Contrariamente ao que é habitual, o meu Alentejo tem um dia triste, partiu o Mestre Zé Marrafa. Depois de mais de trinta anos a ajudar-nos aqui no monte e após três anos em que o Mestre Zé já não era o Mestre Zé.
É impossível não recordar as lérias,
a histórias da vida de um Homem que começou a trabalhar aos nove anos guardando
porcos e tinha 85 anos.
Até aos oitenta e dois sempre
esteve com agente aqui na lida e muitas vezes me “envergonhei” com a resistência
e capacidade. O que aprendi sobre o campo, os calendários, a utilização do
tractor, as tradições deram-me um mundo de encantamento com o Alentejo. O
Mestre Zé fazia parte de um dos Coros de Viana e cultivava o Cante, a alma do
Alentejo.
Era um artesão uma vez, pelo Natal,
apareceu no Monte com dois presentes. Duas miniaturas em madeira feitas por
ele, um chambaril, dispositivo que se usa na época da matança para pendurar o
porco para desmanchar e uma bota de ceifeira alentejana. Ainda ali estão a
lembrá-lo.
Lembro-me de uma vez, num dia
quente com os deste tempo, ele se queixar de uma dor no joelho, queixas que nele
eram raras. Sem saber como ajudar e para me meter com ele fiz aquele comentário
inteligente e habitual em situações em que a queixa provém de alguém já com uma
estrada longa, por assim dizer, "é da idade Mestre Zé".
O Velho Marrafa olhou para mim e
no seu jeito de sempre decretou:
“Não Sô Zé, isto não é da idade,
o outro joelho não me dói e eles são os dois da mesma idade”.
Noutra ocasião também em tempo de
calor lhe disse que estava anunciado um alerta vermelho. O Mestre Zé olhou para
mim e comenta, “alerta por causa de calor no Verão?! Se viesse muito frio é que
deviam avisar, no Verão do Alentejo querem o quê”.
Pois é Mestre Zé, já não vamos
cumprir o que combinámos.
Lembra-se que plantámos uns sobreiros
em 2011 que deveriam dar cortiça 25 anos depois e nós cá estaríamos para tirar
a primeira cortiça e eu já não faria golpes no tronco por mau uso do machado.
E agora Mestre Zé? Um dia vou ter
consigo.
Até lá obrigado pelo que foi para
nós, pela ajuda, pelo exemplo, pelo ensino … por ser o nosso Mestre Zé.
Até esse dia.
1 comentário:
Bonita homenagem.Bonito texto. O Mestre merecia. Dele já te tinha ouvido algumas deliciosas histórias, hoje fiquei a saber mais umas. Sempre bonitas. Há homens assim. É bom que não nos esqueçamos deles!
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