quinta-feira, 5 de junho de 2025

O MESTRE ZÉ MARRAFA PARTIU

 Contrariamente ao que é habitual, o meu Alentejo tem um dia triste, partiu o Mestre Zé Marrafa. Depois de mais de trinta anos a ajudar-nos aqui no monte e após três anos em que o Mestre Zé já não era o Mestre Zé.

É impossível não recordar as lérias, a histórias da vida de um Homem que começou a trabalhar aos nove anos guardando porcos e tinha 85 anos.

Até aos oitenta e dois sempre esteve com agente aqui na lida e muitas vezes me “envergonhei” com a resistência e capacidade. O que aprendi sobre o campo, os calendários, a utilização do tractor, as tradições deram-me um mundo de encantamento com o Alentejo. O Mestre Zé fazia parte de um dos Coros de Viana e cultivava o Cante, a alma do Alentejo.

Era um artesão uma vez, pelo Natal, apareceu no Monte com dois presentes. Duas miniaturas em madeira feitas por ele, um chambaril, dispositivo que se usa na época da matança para pendurar o porco para desmanchar e uma bota de ceifeira alentejana. Ainda ali estão a lembrá-lo.

 Era um Homem vontadeiro, um dos muitos termos que aprendi com ele, e com um sentido de humor fino que lhe fazia brilhar os olhos pequenos. Dois exemplos.

Lembro-me de uma vez, num dia quente com os deste tempo, ele se queixar de uma dor no joelho, queixas que nele eram raras. Sem saber como ajudar e para me meter com ele fiz aquele comentário inteligente e habitual em situações em que a queixa provém de alguém já com uma estrada longa, por assim dizer, "é da idade Mestre Zé".

O Velho Marrafa olhou para mim e no seu jeito de sempre decretou:

“Não Sô Zé, isto não é da idade, o outro joelho não me dói e eles são os dois da mesma idade”.

Noutra ocasião também em tempo de calor lhe disse que estava anunciado um alerta vermelho. O Mestre Zé olhou para mim e comenta, “alerta por causa de calor no Verão?! Se viesse muito frio é que deviam avisar, no Verão do Alentejo querem o quê”.

Pois é Mestre Zé, já não vamos cumprir o que combinámos.

Lembra-se que plantámos uns sobreiros em 2011 que deveriam dar cortiça 25 anos depois e nós cá estaríamos para tirar a primeira cortiça e eu já não faria golpes no tronco por mau uso do machado.

E agora Mestre Zé? Um dia vou ter consigo.

Até lá obrigado pelo que foi para nós, pela ajuda, pelo exemplo, pelo ensino … por ser o nosso Mestre Zé.

Até esse dia.

1 comentário:

jose luis covita disse...

Bonita homenagem.Bonito texto. O Mestre merecia. Dele já te tinha ouvido algumas deliciosas histórias, hoje fiquei a saber mais umas. Sempre bonitas. Há homens assim. É bom que não nos esqueçamos deles!