os alunos que acompanha;

b) Acompanhar e apoiar o processo educativo de cada aluno do grupo tutorial;

c) Facilitar a integração do aluno na turma e na escola;

d) Apoiar o aluno no processo de aprendizagem, nomeadamente na criação de hábitos de estudo e de rotinas de trabalho;

e) Proporcionar ao aluno uma orientação educativa adequada a nível pessoal, escolar e profissional, de acordo com as aptidões, necessidades e interesses que manifeste;

f) Promover um ambiente de aprendizagem que permita o desenvolvimento de competências pessoais e sociais;

g) Envolver a família no processo educativo do aluno;

h) Reunir com os docentes do conselho de turma para analisar as dificuldades e os planos de trabalho destes alunos.

Quem conhece a actual realidade das escolas e as problemáticas complexas dos alunos em insucesso, com desmotivação, desregulação de comportamento, ausência de projecto de vida, falta de enquadramento e suporte familiar, lacunas graves nos conhecimentos escolares de anos anteriores, etc., quase sempre presentes e só para referir dimensões relativas aos alunos, percebe a dificuldade de reverter, para usar um termo em voga, o seu trajecto escolar.

À luz do que me parece ser um trajecto de defesa da efectiva autonomia das escolas, preferia que, dando o ME orientação e a possibilidade de gerir e alocar recursos a estes programas, que fossem as escolas a organizar os seus programas de tutoria, definindo destinatários, professores e técnicos envolvidos, tempos de realização e objectivos a atingir.

Caberia, evidentemente, às escolas e ao ME a regulação e acompanhamento dos programas e a sua avaliação.

Sabemos, é uma referência comum, a existência de “constrangimentos” sérios que pesam nos recursos disponíveis. Neste cenário parece claro que que muitos professores que não conseguem a vinculação o poderiam fazer para poder alargar este dispositivo de apoio a mais alunos. As decisões em matéria de política pública de educação têm exactamente essa função, minimizar problemas e gerir da melhor forma os recursos. A questão dos custos nesta matéria não me parece relevante face aos potenciais benefícios. A ver vamos o que traz o novo ciclo político.

No entanto, mais uma vez e não esquecendo a necessidade de combater desperdício e ineficácia, é bom recordar que a qualidade da educação e a promoção do sucesso para todos os alunos não representam despesa, são investimento. Importa reforçar que estou a falar de sucesso traduzido em competências e conhecimentos adquiridos, não em sucesso fabricado e não confirmado pelos dispositivos de avaliação externa.